SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Desaparecida há quase uma semana, a brasileira Karla Stelzer Mendes, 42, foi encontrada morta em Israel de acordo com informações divulgadas por autoridades nesta sexta-feira (13). Ela é uma dos três brasileiros mortos depois que a rave em que estavam foi invadida pelo grupo terrorista Hamas no último sábado (7).
Em nota, o Itamaraty confirmou a morte. “Ao solidarizar-se com a família, amigas e amigos de Karla, o governo brasileiro reitera seu total repúdio a todos os atos de violência contra a população civil”, afirmou a pasta.
No dia seguinte ao ataque à Universo Paralello, festival de música eletrônica que era realizado no deserto de Negev, perto do kibutz Re-im e a poucos quilômetros da Faixa de Gaza, equipes de resgate encontraram ao menos 260 corpos no local.
Outros dois brasileiros foram mortos na festa, realizada na região sul de Israel o gaúcho Ranani Glazer, 23, e a carioca Bruna Valeanu, 24. Mendes tinha ido à rave com o namorado, Gabriel Azulay, também encontrado morto na última quarta-feira (11).
No momento da ofensiva, a brasileira chegou a mandar mensagens para seus amigos, de acordo com o jornal O Globo. “Fomos para o mamada [um tipo de bunker], para nos proteger. […] Aí vieram os terroristas e jogaram uma bomba dentro do mamada. A gente saiu correndo. Tem um amigo nosso que ficou lá”, disse ela em áudio reproduzido pelo veículo carioca.
Ronen Rasta, amigo de Mendes, prestou uma homenagem à brasileira em uma publicação no Facebook. “Dê um grande abraço no Gabriel. Enquanto isso, sentirei falta do seu jeito especial”, escreveu ele. “Obrigado pela amizade maravilhosa, pelos finais de semana prolongados, pelos momentos mágicos em inúmeras festas e pelo privilégio de ter você como parte do meu coração e da minha vida.”
Ela era a única brasileira identificada como desaparecida em Israel desde que Glazer e Valeanu foram declarados mortos a chancelaria israelense afirmou, porém, acreditar que era possível que houvesse outros casos semelhantes em encontro com a imprensa latino-americana na quinta-feira (12), sem citar quantos seriam eles ou listar seus nomes.
Fisioterapeuta e moradora de Saquarema, na região dos Lagos do Rio de Janeiro, Marcella Azeredo, 41, era amiga de longa data de Mendes. “Estudamos juntas desde pequenas”, ela contou à reportagem, acrescentando que, embora a amiga tenha nascido na capital fluminense, ela morou por muitos anos com o pai no município.
“Ela era muito livre, gostava muito de viajar. Era sinônimo de vibração, de energia boa”, diz Azeredo. “Amava os animais. A gente brinca que ela gostava mais de bicho do que de gente.”
Azeredo afirma que a brasileira expatriada tinha um filho, Caio Stelzer, fruto de um relacionamento com um saquaremense. A criança nasceu na cidade na região dos Lagos e a princípio continuou vivendo com o pai quando Mendes se mudou para Israel. Há cerca de cinco anos, porém, foi morar com a mãe no Oriente Médio e entrou para o Exército israelense. Ele tem 23 anos.
Segundo a amiga, Mendes “se apaixonou por Israel e ficou”. “Ela viu a oportunidade de desbravar o mundo”, diz. A distância geográfica não cortou, porém, os laços entre as duas, e Mendes tinha visitado a cidade em que cresceu apenas três meses atrás.
Foi também em Saquarema que Mendes descobriu uma de suas grandes paixões: a capoeira. Azeredo afirma que a brasileira expatriada frequentou por muitos anos a Associação Cultural de Capoeira Guarda Negra, e não só havia se tornado instrutora da atividade como continuava a participar das aulas da entidade online.
O perfil da associação publicou uma nota de pesar pela morte de Mendes em uma rede social citando-a por seu nome de capoeira, Karla Muzenza. “Sua paixão pela capoeira e seu espírito vibrante deixam uma lembrança dolorosa e eterna. Karla será sempre lembrada como uma guerreira da capoeira, e sua ausência deixa um vazio que jamais será preenchido”, diz o texto.
Ainda de acordo com Azeredo, a mãe de Mendes vive na cidade do Rio de Janeiro. A amiga diz não ter certeza, no entanto, de que ela tenha sido avisada sobre a morte da filha. “Ela tem muitas comorbidades, mora com familiares. Acredito que os parentes tenham poupado”, diz. A brasileira ainda teria um irmão, mas seu paradeiro é desconhecido. “Ele também é apaixonado por capoeira. O pessoal está tentando localizá-lo.”
Azeredo diz que soube da notícia sobre Mendes como muitos outros: pela TV. “A guerra é uma desgraça para toda a humanidade. É devastador acompanhá-la pela televisão mesmo sem ter ninguém próximo envolvido, mas quando vemos pessoas querida perdendo a vida é muito, muito triste. Moro no Rio, mas percebemos que a guerra não está longe”, conclui.
A ofensiva do grupo terrorista é o pior ataque sofrido por Israel em 50 anos. Por ar, terra e mar, com foguetes e combatentes armados, a facção adentrou o território israelense e realizou sequestros e massacres, como os registrados na rave onde estavam os brasileiros.
Em resposta, Israel declarou guerra ao Hamas e apertou o cerco à Faixa de Gaza, o que aprofundou a crise humanitária no território. Mais de 3.000 pessoas morreram no conflito até agora 1.300 israelenses e quase 1.800 palestinos, incluindo crianças de ambos os lados. De acordo com a ONU, 400 mil pessoas perderam suas casas em razão do conflito.
FRANCISCO LIMA NETO / Folhapress