BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Representantes do centrão na Câmara dos Deputados rebateram as declarações de Lula (PT), que atribuiu aos partidos políticos aliados a falta de mulheres no primeiro escalão do governo, afirmando que o presidente tenta se desvencilhar de uma responsabilidade que é sua.
Na semana passada, em café com jornalistas, Lula afirmou que, quando são estabelecidas alianças com uma legenda, nem sempre os partidos têm mulheres para indicar.
“Eu lamento, porque o que eu quero fortalecer no governo é passar a ideia de que a mulher veio para a política para ficar. Quando um partido político tem que indicar uma pessoa e não tem mulher, eu não posso fazer nada”, disse o presidente.
Nem todos os parlamentares do centrão procurados pela reportagem, entretanto, quiseram se contrapor ao petista. Alguns se esquivaram de debater a redução feminina na Esplanada dos Ministérios após trocas que oficializaram a entrada do grupo no governo federal.
De uma forma geral, os representantes das legendas afirmaram que a decisão de quem integra ou não a Esplanada cabe ao presidente da República. Eles acrescentam que, caso Lula tivesse determinado como fundamental a indicação de mulheres, os partidos teriam atendido ao pedido.
O grupo, no entanto, só indicou homens para os postos.
Um membro do centrão reconhece que os partidos poderiam ter escolhido mulheres para os cargos, mas diz que o contexto político das mudanças trouxe dificuldade e que Lula poderá aumentar a participação das mulheres nos próximos ajustes na composição do governo.
As mudanças no ministério foram realizadas numa tentativa de o governo melhorar sua articulação política com o Legislativo e consolidar sua base de apoio na Câmara dos Deputados, que se sentia sub-representada na Esplanada.
Nos últimos meses, Lula demitiu três mulheres em cargos do primeiro escalão do governo: Daniela Carneiro (Turismo), Ana Moser (Esportes) e Rita Serrano (Caixa Econômica Federal).
Ele nomeou Celso Sabino (União Brasil-PA), no Turismo, André Fufuca (PP-MA), nos Esportes, e Silvio Costa Filho (Republicanos-PE), em Portos e Aeroportos, além de indicar o nome de Carlos Antônio Vieira Fernandes, aliado do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para o comando da Caixa.
“É ridículo. Ele demitiu as mulheres do governo dele porque ele quis, ninguém mandou ele demitir ninguém. Tem muitas mulheres extremamente competentes aqui na Câmara, no Senado, nas entidades e associações. É fácil delegar para os outros a responsabilidade”, diz o deputado Pedro Lupion (PP-PR), presidente da FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária), uma das principais forças da Casa.
Historicamente, há uma baixa representatividade em cargos eletivos nos Poderes Legislativo e Executivo no Brasil, assim como nos postos de lideranças de partidos políticos, apesar de as mulheres serem maioria da população.
Segundo dados do Censo Demográfico 2022, o país tem 104,5 milhões de habitantes mulheres, o que representa uma fatia de 51,5% da população (enquanto 48,5% do total de brasileiros são homens).
O Legislativo nunca teve desde a redemocratização uma mulher como presidente da Câmara dos Deputados ou do Senado –foram 18 e 15 ocupantes do posto, respectivamente, nesse período, todos homens.
Na atual legislatura da Câmara, por exemplo, apenas uma mulher é líder partidária na Câmara, a deputada Jandira Feghali (PC do B-RJ). Das 513 cadeiras disputadas nas eleições de 2022, 91 foram obtidas por mulheres.
As mudanças na Esplanada ocorrem num momento em que, em vez de tentar reverter essa sub-representação, o Congresso analisa um pacote de projetos que flexibiliza as cotas eleitorais e promove a maior anistia a partidos políticos da história com apoio da maior parte dos partidos –do PL ao PT.
Um desses projetos é a PEC das Mulheres, que estabelece uma reserva de cadeiras mínima nos Legislativos, mas pode reduzir a atual cota de candidaturas.
Parlamentares dizem ainda que essa crítica de Lula não deve ser restrita aos partidos do centrão e apontam que o próprio petista indicou apenas 3 mulheres, de 9, de sua cota pessoal de ministros. São elas: Nísia Trindade (Saúde), Margareth Menezes (Cultura) e Anielle Franco (Igualdade Racial).
Um dos principais nomes do centrão diz à reportagem, sob reserva, que a representatividade feminina não é uma pauta prioritária desses partidos e que eles não são cobrados de seus eleitores por isso. Dessa forma, na sua avaliação, não cabe ao governo exigir essa atitude das siglas.
Ele afirma ainda que o PT de Lula indicou apenas 2 mulheres para a Esplanada dos Ministérios (entre os 11 que ocupam cargos na Esplanada) e que se o governo quer dar um exemplo, ele “precisa começar olhando para a sua casa primeiro”.
Esther Dweck, na Gestão, e Cida Gonçalves, na pasta das Mulheres, são as representantes da sigla no governo.
“O plenário mostra que na disputa eleitoral as oportunidades para mulheres são menores, infelizmente. Mas as que estão envolvidas politicamente são extremamente capazes e competentes, não vejo demérito algum nelas ocuparem cargos de liderança. Haja visto que o melhor ministro do governo passado foi a [ex-ministra da Agricultura e atual senadora] Tereza Cristina”, disse Lupion.
VICTORIA AZEVEDO / Folhapress