RIO DE JANEIRO, RJ, E BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O projeto de lei para criar a ANCiber (Agência Nacional de Cibersegurança) vai propor uma estrutura menor do que a prevista originalmente pelo GSI (Gabinete de Segurança Institucional) e deixar de apontar uma fonte de receita própria para bancar o funcionamento do órgão.
O custo para manter a agência, quando ela estiver plenamente implementada após cinco anos de atividades, está estimado em R$ 540 milhões. Na proposta inicial, o montante era de R$ 600 milhões.
As alterações foram feitas após o desgaste da proposta original, antecipada pela Folha de S.Paulo, que previa taxar usuários de internet de todo o país para bancar a operação da agência.
O texto está em discussão na Casa Civil, que consultou o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, e ainda depende do aval do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para envio ao Congresso.
A criação da agência faz parte de um plano mais amplo de implementação de uma política nacional de segurança cibernética, batizada de PNCiber, que será instituída por decreto a ser assinado pelo presidente Lula, sem passar pelo crivo dos parlamentares.
De acordo com Marcelo Malagutti, assessor especial do GSI, a política vai estabelecer os objetivos a serem alcançados no tema, e a criação de uma agência ajudará a melhorar a governança da atividade.
A minuta do decreto já está pronta para a assinatura, segundo ele. No mês passado, o ministro do GSI, general Marcos Antonio Amaro dos Santos, afirmou que o órgão, tradicionalmente comandado por militares e ligado à Presidência, pretendia dar sequência ao tema ainda no mês de outubro.
“A proposta da agência é um pouco mais complexa por conta do quantitativo de pessoal. Criar 710 novas vagas dentro do governo, com quase 400 funções gratificadas é uma questão difícil, espinhosa”, disse Malagutti, durante seminário na FGV Direito Rio.
A ANCiber foi inspirada em um modelo de uma agência reguladora. Para cada ano de implantação, uma parcela do efetivo será incorporada ao quadro funcional da instituição. Na proposta original, estavam previstos 81 funcionários no primeiro ano de atuação.
“A gente já tem o apoio de alguns ministérios importantes, como Fazenda e Planejamento, mas ainda não temos fechada a questão com o Ministério da Gestão e Inovação. Ainda estamos fechando alguns tópicos, mas posso dizer que estamos nos finalmentes dessa questão”, acrescentou.
Segundo Malagutti, a redução do tamanho da agência se deve à decisão do MEC (Ministério da Educação) de colocar sob seu guarda-chuva as funções da diretoria de cibereducação, antes prevista na composição da agência.
A mudança permitiu a redução de 800 para 710 de cargos estimados quando o órgão estiver plenamente instalado, após cinco anos de criação. Isso dará um alívio de 10% na projeção de custo de manutenção do órgão.
Mas o número total de servidores ainda pode aumentar em função do avanço da discussão sobre a regulação da inteligência artificial, tema não previsto no escopo da agência de cibersegurança o que pode gerar novos custos.
Quanto ao financiamento da proposta, está completamente descartada a criação de uma taxa sobre os usuários de internet proposta que se tornou alvo da oposição e foi desautorizada pelo ministro Paulo Pimenta, da Secom (Secretaria de Comunicação Social da Presidência).
Depois da publicação da reportagem pela Folha, de S.Paulo Pimenta divulgou uma nota dizendo que não havia “nenhuma possibilidade de taxação de usuário de internet para financiar uma agência de cibersegurança ou qualquer iniciativa desse tipo”.
Segundo Malagutti, o projeto de lei em discussão na Casa Civil não vai apontar uma nova fonte de receita para o custeio da agência e deve prever remanejamento de recursos do Orçamento.
“A discussão leva o financiamento pelo Orçamento da União. Quando chegar no Congresso, até a tal da taxa pode voltar. Existe uma outra discussão que envolve os fundos já previstos, alguns deles que crescem sem utilização significativa. O Congresso pode fazer uma alteração legal para a utilização de alguns desses fundos [para bancar a agência de cibersegurança]”, disse.
Segundo uma fonte do governo ouvida pela Folha de S.Paulo, quando a proposta foi apresentada pela primeira vez à equipe econômica do governo, o GSI foi alertado da dificuldade do cenário fiscal para o próximo ano para a criação de uma despesa na ordem de R$ 600 milhões de caráter contínuo.
Diante disso, o órgão cogitou na proposta original a criação de uma taxa correspondente a 1,5% do valor pago pelos internautas para ter acesso à rede, em conceito similar à taxa de iluminação pública, cobrada diretamente na fatura da conta de luz.
O GSI argumentava que o percentual correspondia à soma do que é arrecadado com o Fust (Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações) 1% e com o Funttel (Fundo para o Desenvolvimento Tecnológico das Telecomunicações) 0,5%.
De acordo com uma pessoa a par das discussões, recursos parados no Fust e no Funttel são vistos como opção para o encaminhamento da discussão no Congresso Nacional.
“Já que não podíamos discutir como financiar, passamos a discutir quanto custava não ter a agência. Quando apresentamos a estrutura de custos pesada que a gente tem causados [pelas falhas na cibersegurança] para os órgãos do governo, inclusive para a Fazenda, a percepção era de que deveríamos parar essa sangria”, disse o assessor do GSI no evento.
Segundo a consultoria Accenture, os ataques cibernéticos provocaram prejuízos financeiros que podem chegar a US$ 100 bilhões.
“Provavelmente, ainda este mês, o presidente deve se dispor a assinar, se não os dois projetos, pelo menos o decreto da política nacional com o escopo um pouco menor do que o apresentado na consulta pública, mas bastante maior do que era imaginado como possível no início do ano”, disse Malagutti.
A instituição da política nacional de cibersegurança e a criação da ANCiber voltarão a ser debatidas no dia 7 de novembro em um evento de Segurança da Informação, organizado pelo GSI. O encontro virtual terá servidores públicos da esfera federal como público-alvo.
ITALO NOGUEIRA, NATHALIA GARCIA E MARIANNA HOLANDA / Folhapress