Opinição Econômica (segunda 30/10)

Vale entre os vazamentos, a China e as barragens

Ações da empresa subiram mais de 8% na última semana, mas acumulam queda de 25% no ano

Marcos de Vasconcellos

Jornalista, assessor de investimentos e fundador do Monitor do Mercado

Na última semana, os investidores viram as ações da Vale (VALE3) voarem mais de 8% na Bolsa, enquanto o Ibovespa (principal indicador do nosso mercado) ficou no zero a zero. Uma informação vazada às vésperas da divulgação do balanço deu força para a mineradora.

Para quem não acompanhou, uma notícia publicada na tarde de quinta-feira (26) afirmava que a Vale pagaria cerca de US$ 2 bilhões em dividendos extraordinários para seus acionistas. A publicação foi feita (e confirmada pela companhia) enquanto o mercado ainda estava aberto, gerando uma corrida pelas ações. Isso resultou, inclusive, na suspensão das negociações por alguns minutos.

Esse tipo de comunicação, que pode ter impacto direto no preço das ações, por obrigação, deve ser feita pela companhia apenas quando o mercado está fechado. Isso serve para diminuir a assimetria de informação, ou seja, reduzir a chance de algumas pessoas negociarem a preços melhores só porque sabem algo que outros ainda ignoram.

O vazamento fez o preço do papel entrar em disparada horas antes de a empresa fazer a efetiva divulgação do seu balanço trimestral —dessa vez, com o mercado fechado. Os resultados foram considerados “mornos” por analistas. Para o BTG Pactual, os números mostraram “progresso limitado nas principais linhas operacionais”. Para a XP, foram “neutros”.

Mas a corrida pelas ações, de olho na distribuição de dividendos, continuou fazendo seus preços subirem. Um desavisado que olhar apenas o gráfico e a agenda de divulgação de resultados pode achar que o mercado amou os números do terceiro trimestre. Agora você sabe que não foi bem assim.

Apesar da alta de mais de 8% na última semana, os investidores que apostaram na Vale este ano estão sofrendo. Desde 1º de janeiro, foram praticamente 25% de queda, enquanto o Ibovespa subiu mais de 6%.

Sua dependência da economia da China (que movimenta o preço do minério de ferro) tem feito com que as ações fiquem cada vez menos presentes nas conversas de quem opera no mercado financeiro, apesar da altíssima liquidez que oferecem. Há pouco tempo, eram apontadas como escolhas óbvias. Não são mais.

Quem corre para pegar dividendos parece ignorar que o valor dos pagamentos é automaticamente descontado do preço das ações. Orientar investimentos apenas com base em uma notícia, aliás, costuma ser uma má decisão de longo prazo. É como tentar resolver um cubo mágico olhando apenas um dos lados.

Olhando a teia do noticiário recente, vemos que há cerca de 15 dias a empresa divulgou que deve faturar R$ 18 milhões neste ano vendendo areia retirada dos rejeitos do minério de ferro em Minas Gerais. Aqueles mesmos rejeitos que foram a causa dos incidentes que mataram centenas de pessoas em Brumadinho (MG) e Mariana (MG), considerados os maiores desastres ambientais do país.

Dias depois, sete entidades, como Ministério Público Federal e a Defensoria Pública da União, protocolaram uma petição na Justiça para cobrar uma indenização que passa dos R$ 70 bilhões, justamente relacionada ao rompimento da barragem de rejeitos da Samarco, empresa da Vale e da BHP Billiton, lá em 2015. A companhia disse não ter sido notificada ainda sobre o pedido, afirmando que se manifestará no processo judicial em questão.

Cabe ao investidor tentar enxergar a companhia por diferentes ângulos, tendo em mãos números frios e notícias quentes, para tomar decisões afinadas com o que busca nas empresas das quais se torna sócio.

Redação / Folhapress

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