Elite entre servidores, funcionários do BC veem deterioração da carreira como causa de êxodo

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Integrantes da elite do funcionalismo público, os servidores do Banco Central veem a deterioração da carreira como motivo para o grande fluxo de saída de profissionais da instituição e para o aumento das mobilizações por valorização.

Hoje, o BC conta com 3.300 servidores em atividade, pouco mais da metade do total de 6.470 cargos previstos em lei para a autarquia. E a tendência é de queda. Até 2027, está prevista a aposentadoria de mais 692 funcionários.

O movimento de baixa também é puxado pelos trabalhadores que estão optando por seguir carreira no setor privado e em outros órgãos públicos -inclusive servidores que compõem o alto escalão do BC.

Esse êxodo foi apelidado internamente de “Drexit”, junção de Drex (nome da nova moeda digital do BC) e Brexit (expressão referente à saída do Reino Unido da União Europeia).

Recentemente, o servidor Bruno Batavia, por exemplo, que trabalhava no projeto de desenvolvimento do Drex, deixou o BC para assumir um cargo na área de inovação da gestora Valor Capital.

Outros 150 funcionários da autoridade monetária estão inscritos no concurso público para a Câmara dos Deputados, em dezembro.

Para recompor a mão de obra, o BC obteve autorização do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos para a realização de um concurso público com a oferta de 100 vagas de analista. A admissão dos novos servidores, contudo, está prevista para ocorrer apenas entre fevereiro e março de 2025.

A falta de concursos públicos para o BC era uma das reivindicações feitas pela categoria na mobilização de 2022, que culminou em uma greve por reajuste salarial que durou cerca de três meses -o mais recente foi realizado há 10 anos.

O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) concedeu um reajuste linear de 9% para servidores públicos federais a partir de maio.

Hoje, os servidores do BC reclamam sobretudo da falta de isonomia entre as carreiras de Estado e cobram uma equiparação de tratamento no funcionalismo público.

O corpo funcional do BC é composto majoritariamente por analistas (82,6%). Eles são profissionais de nível superior, com salários que variam de R$ 20.924,80 a R$ 29.832,94, sem bônus.

Algumas das atribuições dos analistas envolvem a formulação e execução de projetos relacionados a políticas monetária, cambial e de crédito, gerenciamento do sistema de metas para a inflação e do sistema de pagamentos do país.

Eles recebem suporte dos técnicos da instituição, que correspondem a 12,7% do total de funcionários do BC. Com nível médio, esses profissionais têm um salário mensal de R$ 7.938,81 a R$ 13.640,89.

Os técnicos também auxiliam o trabalho dos procuradores -parcela que equivale a 4,7% do quadro da instituição. Esse cargo é destinado a profissionais formados em direito e tem, entre suas atribuições, a representação judicial e extrajudicial da autarquia e atividades de consultoria e assessoramento jurídicos ao BC.

Os salários dos procuradores são maiores do que as remunerações das duas outras categorias, variando entre R$ 22.905,79 e R$ 29.761,03.

Para a presidente da ANBCB (Associação Nacional dos Analistas do Banco Central do Brasil), Natacha Rocha, há uma percepção distorcida da população brasileira com relação à remuneração dos funcionários do BC.

“Em relação a carreiras congêneres, a gente ganha menos. É o caso da Receita Federal e da própria Procuradoria que trabalha junto com os analistas do Banco Central e ganha mais, tendo aberto essa assimetria desde 2016”, disse.

Rocha também considera que o alto nível de complexidade do trabalho do BC é invisível aos olhos da sociedade. Segundo ela, o BC precisa de uma mão de obra altamente especializada para desenvolver produtos complexos como Pix, Drex (real digital) e SVR (Sistema Valores a Receber) e para regular e supervisionar o sistema financeiro nacional.

Há disparidade dentro do próprio BC. O procurador (ligado às carreiras jurídicas) recebe o chamado honorário de sucumbência, superando em mais de R$ 12 mil a remuneração dos demais servidores.

Na última quarta-feira (1º), os servidores do BC endureceram a atual mobilização, que tem gerado maior lentidão na prestação de serviços da autoridade monetária, atraso na divulgação de indicadores econômicos e paralisações parciais diárias desde julho.

Os servidores reivindicam a criação de um bônus de produtividade semelhante à gratificação que foi regulamentada para os auditores fiscais da Receita Federal.

O pagamento de bônus por produtividade ou eficiência tem funcionado como uma forma de turbinar salários de servidores. A Receita é a segunda categoria a conquistar o benefício de forma permanente, após os membros da carreira jurídica.

Os valores do bônus se somam aos salários da categoria. Um auditor fiscal tem remuneração inicial de R$ 21.029,09, e final de R$ 27.303,62. Para os analistas, os salários vão de R$ 11.684,39 a R$ 16.276,05. As cifras são anteriores ao reajuste de 9%.

Além do bônus, os funcionários do BC pedem medidas de reestruturação de carreira, como a exigência de ensino superior para o cargo de técnico (o que altera a qualificação necessária para ingresso na carreira) e alteração de nomenclatura do cargo de analista para auditor.

Todos os postos do BC são obrigatoriamente ocupados por servidores de carreira, com exceção das cadeiras da diretoria colegiada. Os membros da alta cúpula da autoridade monetária são indicados pelo presidente da República e aprovados pelo Senado Federal.

Caso sejam aprovadas as indicações do professor Paulo Picchetti e do servidor Rodrigo Alves Teixeira, a diretora Carolina Barros (Administração) será a única mulher na alta cúpula do BC em 2024, após a saída de Fernanda Guardado (Assuntos Internacionais e Gestão de Riscos Corporativos).

A equidade de gênero é ainda uma realidade distante na composição do quadro funcional BC. Do total de servidores ativos ocupando as vagas de analistas, técnicos e procuradores, apenas 23% são mulheres, contra 77% homens.

Os dados mostram também a falta de diversidade nos quadros da instituição. Segundo os números do BC mais recentes, de agosto, 15,3% dos funcionários se declaram negros (pretos e pardos), enquanto 63,7%, brancos. Nesse recorte, o total de servidores ativos corresponde a 3.322.

Conforme números relativos a junho sobre o capital humano do BC, 2,94% dos servidores possuem algum tipo de deficiência. Quanto à faixa etária, 56,98% têm entre 45 e 60 anos, 33,1% abaixo de 45 anos e 9,93% acima de 60 anos. Nesses cálculos, foram considerados 3.304 funcionários em atividade.

Hoje, quase metade (49,8%) do corpo funcional do BC se concentra em Brasília. Cerca de 17% dos funcionários estão em São Paulo e 11% ficam baseados no Rio de Janeiro. A autoridade monetária conta ainda com representantes em outras capitais brasileiras, como Belo Horizonte, Porto Alegre, Curitiba, Fortaleza, Recife, Salvador e Belém.

NATHALIA GARCIA / Folhapress

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