Relatório da CPI do MST tem projeto de Bolsonaro que flexibiliza porte de armas

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O conjunto de propostas legislativas anexadas ao relatório da CPI do MST, escrito pelo deputado federal Ricardo Salles (PL-SP), inclui um projeto de 2014 do então deputado Jair Bolsonaro (PL) que flexibiliza o porte de armas para proprietários rurais e parlamentares e outros que podem enquadrar movimentos sociais nas leis de terrorismo.

No total, o relatório de Salles, ex-ministro do Meio Ambiente de Bolsonaro, sugere 23 projetos, recentes ou antigos, como resultado do trabalho da CPI.

O conjunto de textos propõe aumentar as penas para invasão de terra e usurpação de água, alterar critérios de acesso à reforma agrária, cortar benefícios de envolvidos em conflitos de terra e impedir que eles tenham cargo público, além de eliminar dispositivos de mediação de reintegrações de posse.

O documento pede o indiciamento de 11 pessoas, inclusive o ex-ministro do GSI Gonçalves Dias e um dos líderes do movimento sem terra, José Rainha.

O texto completo, anexado com a lista de indiciados e as propostas legislativas, foi publicado apenas durante a leitura do relatório, na manhã desta quinta (21). Deve ser votado na próxima semana, após um pedido de vistas coletivo.

Dentre os projetos de lei sugeridos por Salles, está um de Bolsonaro, de 2014, que inclui uma série de categorias àquelas autorizadas a ter porte de armas pelo Estatuto do Desarmamento.

Dentre elas, “residentes em área rural, dentro dos limites de sua propriedade”; a proposta também prevê que “poderá ser concedido porte de arma de fogo para pessoas que justificarem a necessidade para sua segurança pessoal ou de seu patrimônio”.

O projeto acrescenta ao estatuto parlamentares em exercício, colecionadores, jornalistas de cobertura policial, agentes de fiscalização ambiental e do trabalho e motoristas de transporte de carga –alguns destes grupos já pode, por leis específicas ou em determinadas circunstâncias, ter o porte.

Há ainda um projeto do deputado Major Vitor Hugo (PL-GO), que por sua vez resgata uma outra proposta de Bolsonaro, que cria uma série de disposições antiterroristas que podem ser usadas para enquadrar movimentos sociais.

O projeto já foi alvo de críticas de entidades como Conectas e Artigo 19. Segundo as entidades, a proposta potencialmente cria “legislações de exceção que violam direitos fundamentais”.

“A aprovação da proposta seria desproporcional e altamente lesiva aos direitos fundamentais e aos princípios norteadores da Constituição, uma vez que se baseia em definições extremamente amplas, que abrem claras brechas para interpretações distorcidas e graves arbitrariedades”, diz nota.

Há ainda outro projeto que visa incluir “invasão armada de terras particulares, terrenos, lotes, casa ou imóvel rural” como ato terrorista, além de propostas para enquadrar esbulho ou ocupação de imóveis na mesma categoria.

Na prática, esses dispositivos tornariam as acusações de crimes cometidos pelo MST, por invasão de propriedade, por exemplo, em crimes de terrorismo.

Duas propostas anexadas ao relatório, uma do próprio Salles e outra do presidente da CPI, Coronel Zucco (Republicanos-ES), tem o mesmo objetivo: sustar uma resolução do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) que estabelece procedimentos de reintegração de posse.

Dentre os dispositivos previstos pela resolução que cairiam caso o projeto fosse aprovado estão instrumentos de mediação.

“A expedição de mandado de reintegração de posse em ações possessórias coletivas será precedida por audiência pública ou reunião preparatória, na qual serão elaborados o plano de ação e o cronograma da desocupação, com a presença dos ocupantes e seus advogados, Ministério Público, Defensoria Pública, órgãos de assistência social, movimentos sociais ou associações de moradores”, diz o texto do CNJ.

Uma série de outras propostas visa ampliar a pena por invasão ou esbulho, algumas com punição de até 30 anos de reclusão, além de propor o corte de benefícios federais a quem for envolvido com conflitos agrários e impedir que essas pessoas ocupem cargo público ou concorram em eleições.

Para Maria Trajan, coordenadora da Artigo 19, tanto a CPI quando os projetos anexados ao relatório ampliam um cenário de tentativa de criminalizar os movimentos sociais.

“Ainda que não criem um tipo penal que diga exclusivamente sobre movimentos sociais, sobre assentamentos ou ocupações, são projetos que entram num contexto de criminalização desses movimentos, junto com a CPI”, diz.

JOÃO GABRIEL / Folhapress

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