BUENOS AIRES, ARGENTINA (FOLHAPRESS) – Em sua primeira viagem após ser eleito presidente da Argentina, Javier Milei trocou sua habitual jaqueta de couro por um terno e foi à Casa Branca se encontrar com um dos consellheiros de Joe Biden. O ultraliberal foi recebido nesta terça (28) por Jake Sullivan, assessor de Segurança Nacional da Casa Branca.
Sullivan exerce um cargo semelhante ao de Celso Amorim no Brasil, que é conselheiro para assuntos internacionais de Lula (PT). Ele tem estado em evidência por fazer parte da equipe que está tratando da guerra Israel-Hamas. Participou da reunião ainda o colombiano Juan González, assessor especial de Washington para América Latina.
Desde que ganhou as eleições, Milei deu um giro em seu discurso internacional e passou a sinalizar aproximação com diversos líderes que criticou ou insultou quando era candidato. Em maio, por exemplo, ele disse à CNN, de modo pejorativo, que Biden é um “socialista moderado, mas é socialista”, por colocar o coletivo à frente do individual.
O mesmo ocorreu com o líder chinês, Xi Jinping, e com Lula, a quem o ultraliberal já se referiu como comunista e corrupto, mas agora enviou uma carta convidando-o para a posse em 10 de dezembro. “Desejo que o tempo em comum como presidentes e chefes de governo seja uma etapa de trabalho frutífero e construção de laços”, escreveu no documento.
Milei foi apresentar aos americanos seu plano econômico de corte de gastos junto à sua irmã Karina, o empresário Gerardo Werthein (possível embaixador em Washington), Marc Stanley (embaixador dos EUA em Buenos Aires) e seus principais assessores: Nicolás Posse, nome quase certo para Chefe de Gabinete, e Luis Caputo, principal cotado a ministro da Economia.
Os dois últimos mantiveram reuniões nesta terça com o Tesouro americano e o FMI (Fundo Monetário Internacional). A Argentina contraiu em 2018, na gestão do centro-direitista Mauricio Macri, o maior empréstimo da história do fundo, cujo acordo foi reformulado diversas vezes e totaliza US$ 44 bilhões (R$ 220 bilhões em valores atuais).
Para honrar o pacto e receber as parcelas que faltam, o país precisa bater uma série de metas que são checadas periodicamente, como reduzir os gastos, o déficit fiscal e a inflação. Mas não conseguiu cumprir muitas delas na gestão de Alberto Fernández e Sergio Massa, ministro da Economia e candidato derrotado.
Milei, então, precisará do apoio do órgão para renegociar a dívida –ele defende que suas metas vão além das acordadas. Havia uma expectativa de que ele se encontrasse pessoalmente com a chefe do fundo, a búlgara Kristalina Georgieva, o que não aconteceu. Segundo ele, esta viagem ainda não foi para tratar desse assunto, que deve ficar para depois da posse.
Ele chegou aos EUA nesta segunda-feira (27) por Nova York, quando almoçou com dois democratas de peso: o ex-presidente Bill Clinton (1993-2001) e Christopher Dodd, assessor especial de Biden para as Américas, a quem também apresentou suas propostas.
“Tivemos um excelente almoço com Chris Dodd e Bill Clinton, no qual expressamos nossa visão para a Argentina e as mudanças necessárias. Ambos mostraram-se muito alinhados com nossas ideias”, disse Milei a jornalistas na ocasião.
“Queremos entender quais são as ideias de Milei, para onde ele pretende ir com suas políticas e manter os canais de comunicação abertos”, afirmou também o porta-voz da Casa Branca, John Kirby.
Antes do almoço, ele visitou o túmulo do rabino ucraniano Menachem Mendel Schneerson em um cemitério do bairro do Queens, para agradecer pela vitória. Milei cresceu em família católica, mas tem se aproximado do judaísmo nos últimos anos e prometeu que a próxima visita será a Israel, parecendo seguir a cartilha da nova direita global.
Ele já afirmou que pretende mudar a embaixada da Argentina de Tel Aviv para Jerusalém, como fez Donald Trump, que foi acusado de aumentar a tensão entre israelenses e palestinos. No Brasil, o ex-presidente Jair Bolsonaro também buscou forte aproximação com a comunidade mesmo antes da campanha em 2018.
Tanto no caso dele quanto no de Trump, a estratégia visava também a reforçar laços com base de apoio evangélica, que na Argentina é pequena. O país, porém, tem a maior comunidade de origem judaica da América Latina e uma das maiores do mundo fora de Israel, com 250 mil pessoas.
JÚLIA BARBON / Folhapress