SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Depois de 20 dias de turismo no Japão, a família do fisioterapeuta Clark Figueiredo, de São Paulo, foi até o aeroporto de Narita, na última sexta-feira (22), para embarcar de volta para casa pela mesma rota que tinha ido com uma conexão no México. Eles e outros brasileiros, porém, foram impedidos de entrar no avião, segundo Figueiredo, sob a justificativa de que o país latino-americano não aceitava mais a entrada sem visto, ainda que para trânsito.
Assim, a viagem que ele havia dado para sua mãe, seu padrasto e seu filho saiu bem mais cara do que o previsto. Do Brasil, Figueiredo se viu sem muitas alternativas, e a saída foi comprar passagens com parada no Qatar, o que lhe custou cerca de R$ 24 mil ao todo.
De acordo com o fisioterapeuta, seus familiares ficaram 18 horas no aeroporto antes de embarcar e não tiveram auxílio para estadia e alimentação da Aeroméxico, companhia aérea responsável pelo voo procurada, a empresa disse que não comentaria casos específicos.
A Folha enviou perguntas às partes envolvidas, mas as respostas foram conflitantes.
Naquela sexta, o Itamaraty emitiu alerta afirmando que, “devido a mudanças nos procedimentos aeroportuários mexicanos”, não seriam mais autorizados a realizar trânsito no país cidadãos brasileiros que não tivessem visto mexicano ou residência permanente ou visto válido em Estados Unidos, Canadá, Japão, Reino Unido e países que compõem o Espaço Schengen (que compreendem a maior parte da União Europeia) documentos que, em tese, permitem a entrada no país. As exigências se aplicavam ainda que o destino final da viagem fosse o Brasil.
Antes disso, turistas brasileiros conseguiam fazer conexão no México sem a necessidade dessa documentação. Até a noite desta quinta-feira (28) ainda constava no site do Consulado-Geral do México em São Paulo a informação de que “passageiros em trânsito técnico rumo a outro país (sem passar pelo controle de imigração, com voo em conexão de menos de 24 horas) não precisam de visto”.
A viagem da família de Figueiredo cumpria os dois requisitos, de acordo com o fisioterapeuta: além de todos terem visto físico para entrar no Japão, a passagem no México seria para trânsito.
Segundo o Itamaraty, a medida que causou confusão foi temporariamente suspensa na terça-feira (26). De acordo com relatos, desde então os brasileiros que fazem conexão no México têm conseguido embarcar com o visto de turismo japonês, que não estava sendo aceito. Ainda assim, a chancelaria brasileira passou a recomendar evitar adquirir passagens aéreas que incluam parada no país latino-americano sem os vistos exigidos para entrada no México.
“Ao tomar conhecimento das dificuldades enfrentadas pelos cidadãos brasileiros, o Itamaraty realizou gestões, em alto nível, com o governo mexicano, inclusive por meio de contato do ministro Mauro Vieira com a ministra das Relações Exteriores do México, Alicia Bárcena”, afirmou a pasta.
Procurada, a Secretaria de Relações Exteriores do México afirmou que os procedimentos migratórios do país não mudaram.
Sem dar detalhes, a pasta disse que, na sexta em que brasileiros foram barrados em Tóquio, uma atualização na plataforma usada por companhias aéreas e agências de viagens para verificar documentos exigidos pelo país de destino “gerou diversas dúvidas”. Diante da situação, o governo do México “solicitou esclarecimentos” a respeito da atualização, de acordo com a chancelaria mexicana.
Sobre conexões durante viagens, a pasta afirmou que “todas as pessoas de nacionalidades que requerem um visto devem ter esse documento, independentemente se a viagem pelo México é de trânsito” o que contradiz a informação divulgada pelo Consulado-Geral do México em São Paulo.
Depois de sexta, o Consulado-Geral do Brasil em Tóquio passou a se comunicar com os brasileiros no Japão para tentar resolver o imbróglio. Entre as explicações dadas ao consulado, de acordo com os turistas, estava uma suposta lotação das salas de trânsito, onde os viajantes sem vistos aceitos ficam confinados durante a conexão. O consulado não respondeu a um pedido de comentário da reportagem.
O analista de sistemas Mateus Menezes, 29, teve de ficar nessa sala, no aeroporto da Cidade do México, na viagem de ida para o Japão. Ao fazer a escala, diz ter ouvido que apenas vistos colados no passaporte seriam aceitos o seu documento era digital. A chancelaria mexicana confirmou à reportagem que são aceitos apenas “vistos físicos vigentes”, embora o site da Aeroméxico diga aceitar o formato virtual.
Segundo Menezes, no espaço ficam dois policiais, um painel de contatos dos consulados, quatro ou cinco fileiras de bancos e beliches de ferro com colchonetes, onde as pessoas podem dormir. Durante as sete horas em que ficou ali, sempre segundo seu relato, Menezes não pôde acessar celular ou internet nem sair para comprar alimentos.
“O governo do México constantemente toma medidas para garantir que os direitos das pessoas estrangeiras que entram no país sejam plenamente respeitados”, afirmou a chancelaria mexicana. “Continuaremos trabalhando para garantir que as condições decorrentes desses procedimentos sejam sempre as melhores.”
Procurado, o Instituto Nacional de Migração do México não retornou o contato.
No próximo sábado (30) entra em vigor a dispensa de visto entre Brasil e Japão, anunciada no início de agosto. Não está claro ainda como o México lidará com esse novo cenário. A Secretaria de Relações Exteriores disse que “serão estudadas soluções antes da mudança”.
Apesar da aparente resolução do problema, a coordenadora de mídia social e fotógrafa Natália Costa, 22, teme precisar fazer o mesmo que Figueiredo, citado no início da reportagem. Com passagem de volta para o Brasil marcada para esta sexta-feira (29), a sua última semana de estadia no Japão começou com apreensão. Ela tem de retornar ao trabalho na próxima segunda (2). “A gente já pagou a passagem e é nosso direito voltar.”
DANIELA ARCANJO / Folhapress