SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Roseane Siqueira, 45, chegou ao terminal Vila Nova Cachoeirinha, na zona norte de São Paulo, pouco antes das 14h desta quinta-feira (16). Vestia roupa social, estranha aos 32°C indicados pelo termômetro da rua naquele momento. “Vou a uma entrevista”, disse à reportagem.
Seu trajeto até o destino levaria 30 minutos, afirmou. Iria de ônibus até a Lapa, na zona oeste, onde pegaria um táxi até o bairro vizinho da Água Branca, local do processo seletivo.
Porém, nada disso ocorreu. Ao entrar no coletivo -sem ar-condicionado-, a mulher começou a transpirar muito, e sua camisa ficou encharcada. Depois, disse que estava se sentindo enjoada. E logo passou a ter também enxaqueca. Resolveu voltar para casa.
Às 14h30 estava ainda mais quente. Os termômetros marcavam 34°C.
O estudante Paulo Ferreira, 23, ansiava pela chegada do ônibus que o levaria à USP (Universidade de São Paulo). Ele partia do terminal Parque Dom Pedro 2º, no centro da cidade.
“Tem ar-condicionado, vai ser tranquilo. Até moraria nele hoje”, brincou. Ao entrar no veículo, mudou de ideia. A refrigeração não funcionava adequadamente.
Os passageiros clamavam por ajuda do motorista. Este dizia não ter como agir. Paulo desembarcou na rua da Consolação, não muito longe de seu ponto de partida, e seguiu de metrô.
Junto a ele desceu a aposentada Maria Tavares, 67. Estava com as bochechas vermelhas de calor. Com um leque, tentava aliviar a sensação. “Nesta semana já peguei trem quente, ônibus quente, metrô. Cadê o respeito? Eu posso morrer”, disse.
Tavares ia de uma consulta médica para sua casa no Jardim Ângela, extremo sul da capital. Embarcada no ônibus que a levaria até o terminal Santo Amaro, na metade da rota respirou fundo e gritou “obrigada!”. O cobrador olhou assustado. “Tá muito gostoso aqui, moço”, continuou Maria.
No terminal Amaral Gurgel, no centro, o motorista de um ônibus que seguia em direção ao Jardim Peri Alto, na zona norte, disse que teve que abrir a tampa traseira do coletivo na tentativa de resfriar o interior do veículo.
O cobrador, que transpirava de maneira significativa, relatou que já havia tomado várias garrafas de água.
Enquanto esperava o ônibus sair com destino à zona norte, a diarista Maria Vilma Morais, 51, tentava conter o calor bebendo água e colocando o rosto próximo à janela. “Forno. Tinha que ter ar-condicionado, mas não existe”, lamentou.
Na tarde desta quinta, mais uma em meio à onda de calor intenso que atinge grande parte do país, a reportagem esteve em cinco linhas de ônibus de São Paulo, partindo da zona norte em direção à zona sul. Três dos veículos tinham refrigeração, mas o sistema operava normalmente em apenas um deles.
Procurada para comentar os relatos, a SPTrans não respondeu até a publicação deste texto.
A reportagem esteve também em cinco terminais da capital –Santo Amaro, Amaral Gurgel, Bandeira, Parque Dom Pedro 2º e Vila Nova Cachoeirinha. Assim como observado nos pontos de ônibus pelas ruas, nos terminais os passageiros também ignoravam veículos sem ar-condicionado e formavam grandes filas por um lugar nos mais frescos.
Durante os trajetos, motoristas permitiam a entrada de ambulantes com água nos ônibus. Cada garrafa era vendida por R$ 4, e a procura era alta.
E para aliviar o calor, o líquido não era somente ingerido. O mecânico Henrique Cardoso, 33, que seguia para o trabalho em Interlagos, na zona sul, despejava água na nuca para tentar se refrescar.
BRUNO LUCCA E PAULO EDUARDO DIAS / Folhapress