‘Detox digital’ reduz não só as emoções negativas, mas as positivas também

LISBOA, PORTUGAL (FOLHAPRESS) – Dar um tempo das redes sociais —o popular “detox digital”— traz benefícios para a redução de sentimentos negativos que já foram amplamente descritos pelos cientistas. Agora, um novo trabalho mostra que o distanciamento dessas plataformas também pode diminuir, simultaneamente, as emoções positivas dos usuários.

Se por um lado a abstinência dos aplicativos ajuda a reduzir as experiências negativas —como comparação social, comentários depreciativos e até bullying —, por outro, o jejum também minora ações que trazem sensações de recompensa social, como likes, crescimento do número de seguidores e mensagens positivas.

O resultado surpreendeu os próprios cientistas responsáveis pelo estudo, que descreveram a situação com inesperada.

“Acreditamos que isso [diminuição dos sentimentos positivos dos participantes] se deve a uma ‘perda’ de experiências socialmente gratificantes das redes sociais”, explica um dos autores do trabalho, Niklas Ihssen, que é professor do departamento de psicologia da Universidade de Durham, no Reino Unido.

“As nossas descobertas sugerem que as redes oferecem recompensas sociais poderosas, e a abstenção pode, portanto, levar a alguma redução das emoções positivas, porque essas recompensas já não estão disponíveis”, diz o cientista.

O artigo, publicado na última quarta-feira (8) na revista especializada PLoS One, tentou compensar ainda um outro desequilíbrio frequente em pesquisas que avaliam as emoções dos usuários: o recurso exclusivo a questionários em que os próprios participantes mensuram e descrevem seus sentimentos.

Em muitos dos trabalhados dessa área, a autoavaliação dos voluntários é a principal ferramenta para medir os efeitos psicológicos.

Para ultrapassar isso, os cientistas optaram por mesclar esses questionários com diversas abordagens, incluindo experiências em laboratório. O objetivo principal era captar certas consequências implícitas da abstinência das redes.

“Um dos desafios é acompanhar, de uma forma realista, os efeitos da redução do consumo [das redes sociais]. Entre outras técnicas, utilizamos para isso um método denominado ‘avaliação ecológica momentânea’. Nele, os participantes recebem miniquestionários em seus smartphones em vários momentos do dia, permitindo uma avaliação mais naturalista do humor e dos comportamentos”, descreve Niklas Ihssen.

Além das pequenas pesquisas, havia ainda uma avaliação maior. Por volta das 21h30 de cada dia do experimento, o grupo avaliado respondia a um questionário mais abrangente.

Ao longo do trabalho, os voluntários tiveram de fazer visitas também a um laboratório da Universidade de Durham, onde foram realizados testes mais aprofundados que mensuravam outras componentes, como percepção temporal e de esforço e a reação a estímulos.

Durante todo o estudo, os participantes tiveram uma ferramenta que monitorava o tempo de uso das telas. Embora tenham sido orientados a não entrarem nas redes sociais e a desabilitarem as notificações, eles não precisaram deletar os respectivos aplicativos do celular.

Segundo os autores, manter os apps nos dispositivos contribui para evitar que o grupo estudado usasse outros dispositivos para acessar as redes. Essa configuração permitiu ainda que os cientistas identificassem eventuais “recaídas” no uso das ferramentas.

No próprio experimento, aliás, vários participantes não conseguiram manter o detox total. Apenas 7 dos 51 envolvidos conseguiram ficar completamente abstêmios durante os sete dias determinados. A maioria, porém, reduziu drasticamente o uso.

A própria ideia de ter de ficar sem redes sociais já foi o suficiente para, de acordo com os cientistas, dificultar o recrutamento para o experimento.

“Os participantes precisavam estar preparados para se absterem das redes sociais durante uma semana, e muitos fatores podem ter inicialmente dissuadido os indivíduos de fazerem isto, incluindo o chamado FOMO [‘fear of missing out’, ou medo de perder algo, na sigla em inglês]”, diz o autor.

Segundo Niklas Ihssen, embora a abstinência total tenha se mostrado difícil, a maioria dos evolvidos pode diminuir consideravelmente o tempo passado nas redes, saindo de uma média de 3 a 4 horas diárias para cerca de 30 minutos durante o experimento.

O estudo mostrou ainda que, de uma maneira geral, os participantes também não tiveram manifestações relevantes de sintomas relacionados à síndrome de abstinência.

“Em última análise, os nossos resultados implicam que é possível reduzir substancialmente o uso das redes sociais sem ter efeitos colaterais significativos no humor e em outros processos psicológicos. Ao mesmo tempo, parece difícil abster-se completamente”, completa o autor.

GIULIANA MIRANDA / Folhapress

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