‘Filhos da Esperança’ discute filosofia do fim do mundo sem avançar

FOLHAPRESS – Imagine um mundo em colapso. Um mundo no qual idosos cometem suicídio numa cerimônia chamada Termo, financiada pelo Estado com apoio das famílias; com países mergulhados no caos, tornando a Inglaterra um dos poucos lugares estáveis; e que, nos últimos 25 anos, não viu nascer nenhuma criança.

Essa é a narrativa criada pela inglesa P. D. James em “Filhos da Esperança”, traduzido neste ano por Aline Storto Pereira para a editora Aleph, numa edição caprichada.

A história foi publicada em 1992 e adaptada para o cinema por Alfonso Cuarón em 2006. Phyllis Dorothy James foi uma renomada escritora de ficção científica, thrillers e mistérios, sempre tendo o Reino Unido como cenário para suas tramas.

“Filhos da Esperança” reflete sobre morte, democracia, religião, ciência –e do que a humanidade é capaz sem a certeza da continuidade. A vida faz sentido quando se sabe que não haverá mais ser humano andando sobre a Terra? As crianças passariam a ser olhadas com reverência quando se sabe que serão as últimas?

Há questionamentos filosóficos primordiais na narrativa, mas eles têm pouco espaço para desenvolvimento.

Os primeiros cinco capítulos trazem a visão de Theo Faron, por meio dos textos de seus diários. É um homem apático, monótono e arrogante, um historiador que registra sua vida, mesmo sem haver ninguém no futuro para analisar essas memórias.

O livro traz a situação dos refugiados, mas de forma limitada. Conta que apenas na Inglaterra restou alguma estrutura estatal, mesmo que despótica, mas quando o protagonista viaja, não se vê nenhuma perspectiva de outros países.

A morte acidental da filha de Theo, ainda criança e causada por ele, assim como seu divórcio e relacionamento com o administrador da Inglaterra, seu primo Xan, têm peso bem maior na narrativa. O que acaba por prejudicar o entendimento do leitor do caos desse mundo.

A ausência da Família Real em toda a história, mesmo sabendo que ainda há nobreza e seus privilégios, deixa tudo um pouco inverossímil. Assim como a revolta dos Cinco Peixes, provocada por ideias inocentes sem nenhum plano concreto do que fazer, mesmo quando a grande reviravolta acontece, já para o último terço do livro.

Os Ômegas, os últimos nascidos no universo do livro, no ano de 1995, são mimados e não se preocupam em buscar soluções para os problemas de seu tempo. Mas essa é a visão de Theo, um Alfa. A leitura não oferece nenhum momento de aproximação à vivência desta que é a última geração humana pela sua própria voz.

A narrativa de James sai da lenta divagação de seu protagonista para uma corrida frenética em busca de refúgio para ele e sua amada. É o momento em que a conjuntura e o pessoal se equilibram um pouco mais, mesmo com as resoluções sendo em grande parte construídas pelos amores, traições e covardias dos personagens próximos a Theo.

Talvez seja essa a grande questão que a autora traz. Mesmo em momentos em que a humanidade está em risco, será a individualidade que norteará os grandes atos.

O livro convida os leitores a continuarem a leitura na Órbita através de um QR Code. Essa experiência permite uma continuidade interessante para o leitor, que cada vez mais busca uma jornada coletiva, que não se encerre na última página.

FILHOS DA ESPERANÇA

Preço: R$ 89,90 (368 págs.)

Autoria: P.D. James

Editora: Aleph

Tradução: Aline Storto Pereira

Avaliação: Bom

DAIANA DE SOUZA / Folhapress

COMPARTILHAR:

Participe do grupo e receba as principais notícias de Campinas e região na palma da sua mão.

Ao entrar você está ciente e de acordo com os termos de uso e privacidade do WhatsApp.

NOTÍCIAS RELACIONADAS