Destruição do cerrado cresce; governo lança plano para zerar desmatamento

Agropecuária é responsável por cerca de 96% do desmatamento no cerrado | Foto: Agência Fapesp/Divulgação

O desmatamento no cerrado brasileiro cresceu 3% de agosto de 2022 a julho de 2023, comparado ao período anterior, segundo o sistema Prodes. No total, a destruição do bioma ficou em 11.011,7 km².

O aumento, no entanto, ocorreu em meio a uma desaceleração no ritmo de desmate com relação aos valores registrados nos últimos anos. Em 2020, 2021 e 2022 o crescimento foi de, respectivamente, 25%, 8% e 25% na comparação com períodos anteriores.

Segundo o secretário-executivo do Ministério do Meio Ambiente, João Paulo Capobianco, esses 3% representam estabilidade, levando em consideração os parâmetros do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisa Espacial). Capobianco afirmou esperar que, daqui para frente, a curva seja revertida para decrescente.

Os dados foram divulgados nesta terça-feira (28), quando o governo federal também lançou o novo PPCerrado (Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento no Cerrado), com a promessa de alcançar a meta do desmatamento zero até 2030, ano-chave para frear o aquecimento do planeta, conforme o Acordo de Paris.

O anúncio acontece às vésperas da COP28, a conferência do clima da ONU (Organização das Nações Unidas), que será realizada em Dubai (Emirados Árabes) a partir desta quinta (30) e contará com a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e da ministra Marina Silva.

Neste terceiro governo do petista, a derrubada de floresta no Brasil vem seguindo tendência de queda na amazônia, enquanto cresce no cerrado. A área desmatada no cerrado neste último ciclo medido pelo Prodes, que agrega o último semestre da gestão de Jair Bolsonaro (PL) e o primeiro de Lula, é a maior desde 2015 (quando foi de 11.129,06 km²).

A ministra Marina Silva afirmou que a divulgação dos dados representa uma mudança de política em relação ao governo Bolsonaro. Ela lembrou que na última COP, que aconteceu no Egito, o governo federal decidiu não divulgar os dados de desmate antes da conferência, mesmo já os tendo prontos, como revelou a Folha de S.Paulo à época.

“Nós fizemos questão […] de colocar o dado antes da viagem, exatamente para mostrar que não é com negacionismo que se resolve o problema, é fazendo diagnóstico e apresentando soluções, como lançando já no primeiro ano [de governo] o PPCerrado, feito em tempo recorde”, afirmou.

Os dados do Prodes evidenciam o contraste entre o desmate da amazônia e do cerrado, que é o segundo maior bioma brasileiro e corresponde a quase um quarto de todo o território nacional (23,3%).

Pelo Código Florestal, no cerrado é possível desmatar até 80% das propriedades privadas (ou até 65% em alguns locais, quando estão em áreas de transição para a floresta amazônica). O limite é de 20% na amazônia.

Na floresta amazônica, pela primeira vez desde 2018, a destruição anual ficou abaixo de 10 mil km² -de agosto de 2022 a julho de 2023, foram perdidos 9.001 km², uma redução de 22,3% na comparação com o período anterior.

Os dados do Deter -sistema do Inpe que divulga alertas de desmatamento com maior periodicidade, mensalmente, mas com menor precisão- também ilustram essa dinâmica. Enquanto a amazônia vem registrando quedas consecutivas, o cerrado já bateu uma série de recordes mensais de desmatamento.

“Os dados de desmatamento do cerrado apontam uma situação muito crítica que se agravou ao longo de 2023. Estamos diante de um cenário que requer atenção a um bioma que é estratégico para nossa segurança hídrica e energética, já que é o berço de 8 das 12 principais bacias hidrográficas do país, mas já observa redução de 15% da vazão de seus rios”, avalia Ana Carolina Crisostomo, especialista em conservação da ONG WWF no Brasil.

Os novos dados evidenciam que 75% do desmatamento no cerrado ocorreram na região conhecida como Matopiba, fronteira agrícola composta por Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia.

“Os governos estaduais, em especial os do Matopiba, precisam se responsabilizar e tomar providências sob o que lhe é de responsabilidade”, diz Yuri Salmona, diretor-executivo do Instituto Cerrados.

PPCERRADO

A nova fase do PPCerrado, segundo o plano oficial, terá como uma de suas metas “coordenar e/ou alinhar o planejamento dos grandes empreendimentos e projetos de infraestrutura e de desenvolvimento na região, com a meta de desmatamento zero até 2030”.

O plano tem previsão de durar até 2027, com participação de pelo menos 12 ministérios, além do Meio Ambiente, e um núcleo para interlocução com estados e municípios.

No documento, são apontadas quatro características específicas do bioma em questão e que dificultam as ações de combate e controle com relação, por exemplo, à floresta amazônica.

A dificuldade de monitoramento do desmatamento, por grande parte deste ser autorizado por órgãos ambientais estaduais, não federais; a menor área dedicada a áreas de preservação ambiental; uma acelerada expansão da atividade agropecuária nos últimos anos, que impulsionou a derrubada de floresta; e os incêndios, muitas vezes causados pela ação humana.

“A elevada participação do desmatamento em terras públicas no bioma indica a vulnerabilidade de determinadas porções do território a processos de uso e ocupação irregular do patrimônio público”, diz o documento, destacando a necessidade do combate à grilagem de terra.

O documento também afirma que pretende usar o novo PAC como forma de incentivar projetos de desenvolvimentos na região que sejam ancorados por estudos de viabilidade ambiental e avaliações ambientais estratégicas.

Esta é a quarta versão do PPCerrado, que foi implementado pela primeira vez em 2010. Segundo o MMA, os dois períodos de aumento no desmatamento dentro do bioma, em 2012 e após 2019, coincidem primeiro com o momento em que o plano foi temporariamente suspenso e, depois, com sua revogação pelo governo de Jair Bolsonaro (PL).

Segundo o Ministério do Meio Ambiente, para o novo plano, cada estado que compõe o bioma se comprometeu a apresentar planos atualizados de combate ao desmatamento.

A estratégia é dividida em uma série de eixos, que compõe um total de 13 objetivos: por exemplo, o de integrar os dados de desmatamento do bioma, que hoje são pulverizados por diversos órgãos estaduais, municipais e a esfera federal.

Também propõe a destinação prioritária de áreas públicas para terras indígenas e quilombolas, além de unidades de conservação, voltadas à agricultura familiar ou para a regularização fundiária.

“O reconhecimento dos territórios de comunidades tradicionais e povos indígenas, além da criação de Unidades de Conservação devem também ser prioritários para proteger os remanescentes de cerrado e para barrar o desmatamento na região”, diz Crisostomo.

Para Yuri Salmona, é também urgente avançar no processo de regularização fundiária. “Não podemos considerar o CAR (Cadastro Ambiental Rural) como instrumento fundiário, precisamos avançar na agenda específica. É fundamental que haja um esforço para a identificação e destinação das terras públicas federais e estaduais, com destinação prioritária para a regularização fundiária dos territórios”, diz.

O plano prevê o incentivo à atividade produtiva sustentável e a implementação de mecanismos de econômicos para preservação da biodiversidade.

JOÃO GABRIEL / Folhapress

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