BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – As explicações públicas do deputado federal André Janones (Avante-MG) sobre a suspeita de esquema de “rachadinha” em seu gabinete contêm algumas contradições e pontas soltas.
Desde que o caso veio à tona, na segunda-feira (27), o deputado, que integrou a linha de frente da campanha de Lula (PT) nas redes sociais em 2022, tem dado algumas entrevistas e se manifestado em suas redes sociais.
Uma das contradições se mostra quando ele diz que ainda não era deputado na reunião em que foi discutida a devolução de parte de salários de assessores para ajudar na recomposição de seu patrimônio pessoal.
Em entrevistas na terça-feira (28), ele disse não se lembrar exatamente o período da reunião, mas que achava que ainda não era deputado –ele tomou posse do mandato em 1º de fevereiro de 2019.
Em um post no X (ex-Twitter), também na terça, Janones afirmou que a divulgação de mais áudios estaria trazendo a “história real” à tona e disse categoricamente que não era deputado.
“A história: eu (quando ainda não era deputado) disse pra algumas pessoas (que ainda não eram meus assessores) que eles ganhariam um salário maior do que os outros para que tivesse condições de arcar com dívidas assumidas por eles durante a eleição de 2016”, escreveu o parlamentar.
A íntegra do áudio da reunião, porém, aponta em sentido diferente: o próprio deputado fala no encontro com cerca de dez assessores que aquele dia haveria sessão no plenário da Câmara e ele ainda estava desguarnecido sobre como proceder, além de reclamar com a equipe que outros deputados já estavam apresentando projetos de lei e ele, não.
“Cês viram aí nas notícias no Facebook, já tem uma porrada de deputado que já apresentou o projeto de lei ontem. Ontem tinha uma fila de cem deputados apresentando projeto de lei. Eu sequer sabia disso. Por que eu não sabia? Porque eu não contratei nenhum especialista em técnica legislativa”, diz o parlamentar, em um contexto em que tentava convencer a sua equipe de Minas Gerais a se mudar ou ir com frequência a Brasília.
O deputado só pode apresentar projeto de lei se já tiver de posse de seu mandato.
“Hoje tem plenário à tarde. Eu não sei o que que eu vou fazer lá, eu vou chegar lá eu vou ficar perdido. Eu não sei como que é, o que eu vou fazer, que hora que eu falo, que assunto que vai ser. Por quê? Porque eu não contratei ninguém de plenário”, acrescentou Janones na reunião.
O parlamentar também tem dito que seu patrimônio foi dilapidado por dívidas que contraiu na disputa perdida à Prefeitura de Ituiutaba (MG) em 2016.
Ele fala em perda de carro, casa, investimentos e outros bens que totalizariam quase R$ 675 mil, valor ao qual se referiu na reunião de 2019.
Em entrevista ao UOL News, o parlamentar disse que os assessores que contribuiriam com parte do salário para a recomposição do seu patrimônio assumiram conjuntamente com ele as dívidas da campanha de 2016 e tiveram seus nomes declarados na prestação de contas entregue à Justiça Eleitoral.
A prestação de contas oficial de Janones, porém, traz informações diferentes.
Lá, a dívida de campanha declarada é de R$ 172 mil, bem menor do que os R$ 675 mil citados na reunião de 2019 com os assessores.
Além disso, apenas uma assessora de gabinete aparece na sua lista de doadores de campanha, Leandra Guedes Ferreira, hoje prefeita de Ituiutaba –uma doação de R$ 3.400.
Janones também vem dizendo que um dos assessores que agora faz acusações contra ele, Cefas Luiz Paulino, pediu por meio de auxiliares atuais um carro zero quilômetro para não divulgar o áudio de 2019.
O deputado diz que recebeu essa informação em setembro de 2022, no dia em que Cefas foi exonerado do seu gabinete.
Questionada, a assessoria do parlamentar afirmou que ele não denunciou à época a suposta tentativa de extorsão porque, após consulta a um delegado, avaliou-se que a tentativa de extorsão ainda carecia de mais provas para ser informada às autoridades.
Cefas nega ter feito esse pedido.
Sobre as inconsistências entre o que o deputado disse e diz sobre os dados de sua campanha de 2016 e as informações oficiais prestadas à Justiça Eleitoral, a assessoria afirmou que as contas da campanha daquele ano não foram fechadas e resultaram em processos pendentes, com perda de bens em penhora.
Sobre a afirmação de Janones de que ele ainda não era deputado no dia em que fez a reunião com sua equipe, a assessoria ressaltou que, na entrevista ao UOL, ele disse não se lembrar exatamente da data e que ele não tem como precisar.
“A conversa não era com assessores, era do André com o grupo político dele, ele não tem como saber a data porque ele conversava com essas pessoas rotineiramente, desde 2015.”
No áudio de 2019, Janones diz que assessores iriam receber um salário maior para que pudessem contribuir com a recomposição de seu patrimônio pessoal. Ele diz agora, porém, que essa proposta nunca foi levada a cabo.
Dois ex-assessores do parlamentar o contradizem e afirmam que o esquema foi colocado em prática, sendo que um deles fala que a devolução da parte do salário era sempre feita em espécie.
Há desde 2022 uma apuração sobre a suspeita no STF (Supremo Tribunal Federal), mas o caso corre sob sigilo.
RANIER BRAGON / Folhapress