SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O Mundial de ginástica artística, que teve início neste sábado (30), na Antuérpia, na Bélgica, com as primeiras classificatórias masculinas, marca a volta do maior nome da história da modalidade às competições internacionais. A norte-americana Simone Biles, 26, retorna após período de afastamento por motivos de saúde mental e quer recuperar seu trono.
Em sua ausência, sentou-se nele Rebeca Andrade. Campeã individual geral no Mundial do ano passado, na cidade inglesa de Liverpool, a brasileira de 24 anos tem concorrência da mais alta qualidade na briga pelo bi. Mas ela tem evitado pensar no torneio como um duelo com Biles e afirma que sua luta é apenas consigo mesma, pelo melhor desempenho.
“O resultado é consequência de todo o meu trabalho, de tudo por que a gente passa nos treinamentos. Se eu fico pensando só na medalha, não foco o que preciso fazer na hora, isso acaba me atrapalhando. Eu trabalhei muito com a minha psicóloga porque eu achava que seria imprestável se eu não ganhasse uma medalha, se não subisse ao pódio. A cabeça precisa estar boa”, disse.
A paulista de Guarulhos não esteve em muitos eventos em 2023. No Campeonato Brasileiro Absoluto, poupou-se do solo e não participou do individual geral. Foi campeã nas barras e na trave. Depois, na etapa de Paris da Copa do Mundo, competiu nas barras e ficou com a prata, satisfeita com a própria atuação: “Estou pronta para tudo o que tenho trabalhado”.
E ela tem trabalhado em uma nova apresentação de solo. Após um ciclo vitorioso no qual exibiu coreografia sincronizada às notas do funk “Baile de Favela”, agora vai fazer acrobacias com referências musicais de “divas pop”, como afirmou, com trechos de hits das cantoras Beyoncé e Anitta.
Independentemente da canção, Rebeca já mostrou que seu sucesso não foi um acaso do tipo “one-hit wonder”. Nos Jogos Olímpicos de Tóquio, realizados em 2021, ela foi prata na disputa geral e ouro no salto. Em seguida, no Mundial daquele ano, foi ouro no salto e prata nas barras. No Mundial de 2022, além do ouro geral, levou bronze no solo.
Foi em Tóquio que Biles desistiu de disputar a maioria das medalhas. Diante de “twisties”, como são chamados momentos de perda de percepção corporal, aterrorizantes durante as piruetas da ginástica, passou dois anos afastada das competições para cuidar da saúde mental.
Quando reuniu condições para retornar, mostrou ser Simone Biles. Vencedora pela oitava vez do individual geral no campeonato nacional dos Estados Unidos, o US Classic, derrotou facilmente Shilese Jones, 21 -prata geral no Mundial do ano passado, atrás apenas de Rebeca. E triunfou também nas barras e no solo.
“É apenas ginástica”, disse, contendo a empolgação. “Metas pessoais e coisas assim, acho que às vezes é bom mantê-las para nós mesmos, apenas para que ninguém possa jogar na nossa cara: ‘Ah, bem, essa era sua meta, e você não a alcançou’. Estou na idade em que é, tipo, ‘ei, deixe-me em paz’. Então, uma coisa de cada vez.”
Não trate as palavras de Simone como um retrato de falta de ambição. A norte-americana de Ohio sabe que é a maior ginasta da história e pretende ampliar seus já fantásticos números.
Ela tem 25 medalhas no Mundial, 19 de ouro. Vai se tornar a mais velha a participar do torneio pelos Estados Unidos em mais de meio século e a primeira do país em seis edições. A primeira foi na própria Antuérpia em 2013, aos 16 anos.
“É um ciclo completo. De volta aonde tudo começou”, disse a craque, em frase que vale para ela e para o próprio campeonato, realizado pela primeira vez há 120 anos, também na Antuérpia -à época, com outro nome e só com homens.
Simone tentará na Bélgica cravar o quinto movimento Biles. Na ginástica, quando alguém estabelece uma ação inédita, batiza-a. A atleta já acertou o complexo “Yurchenko Double Pike” em disputa nos Estados Unidos, porém precisa completá-lo em salto internacional para ter o reconhecimento.
Confiança, como se vê, não falta, apesar das palavras humildes. O comportamento, nesse sentido, tem alguma semelhança com o de Rebeca.
MARCOS GUEDES / Folhapress