SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O governo de São Paulo deve aprovar na Assembleia Legislativa a autorização para privatizar a Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo) sem divulgar números de quanto deve arrecadar para os cofres públicos com a medida.
Além disso, também não há detalhes sobre a suposta redução da tarifa caso a companhia vá para o controle privado, um dos argumentos principais usados pela gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos) para justificar a venda.
O projeto que autoriza a desestatização da companhia deve ir à votação no começo de dezembro, nas contas dos parlamentares, e o governo tem maioria para aprovar a proposta na Assembleia.
Mas ainda não é possível saber quanto a venda vai reverter em dinheiro para o estado. O governo diz que os estudos que vão detalhar os valores saem só em janeiro.
A oposição critica o expediente acelerado, e especialistas divergem entre quem diz que o projeto é um cheque em branco para o governo e quem defende que a autorização da Alesp não demanda esse detalhamento.
A ideia do governo é diluir a participação do estado na empresa, hoje de 50,3%, para uma fatia entre 15% e 30%, mas deve aprovar o projeto antes de detalhar qual será a participação -impossibilitando assim o cálculo da arrecadação possível. Também há detalhes de qual será o valor de referência da oferta pública das ações antes de encaminhar o projeto para discussão.
Em conversa com jornalistas na quinta (16) após audiência pública na Assembleia, a secretária de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística, Natália Resende, afirmou que a participação final do governo na companhia será definida pelo Conselho Diretor do Programa Estadual de Desestatização, que fará a modelagem da privatização.
Questionada sobre qual a estimativa de arrecadação, ela afirmou que “isso é também o que a gente está estudando agora”. Como a empresa hoje tem 49,7% das ações listadas na bolsa, afirmou, o governo “sempre tem o cuidado de passar as novas informações junto com fatos relevantes para ter o cuidado com a CVM [Comissão de Valores Mobiliários]”, evitando responder à pergunta da reportagem.
Outras privatizações de grande porte, no entanto, foram anunciadas já com expectativa de venda.
O governo Jair Bolsonaro (PL), do qual Tarcísio fazia parte, divulgava antes da venda a estimativa de movimentação de R$ 67 bilhões com a privatização da Eletrobras -o hoje governador paulista já citou a empresa como modelo para privatização da Sabesp.
Além disso, um dos argumentos principais da gestão em SP é o de que a tarifa paga pelo consumidor vai reduzir se a empresa for privatizada e aumentar se ficar sob controle estatal, diante da necessidade de aumentar investimentos para universalizar o saneamento.
Mas o governo ainda não apresentou números ou estimativas de quanto exatamente pode baixar ou aumentar.
Questionada sobre esses valores, Resende afirmou que a informação deve constar na próxima fase de estudos do IFC (International Finance Corporation), braço do Banco Mundial que recomendou a desestatização da empresa em pesquisa contratada pelo governo -o contrato previa uma remuneração cinco vezes maior para a companhia caso o veredito fosse pela privatização.
Segundo Resende, os estudos virão a público somente em janeiro –portanto depois da possível aprovação da licença para privatização pelos deputados.
“É o que a gente está calculando, essa redução é o objeto do estudo agora. O que a gente já colocou no PL, desde a primeira nota que a gente fez, foi essa diretriz, redução tarifária com foco no vulnerável”, disse.
Segundo ela, “a lei tem de ter as diretrizes principais”. “Muitas vezes, e isso acontece em várias leis, elas acabam entrando em matérias que são de estatuto de contrato, e muitas vezes isso não dá certo no futuro, não é o correto também no aspecto seja de [ação] legislativa, seja da própria eficiência das normas”, disse Resende.
“No início do ano que vem a gente acaba fase 1 [do estudo do IFC], já mostra todos esses dados. E não precisa ter isso para você já fixar o mecanismo, já fixar as diretrizes”, afirmou.
Para o especialista em finanças da FGV Ricardo Teixeira, como o projeto em discussão na Alesp se trata de uma autorização para que o governo prossiga com a venda de ações da companhia, não há necessidade estrita de detalhar valores e tarifa no texto da lei.
“Depois de aprovado é que começa a montagem”, diz. “Se o número [estimativa de capitalização] sai muito alto antes de você ter um estudo mais aprofundado, isso inibe empresas e cria no mercado uma sensação de que ninguém vai comprar. Se sai muito baixo, há questionamentos de que não houve piso mínimo”, afirma ele, justificando a necessidade de um estudo detalhado.
“O valor poderia ser apresentado agora, mas o mais importante é que esteja depois no edital [da privatização]”, diz.
Já para o professor de gestão pública da mesma instituição Marco Antonio Teixeira, os deputados vão dar um cheque em branco ao aprovar a lei sem os detalhes. “O governo está apresentando um projeto que não está completo”, diz.
“O preço da tarifa é um elemento crucial, e isso você não consegue saber rigorosamente porque ela está associada a fatores conjunturais, clima, investimento, que você não pode prometer agora”, afirma.
THIAGO AMÂNCIO / Folhapress