Problema fiscal é sério, mas mercado parece ignorar, diz economista-chefe do Itaú

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O economista-chefe do banco Itaú e ex-diretor do Banco Central, Mário Mesquita, afirmou nesta quarta-feira (29) que o mercado financeiro parece ignorar o noticiário sobre as contas públicas, mas que esse é um problema que ainda persiste, apesar do empenho da equipe do ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), para zerar o déficit fiscal no próximo ano.

“A gente tem um problema fiscal, de fato, bastante sério, até agora o mercado não tem reagido, ou parece que perdeu a sensibilidade, mas ele não deixa de ter suas consequências”, disse durante transmissão organizada pela Kinea, gestora vinculada ao Itaú que tem sob gestão cerca de R$ 120 bilhões em ativos.

Segundo Mesquita, parte da justificativa para o Itaú apostar em uma taxa terminal para os juros básicos de 9,5% no atual ciclo de corte da Selic, e não menos que isso, é justamente o reconhecimento da manutenção de riscos fiscais no país.

Para o economista, o mercado reagiu melhor do que o esperado por ele à proposta do novo arcabouço fiscal, dadas as críticas de analistas fiscalistas ao texto enviado pelo governo ao Congresso.

Ainda assim, Mesquita ponderou que a equipe econômica mandou mensagens positivas no início do ano ao elaborar rapidamente um arcabouço fiscal que substituísse o já fracassado teto de gastos, e também ao manter a meta da inflação em 3%, em vez de subir essa meta como propôs algumas vezes o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Mas Mesquita ainda percebe discursos conflitantes pró-despesas por parte de integrantes do governo. “Vejo tensão entre o arcabouço [fiscal], que implica algum controle de gastos, e a preferência de parte do governo por mais gastos”, disse durante a transmissão, acompanhada presencialmente pela reportagem.

O economista vê como preocupante discussões sobre mudança da meta fiscal para o ano que vem, além das manobras para gastar mais sem contabilizar algumas despesas.

Sobre a meta fiscal, Mesquita acredita que, mesmo com o mercado já ciente das baixas possibilidades de zerar o déficit no próximo ano, a manutenção dessa meta serve como um importante sinal para o Congresso de que as medidas de aumento de receita devem ser priorizadas e aprovadas.

Ele diz concordar que as medidas de incremento de arrecadação são relevantes, mas afirmou que elas são limitadas, indicando que o governo também deveria organizar as contas públicas por meio do corte de gastos.

CRESCIMENTO ECONÔMICO

Mesquita disse que o Itaú espera um crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro deste ano entre 2,5% e 3%, muito acima das projeções divulgadas no início do ano.

Segundo o economista, desde 2020 os analistas têm tido uma sequência de surpresas entre as projeções para o PIB e a realidade do crescimento econômico do país, o que sugere que os modelos não estão capturando adequadamente o que acontece na economia.

Mesquita trouxe algumas hipóteses para essas surpresas: “Talvez os modelos não estejam capturando adequadamente todo o impacto do agro[negócio]. Talvez os modelos não estejam capturando adequadamente também o impacto das transferências fiscais, das transferências sociais”, ponderou.

“E, eu acho que também não dá para descartar a hipótese de que a tendência de crescimento da economia brasileira seja um pouco maior do que a gente tinha antes das reformas da agenda de 2016. Acho que é um pouco de cada um desses fatores”, completou.

Por outro lado, Mesquita disse que o comportamento da inflação neste ano tem estado bem alinhado às expectativas do mercado, apesar das surpresas geopolíticas no exterior, como a guerra no Oriente Médio que despontou recentemente.

STÉFANIE RIGAMONTI / Folhapress

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