SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Uma análise interna da polícia federal dos Estados Unidos, o FBI, realizada em outubro de 2020 ou dois meses antes do ataque ao Capitólio, concluiu que extremistas americanos estariam “muito dispostos a agir”, mas que a desorganização de seus grupos “provavelmente impediria a violência generalizada”.
O documento, obtido pela emissora NBC por meio da lei de acesso à informação americana, é intitulado “Análise Alternativa: Potenciais Cenários de Reações de Extremistas Americanos Violentos a um Resultado Controverso nas Eleições Presidenciais de 2020 nos EUA”.
“Em resposta a uma eleição questionada, [extremistas americanos] estão muito dispostos a agir, mas sua capacidade de fazê-lo ainda é baixa, em grande parte devido à desorganização e à pressão por obedecer à lei”, discorre a análise no que considera seu cenário “mais provável”.
Na outra ponta, uma situação considerada menos provável era a de que esses grupos não só estivessem “muito dispostos a agir” como também tivessem capacidade “de levar a cabo uma ampla gama de ações violentas”.
O cenário menos provável, no entanto, acabou sendo o mais acertado. No dia 6 de janeiro de 2021, quando o Congresso americano confirmava a vitória do democrata Joe Biden nas eleições de 2020, uma multidão insuflada por seu adversário na campanha, o republicano Donald Trump, invadiu o Capitólio e paralisou a sessão.
A irrupção foi seguida por horas de caos. Os manifestantes depredaram o prédio, agrediram policiais e invadiram as duas Casas legislativas, além de gabinetes de parlamentares. O ato terminou com cinco pessoas mortas e 150 agentes de segurança feridos. Mais de dois anos depois, a Justiça já emitiu cerca de 600 sentenças relacionadas ao caso, e condenou 366 pessoas à prisão um cálculo que não inclui as centenas de pessoas que ainda seguem sob investigação das autoridades.
A maior das penas até agora foi de 22 anos de cárcere, imposta a Enrique Tarrio, um dos líderes do grupo extremista de direita Proud Boys (garotos orgulhosos). Tarrio é tratado como um dos mentores da conspiração e da insurreição.
O relatório do FBI foi finalizado em 27 de outubro, apenas alguns dias depois de Trump fazer uma declaração ambígua em relação ao grupo de Tarrio em um debate contra Biden. “Proud Boys, stand back and stand by”, disse ele na ocasião, o que que pode ser entendido tanto como um pedido para que o grupo se afaste e aguarde ou um alerta para que ele esteja pronto para agir a qualquer momento. Pouco tempo depois, já havia camisetas com a frase do republicano à venda.
O serviço de inteligência não faz, porém, menção a essa ou a qualquer outra declaração de Trump em sua análise, diferentemente do comitê da Câmara dos Representantes dos EUA designado para investigar a invasão. Consta no documento da Casa, por exemplo, o tuíte em que o ex-presidente afirma ser “estatisticamente impossível” que ele tivesse perdido as eleições uma mentira. “Grande protesto em [Washington] DC em 6 de janeiro. Esteja lá, será selvagem!”, continua a mensagem.
Segundo a NBC, o comitê considerou fazer críticas ao FBI em seu relatório final, mas acabou entregando um documento bastante focado na ação de Trump, ignorando as falhas de segurança do Estado.
À emissora, o ex-promotor Tim Heaphy, principal conselheiro do comitê, disse no início deste ano que Trump foi a “causa imediata” da invasão, mas que a incapacidade das autoridades de agir com base na “ampla inteligência sobre as ameaças de violência colhidas antes de 6 de janeiro” também impactou o incidente.
A NBC informou que o FBI não respondeu a pedidos de comentários sobre o relatório. Recebeu, porém, uma nota em que a agência declara que “alertou parceiros estaduais, locais e federais sobre o potencial de violência” de extremistas e que mobilizou 250 agentes especiais para proteger o Capitólio.
“Desde 6 de janeiro de 2021, o FBI revisou continuamente processos, procedimentos e políticas para avaliar as lições aprendidas e fazer melhorias na comunicação e na coleta, análise e compartilhamento de informações”, prossegue o comunicado.
Redação / Folhapress