Exército manobra para promover chefe de gabinete do comandante e evitar impasse

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O Alto Comando do Exército fez uma manobra nesta semana para promover de forma antecipada o chefe de gabinete do comandante Tomás Paiva.

Francisco Humberto Montenegro foi alçado a general de quatro estrelas mesmo sendo o oficial em último lugar pelos critérios de antiguidade entre seus pares de turma na Aman (Academia Militar das Agulhas Negras) que seguem na ativa.

Com a manobra, foram promovidos dois generais em vez de um, como prevê os regulamentos da Força. O outro promovido foi o general Maurílio Ribeiro.

Montenegro ocupa a chefia de gabinete do comandante do Exército desde 2019 e era o favorito entre os demais militares do Alto Comando para receber a promoção, que ocorre em votação secreta.

No entanto, caso só ele progredisse na carreira, as regras do Exército exigiriam que todos os demais generais da sua turma fossem enviados para a reserva. O efeito dominó deixaria a rodada posterior de promoção, prevista para março, sem concorrentes.

Além de ser inédito, a ausência de um general apto a ser promovido ao Alto Comando em março criaria um impasse para o Exército. Há departamentos e comandos regionais que só podem ser chefiados por um general de quatro estrelas —e uma dessas posições ficaria vaga.

Outra possibilidade para evitar o impasse seria dividir os generais que concorreriam à promoção em dois grupos, para escolher um oficial agora e outro em março, como ocorre tradicionalmente. O Alto Comando, porém, entendeu que essa saída seria injusta porque não daria igualdade de condição para todos oficiais-generais na disputa.

Na carreira, Montenegro acompanhou como chefe de gabinete os comandantes Edson Pujol, Paulo Sérgio Nogueira, Marco Antônio Freire Gomes, Júlio Cesar Arruda e Tomás Paiva. Discreto e cumpridor de tarefas, ele ganhou a confiança de todos os chefes militares e atuou como interlocutor deles com os demais generais quatro estrela da Força.

Do governo Jair Bolsonaro (PL) ao início da gestão Lula (PT), participou de momentos conturbados em crises internas e agiu como conselheiro dos comandantes.

Ele teve influência, por exemplo, na elaboração da nota dos comandantes das Forças Armadas, em 11 de novembro de 2022, durante a efervescência dos acampamentos golpistas. O texto foi interpretado como um endosso dos militares às manifestações antidemocráticas que ocorriam em frente aos quartéis após a campanha eleitoral.

Sobreviveu ainda às trocas de cargos que Paulo Sérgio promoveu após a saída de Pujol na pior crise nas Forças Armadas desde a redemocratização, em 2021, pela avaliação interna de que fazia um bom trabalho.

Apesar da preferência, Montenegro era o general mais moderno dentre os militares ainda na ativa formados na turma da Aman de 1986.

Na prática, a promoção solo de Montenegro causaria a queda de oito generais de sua turma e deixaria vaga uma cadeira no topo da carreira. Ou seja, na próxima rodada de promoção, não haveria um militar da sua turma apto a alcançar a quarta estrela.

A promoção prevê novos benefícios para Montenegro e Ribeiro, como um aumento no salário de cerca de R$ 4.000, a depender dos cursos que tiver feito na carreira, e em benefícios esporádicos, como nas movimentações para outros estados, que podem ultrapassar os R$ 150 mil.

Segundo as regras militares, o Alto Comando do Exército se reúne três vezes ao ano para decidir quais generais são promovidos e para quais cargos serão enviados. As reuniões acontecem tradicionalmente em fevereiro, junho e outubro.

A primeira reunião do ciclo de cada turma promove dois generais para a quarta estrela. O segundo e terceiro encontros definem, cada um, apenas um oficial para o último posto da Força.

A promoção definida nesta semana pelo Alto Comando seria a segunda da turma de 1986. Com a antecipação, não deve haver novas promoções para o último posto do Exército na próxima reunião do colegiado.

Ribeiro e Montenegro vão assumir os postos mais altos da Força nos lugares dos generais Estevam Theophilo, atual chefe do Comando de Operações Terrestres e considerado o mais bolsonarista entre os militares do topo da carreira; e Fernando Soares, chefe do Estado-Maior do Exército, que deixará o cargo somente em março.

A proposta de antecipar a promoção dos generais foi apresentada por Soares, que ocupa a função de chefia da Comissão de Promoção de Oficiais.

A justificativa apresentada internamente, segundo relatos feitos à reportagem, foi a de que a decisão seria mais justa para evitar que a última vaga fosse disputada por poucas pessoas ou mesmo, em caso da escolha apenas de Montenegro, faltasse general para chegar ao topo da carreira.

A promoção de oficiais não costumava ser um motivo de preocupação na caserna. Segundo as regras militares, a seleção de quais militares devem avançar na carreira segue normas específicas, como a antiguidade e a colocação nos cursos de formação.

Os regimentos das Forças estabelecem que os oficiais são promovidos por merecimento de cadete a coronel. A promoção para oficiais-generais são por escolha do Alto Comando, em votações secretas, e não necessariamente os mais bem colocados na turma são eleitos para ganhar as novas estrelas.

Esse método de promoção causa uma série de críticas às Forças Armadas. Estudiosos consideram que a falta de critérios para as promoções dos altos postos da carreira abrem brecha para decisões políticas.

O Exército também prevê um risco de desgaste com o ineditismo de avaliar a promoção do tenente-coronel Mauro Cid, um militar que hoje usa tornozeleira eletrônica e que fechou acordo de delação após ter ficado quatro meses preso.

Como a reportagem mostrou, Cid é um dos cabeças da turma da Aman de 2000 e sua promoção para coronel está prevista para março de 2024. O comandante do Exército e generais próximos procuram na legislação se há impeditivo para a progressão na carreira do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.

CÉZAR FEITOZA / Folhapress

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