‘Por que Waldemar?’ conta história por trás do meme rubro-negro

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – “O novo técnico do Flamengo é o senhor Waldemar”, anuncia com pouca convicção o dirigente Vassoura. “Waldemar é o car$%¨#$”, espinafra um torcedor, em som capturado por todos os microfones da improvisada coletiva.

Diante de um silêncio constrangedor, o repórter Cícero Mello, da ESPN, pergunta: “Por que o Waldemar?”. Enquanto o assustado Vassoura tenta emendar uma resposta, que começa com o clássico “a gente tem que pensar no melhor pro Flamengo…”, torcedores xingam loucamente e começam o coro “ah, ah, ah, fora, Waldemar”.

“Por que Waldemar?”, a pergunta de Mello, é agora também o título da série documental em três episódios produzida pela ESPN, que estreia neste sábado (14), no canal pago e no streaming Star+, com direção e roteiro do competente repórter Mendel Bydlowski em parceria com Wagner Patti.

A desastrosa apresentação de Waldemar Lemos como técnico do Flamengo, em 14 de outubro de 2003, está completando 20 anos (parabéns a todos os envolvidos). Mas foi só alguns anos depois que virou meme e vez ou outra aparece na “timeline” de alguma torcida quando o time fica sem treinador, principalmente se é o Flamengo, o que acontece com frequência.

Aqueles 40 segundinhos folclóricos são destrinchados com riqueza de detalhes no documentário. Parece um jogo dos sete erros do que não se deve fazer: quem inventou de fazer aquele anúncio à beira do campo? Por que permitiram a presença de torcedores? Quem achou que Vassoura, o intrépido dirigente Eduardo Moraes, estava preparado para varrer a crise no anúncio? Por que Vassoura não disse Waldemar Lemos e sim “senhor Waldemar”, aumentando a confusão? E por que Waldemar?

Waldemar Lemos era preparador físico do Flamengo em 2003 e também mais conhecido como o irmão do técnico Oswaldo de Oliveira, com quem trabalhava com frequência.

Depois de resultados ruins e crises intermináveis, o professor Oswaldo deixou o clube. E olha que no dia 12 de outubro (dois dias antes do anúncio) o time venceu o Vasco por 2 a 1, com um homem a menos e gol aos 45 do segundo tempo.

Na coletiva pós-jogo, Oswaldo contabilizou com tristeza: “Somando Flamengo, Fluminense, São Paulo e Vasco, eu tenho 14 meses de salário que não recebo”. E por que Waldemar não saiu junto? A resposta é simples: “Eu era CLT”, diz no documentário, acrescentando que não pediria demissão, como todo bom CLT. Assim, Waldemar deu o treino normalmente naquela terça, dia 14.

Sem dinheiro, o presidente Hélio Ferraz queria uma solução barata. E, em algum momento, chegaram ao nome de Waldemar Lemos, solução caseira (aparentemente, Hélio ouviu a dica do goleiro Julio Cesar). O atacante Edílson, vulgo Capetinha, também deu entrevista dizendo que o elenco preferia alguém conhecido. E citou Waldemar.

Waldemar topou, fez ótima campanha naquele fim de 2003 e levou o rubro-negro ao oitavo lugar. Ainda assim, foi dispensado no fim do ano.

A reconstituição que o documentário traz com todos os envolvidos é deliciosa. Cícero Mello confessa que não atinou na hora da coletiva que o senhor Waldemar e Waldemar Lemos eram a mesma pessoa. O chefe de torcida Peruano, líder do achincalhamento, lembra que eles queriam o ex-atacante Nunes e estavam preparados para xingar qualquer outro nome.

Mas quem mais bem define a folclórica apresentação de 2003 é o humorista e rubro-negro Antonio Tabet: “Era uma celebração do amadorismo. [O anúncio] é um esquete pronto, com criação de expectativa, surpresa, tem tudo ali…”.

O documentário acerta ao esmiuçar a vida de Lemos, suburbano de Realengo que até os dias de hoje faz um belo trabalho social com crianças do bairro. Lemos passou por outros times e chegou a voltar ao Flamengo em 2006, quando foi demitido após levar o time à final da Copa do Brasil -na decisão, o treinador foi Ney Franco.

Por outro lado, cansa um pouco toda vez que se afasta de Waldemar para abraçar outros temas -o filme vai do ataque dos sonhos do Flamengo de 1995 até os títulos recentes com Rodolfo Landim (mesmo com um profissionalismo discutível), passando pela relação com empresas e SAFs.

Há outros personagens que pouco acrescentam, como os inúmeros presidentes flamenguistas, dirigentes antigos de outros clubes e outros ilustres (com todo respeito a Sandra de Sá).

Não dá para abraçar o mundo, mas dá vontade de abraçar Waldemar.

Por que Waldemar?

Direção: Mendel Bydlowski e Wagner Patti. Série em 3 episódios (52 min. cada um). Estreia na ESPN, sáb. (14), às 22h; outros episódios nos dias 21 e 28 (na íntegra no Star+, a partir de sáb.)

SANDRO MACEDO / Folhapress

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