Nobel de Literatura de 2023 premia norueguês Jon Fosse, autor de obras existenciais

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O norueguês Jon Fosse, de 64 anos, venceu o prêmio Nobel de Literatura de 2023, segundo anunciou a Academia Sueca na manhã desta quinta-feira.

O escritor é conhecido principalmente por suas mais de 40 peças, mas também por sua produção de obras infantojuvenis, poemas e romances, um leque que está sendo ampliado no Brasil.

Um de seus livros, “É a Ales”, finalista do prêmio Booker Internacional, acaba de sair no Brasil pela Companhia das Letras, somando-se a “Melancolia”, já publicado pela Tordesilhas. A Fósforo está prestes a lançar outro, “Brancura”.

A obra de Fosse é marcada por personagens imersos em investigações existenciais líricas que perpassam tempo e espaço. O porta-voz da Academia Sueca citou o também nobelizado irlandês Samuel Beckett como um escritor próximo a ele e o saudou por “sua dramaturgia e prosa inovadora que dá voz ao indizível”.

Para se ter uma ideia da relevância de Fosse na Noruega, ele é o dramaturgo mais montado ali desde Henrik Ibsen —um dos pais do teatro moderno— e há uma década mora numa residência oficial concedida pelo rei àqueles que contribuem com a arte e cultura norueguesa.

Um texto da revista americana Paris Review de oito anos atrás diz que, se os autores noruegueses fossem os Beatles, Karl Ove Knausgard seria Paul McCartney e Fosse, que foi professor de escrita criativa do primeiro, seria George Harrison, “o quieto, místico, espiritual, provavelmente o melhor artífice de todos eles”.

O primeiro romance de Fosse, “Raudt, Svart”, saiu em 1983, o pontapé inicial numa carreira que depois alcançaria mais de 50 idiomas.

Conforme avançou seu projeto literário, o autor se notabilizou por um estilo próprio de fluxo de consciência, perpassando os pensamentos e sensações de suas personagens num lirismo de quilate incomum para prosa.

Desde 1901, a centenária Academia escandinava distribui esta que é considerada a maior distinção literária do mundo, já tendo laureado 120 pessoas, entre interrupções por guerras ou escândalos sexuais. O escolhido leva 10 milhões de coroas suecas, o que hoje equivale a cerca de R$ 4,7 milhões.

Fosse é a quarta pessoa norueguesa a vencer o Nobel de Literatura —mas a última premiada, Sigrid Undset, recebeu o troféu há 95 anos.

Antes dela, vieram Knut Hamsun e Bjornstjerne Bjornson, o que faz sentido quando se lembra que o prêmio foi originalmente criado para propagar a cultura escandinava. Oito autores suecos, um finlandês e três dinamarqueses já ganharam o Nobel.

Dentre todos esses vencedores, o prêmio já destacou 17 mulheres contra 103 homens, a mais recente sendo a francesa Annie Ernaux, no ano passado.

Foi o raro caso de uma escritora que já vinha angariando bom leitorado no país antes do prêmio, com obras como “O Lugar” e “O Acontecimento” —e ainda mais depois da vinda da escritora à Flip, logo depois, numa feliz coincidência para a festa literária paratiense.

A popularidade não era o caso dos autores que foram premiados logo antes, a poeta americana Louise Glück, que só veio ter sua obra bem editada no Brasil depois do Nobel, e o romancista tanzaniano Abdulrazak Gurnah, nunca publicado no país antes de vencer.

É rara a coincidência de um autor estar avançando sua publicação brasileira enquanto é premiado pelo Nobel, ainda que Fosse constasse entre os principais cotados pelas casas de apostas há pelo menos dez anos, ao lado de eternos lembrados como a chinesa Can Xue e o queniano Ngugi wa Thiong’o.

Mas o favoritismo normalmente não quer dizer muita coisa —o japonês Haruki Murakami que o diga.

Se o Nobel é capaz de catapultar a leitura de escritores no Brasil, como foi o caso de Svetlana Aleksiévitch e Olga Tokarczuk, às vezes ele calha de premiar autores já bem conhecidos como Kazuo Ishiguro, vencedor de 2017, e —ainda mais— o compositor Bob Dylan, que ganhou um ano antes dele.

VEJA TODOS OS VENCEDORES DO NOBEL DE LITERATURA ATÉ HOJE

2023: Jon Fosse (Noruega)

2022: Annie Ernaux (França)

2021: Abdulrazak Gurnah (Tanzânia)

2020: Louise Glück (EUA)

2019: Peter Handke (Áustria)

2018: Olga Tokarczuk (Polônia)

2017: Kazuo Ishiguro (Reino Unido)

2016: Bob Dylan (EUA)

2015: Svetlana Aleksiévitch (Bielorrússia)

2014: Patrick Modiano (França)

2013: Alice Munro (Canadá)

2012: Mo Yan (China)

2011: Tomas Tranströmer (Suécia)

2010: Mario Vargas Llosa (Peru)

2009: Herta Müller (Romênia-Alemanha)

2008: J.M.G. Le Clézio (França)

2007: Doris Lessing (Reino Unido, mas nasceu no Irã e cresceu no Zimbábue)

