BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O ministro Fernando Haddad (Fazenda) negocia mudanças no projeto que trata da taxação federal sobre os benefícios fiscais do ICMS, concedidos pelos estados, como forma de ampliar as chances de aprovação da medida pelo Congresso Nacional.
A iniciativa é hoje a principal aposta em tramitação para obter arrecadação extra para 2024, com potencial estimado em R$ 35 bilhões. O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), afirmou a líderes partidários em reunião nesta terça-feira (21) que Haddad deve apresentar uma nova versão do texto.
Segundo relatos de parlamentares presentes no encontro, Lira disse que conversou ao telefone com Haddad na segunda (20), quando o ministro sinalizou a possibilidade de um novo desenho da proposta, que vem enfrentando resistências dos congressistas.
Interlocutores da equipe econômica afirmam que uma das possibilidades em discussão é flexibilizar as situações em que as empresas terão direito a um crédito fiscal para abater o tributo a ser pago -mantendo, na prática, o efeito de isenção que se aplica hoje.
Hoje, a proposta do governo é conceder o crédito quando o incentivo do ICMS é direcionado a investimentos. A regra contábil, porém, só considera nessa categoria os gastos com construções, compra de máquinas e equipamentos e outros investimentos sujeitos a depreciação ou amortização.
Nos bastidores, o governo está disposto a ampliar a concessão dos créditos para contemplar contratos “mais modernos”, como um arrendamento ou aluguel de imóvel construído sob medida por empresa ou fundo imobiliário.
Tecnicamente, esse gasto não é um investimento, mas a legislação poderia permitir a equiparação, uma vez que haveria ampliação da capacidade de produção.
O que segue sendo inegociável, segundo esses interlocutores, é a exigência de vinculação entre o benefício concedido e a atividade produtiva ou algum tipo de investimento.
Subvenções do ICMS com contrapartidas genéricas, exigindo esforços para gerar empregos ou investimentos, mas sem quantificar ou qualificar as metas envolvidas, continuariam sendo tributadas, com cobrança de IRPJ e CSLL -como previsto na proposta original.
A taxação dos incentivos fiscais do ICMS busca regulamentar uma decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça) sobre o tema.
Empresas contempladas por essas subvenções experimentam um aumento do seu lucro, que é sujeito à incidência de IRPJ e CSLL. Quando os benefícios são ligados a investimentos com contrapartidas, a legislação permite abater os valores da base de cálculo dos tributos federais, uma forma de garantir que o incentivo seja integralmente apropriado pela empresa.
No entanto, brechas na lei vinham sendo usadas pelas companhias para descontar também as subvenções ligadas ao custeio, que apenas ampliam a lucratividade dos sócios sem necessariamente trazer ganhos econômicos. O Ministério da Fazenda entende que, nesses casos, os estados estão dando incentivos com o chapéu alheio, por isso a necessidade de taxar as subvenções.
Os ajustes negociados pelo governo representam uma forma de ampliar as situações em que os benefícios continuarão blindados da tributação de IRPJ e CSLL.
Ainda assim, diferentes membros do Executivo afirmam que a redução na arrecadação esperada seria pequena, pois permaneceria a exigência de contrapartidas específicas -um pré-requisito ausente em muitos dos incentivos vigentes no âmbito do ICMS.
Havia uma expectativa de que Haddad participasse da reunião desta terça (21) justamente para discutir os ajustes, mas isso não ocorreu. Deputados da base governista afirmam que um encontro entre o ministro da Fazenda e o presidente da Câmara pode ocorrer nos próximos dias.
No último dia 8, Haddad se reuniu com líderes partidários para tratar do tema, quando foram levantados questionamentos pelos deputados, incluindo a visão do governo sobre a classificação de custeio e investimento.
Os líderes também cobraram do governo uma posição sobre os efeitos da mudança: se valerá daqui para frente ou se terá efeito retroativo sobre o estoque do que deixou de ser recolhido pelas empresas nos últimos anos.
A avaliação no Congresso é que só depois de ter o novo texto em mãos é que os deputados tratarão do formato de tramitação do tema, se por MP (medida provisória) ou projeto de lei com urgência constitucional.
A MP tem potencial para tramitar de forma mais célere e, por isso, tem a preferência da equipe de Haddad. O projeto de lei também atenderia ao governo, mas sob risco de render uma arrecadação menor em 2024. Enquanto a MP tem vigência imediata, efeito que se mantém quando ela é convertida em lei, a instituição da cobrança por projeto de lei precisa respeitar a noventena, entrando em vigor 90 dias após a sanção.
Parlamentares governistas afirmam que a prioridade do Executivo nesta semana é viabilizar a instalarção de uma comissão mista para analisar o texto via MP.
A cerca de um mês do recesso parlamentar, o governo tem pressa para aprovar matérias que aumentam a arrecadação federal, de olho na meta de zerar o déficit nas contas públicas em 2024.
A Reforma Tributária também foi um tema discutido na reunião desta terça. O relator do texto na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), pediu prazo para analisar as mudanças feitas pelo Senado Federal.
Ficou estabelecido que uma reunião com o colégio de líderes vai ocorrer na próxima segunda (27) para discutir o conteúdo e o rito de tramitação na Casa.
Na Câmara, a tramitação da PEC (proposta de emenda à Constituição) pode seguir ao menos dois caminhos. De acordo com técnicos da Casa, o rito tradicional seria uma nova discussão na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), seguida de debates em comissão especial.
Alternativamente, a proposta pode ter um rito mais célere e seguir direto para o plenário. Nesse caso, seria preciso apensar o texto a outra PEC que trate do mesmo tema e que já estaria pronta para ser discutida em plenário.
Ainda segundo relatos, os líderes comentaram as mudanças feitas por senadores, como a ampliação de exceções benéficas a setores e atividades.
O presidente da Câmara teria pedido celeridade na análise do texto na Casa, indicando que, num segundo momento, ele terá que negociar com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), as eventuais mudanças que forem realizadas por deputados. Isso porque há uma vontade de que o texto seja promulgado ainda neste ano.
VICTORIA AZEVEDO E IDIANA TOMAZELLI / Folhapress