SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O leilão da chamada “Rodovia da Morte”, trecho da BR-381 entre Belo Horizonte e Governador Valadares (MG), não recebeu propostas, em mais um sinal do baixo apetite da iniciativa privada em disputar ativos de infraestrutura neste primeiro ano do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A concessão estava marcada para acontecer nesta sexta-feira (24), mas as empresas proponentes tinham até as 12h desta terça (21) para apresentar suas propostas na B3, em São Paulo. Com a falta de interessados, o leilão deve ser adiado para 2024.
O governo previa mais de R$ 10 bilhões em investimentos com a concessão do trecho, cujo contrato seria de 30 anos. O vencedor seria quem oferecesse o maior desconto na tarifa de pedágio.
Procurado, o Ministério dos Transportes disse que continua determinado em encontrar uma solução para modernizar e adequar a capacidade da BR-381, destacando que esta é a terceira tentativa de leiloar o trecho. As anteriores ocorreram em 2021 e 2022.
“Vamos retomar o diálogo com o Tribunal de Contas da União (TCU) a fim de criar as condições necessárias para viabilizar o investimento privado. O Ministério dos Transportes trabalha para reposicionar o projeto e levá-lo a leilão no primeiro semestre de 2024”, afirmou, em nota.
Considerada uma das rodovias mais perigosas do país, com alto índice de acidentes fatais e congestionamentos, o trecho da BR-381 que liga Belo Horizonte a Governador Valadares ganhou o apelido macabro de “Rodovia da Morte”.
A parte mais crítica fica entre a capital e o município de João Monlevade, um percurso sinuoso de 116 quilômetros com subidas e descidas acentuadas.
A solução para a rodovia passa principalmente pela duplicação dos trechos, projeto que já circulou pelas mãos de diversos governantes, sem sucesso.
Em 2014, durante a gestão da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), foram assinadas as primeiras ordens de serviço para a duplicação.
Na época, o governo dividiu a estrada em 11 lotes para submetê-los à concorrência de empreiteiras. Dois lotes nem sequer tiveram interessados -considerados os mais complicados por envolver a desapropriação de áreas ocupadas por moradias.
Os desafios se estendem por outros trechos da rodovia, cuja obra também envolve queda de barreiras (riscos geológicos), aumentando a complexidade e os custos do projeto.
Após sucessivos fracassos, o governo federal decidiu passar para a iniciativa privada a missão de fazer a obra que não conseguiu concluir. O edital de concessão foi aprovado pelo TCU em junho deste ano.
A EcoRodovias foi uma das empresas que estudou o projeto, mas decidiu não apresentar proposta no leilão.
“A empresa reafirma, no entanto, sua confiança nas instituições e poderes concedentes e sua disposição em participar de novos projetos que atendam seus objetivos estratégicos”, disse, em nota.
A ausência de interessados no trecho da BR-381 reforça a frustração que o governo Lula 3 vem passando em concessões de infraestrutura. Como mostrou reportagem da Folha, os leilões de estradas, portos e aeroportos deste ano foram marcados pelo baixo número de concorrentes. A maioria contou com apenas dois proponentes.
Juros ainda altos e o fantasma das concessões problemáticas de outras gestões petistas ajudam a explicar o atual desinteresse da iniciativa privada.
Os números, considerados fracos diante do histórico brasileiro, vêm num momento em que o governo movimenta suas fichas para fazer da infraestrutura uma de suas vitrines.
O Ministério dos Transportes, por exemplo, trata o tema como prioridade, e o ministro Renan Filho já disse que o governo espera fazer 35 leilões nos próximos quatro anos.
Recentemente, o Ministério dos Transportes foi questionado sobre o baixo número de interessados e disse que os leilões de estradas realizados em 2023 ainda não incorporavam todas as melhorias da nova política de concessões construída após ouvir o setor privado.
“No próximo leilão, da BR-381/MG, já teremos mais mudanças incorporadas e acreditamos que isso vai resultar no aumento de competidores”, disse à época, em nota.
O desejo não se concretizou.
HISTÓRICO DA BR-381
– 1952 – O trecho de rodovia entre Belo Horizonte e João Monlevade foi pavimentado
– 1959 – A ligação entre Belo Horizonte e Pouso Alegre ocorreu em pista simples durante o governo Juscelino Kubitschek
– 1990 – A duplicação do trecho norte da BR-381 começou com a lei nº 9.277/96, que passou para os estados os bens da União
– 1998 – O governador de Minas Gerais, Eduardo Azeredo, firmou, com o então presidente Fernando Henrique Cardoso, um acordo que previa que o estado executaria a duplicação entre Belo Horizonte e João Monlevade e uma terceira faixa até Ipatinga. Os recursos viriam da recém-realizada privatização da Vale do Rio Doce
– 1999 – Durante a gestão do ex-presidente Itamar Franco no estado, a rodovia acabou sendo devolvida à União
– 2009 – O presidente Lula, em seu segundo mandato, incluiu a duplicação do trecho na fase dois do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento)
– 2014 – Primeira ordem de serviço para a duplicação, já no governo Dilma Rousseff. Desse modo, a rodovia foi fracionada em 11 lotes, dos quais sete foram licitados. Fonte: CNT
THIAGO BETHÔNICO / Folhapress