2006: Orhan Pamuk (Turquia)

2005: Harold Pinter (Reino Unido)

2004: Elfriede Jelinek (Áustria)

2003: J.M. Coetzee (África do Sul)

2002: Imre Kertész (Hungria)

2001: V.S. Naipaul (nasceu em Trinidad e Tobago, mas vive no Reino Unido)

2000: Gao Xingjian (China)

1999: Günter Grass (Alemanha)

1998: José Saramago (Portugal)

1997: Dario Fo (Itália)

1996: Wislawa Szymborska (Polônia)

1995: Seamus Heaney (Irlanda)

1994: Kenzaburo Oe (Japão)

1993: Toni Morrison (Estados Unidos)

1992: Derek Walcott (Santa Lúcia, ilha do Caribe)

1991: Nadine Gordimer (África do Sul)

1990: Octavio Paz (México)

1989: Camilo Jose Cela (Espanha)

1988: Naguib Mahfouz (Egito)

1987: Joseph Brodsky (EUA, de origem russa)

1986: Wole Soyinka (Nigéria)

1985: Claude Simon (França)

1984: Jaroslav Seifert (Tchecoslováquia)

1983: William Golding (Reino Unido)

1982: Gabriel García Márquez (Colômbia)

1981: Elias Canetti (Reino Unido, de origem búlgara)

1980: Czeslaw Milosz (Polônia)

1979: Odysseus Elytis (Grécia)

1978: Isaac Bashevis Singer (EUA, de origem polonesa)

1977: Vicente Aleixandre (Espanha)

1976: Saul Bellow (EUA)

1975: Eugenio Montale (Itália)

1974: Eyvind Johnson (Suécia) e Harry Martinson (Suécia)

1973: Patrick White (Austrália)

1972: Heinrich Böll (Alemanha)

1971: Pablo Neruda (Chile)

1970: Alexander Soljenítsin (URSS)

1969: Samuel Beckett (Irlanda)

1968: Yasunari Kawabata (Japão)

1967: Miguel Ángel Asturias (Guatemala)

1966: Samuel José Agnon (Israel) e Nelly Sachs (Alemanha e Suécia)

1965: Mikhail Sholokhov (URSS)

1964: Jean-Paul Sartre (França; recusou o prêmio)

1963: Giórgos Seféris (Grécia)

1962: John Steinbeck (EUA)

1961: Ivo Andric (Iugoslávia)

1960: Saint-John Perse (França)

1959: Salvatore Quasimodo (Itália)

1958: Boris Pasternak (União Soviética; renunciou ao prêmio)

1957: Albert Camus (França)

1956: Juan Ramón Jiménez (Espanha)

1955: Halldór Kiljan Laxness (Islândia)

1954: Ernest Hemingway (Estados Unidos)

1953: Winston Churchill (Reino Unido)

1952: François Mauriac (França)

1951: Par Lagerkvist (Suécia)

1950: Bertrand Russell (Reino Unido)

1949: William Faulkner (EUA)

1948: T.S. Eliot (Reino Unido, nascido nos EUA)

1947: André Gide (França)

1946: Hermann Hesse (Alemanha)

1945: Gabriela Mistral (Chile)

1944: Johannes V. Jensen (Dinamarca)

1940-1943: não foi concedido

1939: Frans Eemil Sillanpää (Finlândia)

1938: Pearl S. Buck (EUA)

1937: Roger Martin du Gard (França)

1936: Eugene O’Neill (EUA)

1935: não foi concedido

1934: Luigi Pirandello (Itália)

1933: Ivan Bunin (URSS)

1932: John Galsworthy (Reino Unido)

1931: Erik Axel Karlfeldt (Suécia)

1930: Sinclair Lewis (EUA)

1929: Thomas Mann (Alemanha)

1928: Sigrid Undset (Noruega)

1927: Henri Bergson (França)

1926: Grazia Deledda (Itália)

1925: George Bernard Shaw (Irlanda)

1924: Wladyslaw Reymont (Polônia)

1923: W.B. Yeats (Irlanda)

1922: Jacinto Benavente (Espanha)

1921: Anatole France (França)

1920: Knut Hamsun (Noruega)

1919: Carl Spitteler (Suíça)

1918: Não foi concedido

1917: Karl Gjellerup e Henrik Pontoppidan (ambos da Dinamarca)

1916: Verner von Heidenstam (Suécia)

1915: Romain Rolland (França)

1914: não foi concedido

1913: R. Tagore (Índia)

1912: Gerhart Hauptmann (Alemanha)

1911: M. Maeterlinck (Bélgica)

1910: Paul Heyse (Alemanha)

1909: Selma Lagerlöf (Suécia)

1908: Rudolf Eucken (Alemanha)

1907: Rudyard Kipling (Reino Unido, mas nasceu na Índia)

1906: Giosuè Carducci (Itália)

1905: Henryk Sienkiewicz (Polônia)

1904: Frédéric Mistral (França) e José Echegaray (Espanha)

1903: Bjornstjerne Bjornson (Noruega)

1902: Theodor Mommsen (Alemanha)

1901: Sully Prudhomme (França)

WALTER PORTO / Folhapress

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