MACEIÓ, AL (FOLHAPRESS) – A região que fica em torno da mina da Braskem que está afundando em Maceió (AL) se transformou em um bairro fantasma. Comércios, escolas e outros serviços foram embora do local, e os poucos moradores que restam relatam falta de água e uma invasão de ratos.
A reportagem visitou nesta segunda-feira (4) imóveis que ficam a 500 metros da mina, no bairro de Bom Parto. Segundo quem vive nestes locais, o problema começou há cinco anos, e vem se intensificando desde então.
As casas desocupadas, sem teto, portas ou janelas agora têm como moradores galinhas, gatos e outros animais, além do cenário de destruição. Quando a reportagem esteve na região, três crianças brincavam na rua, em meio ao barro, lixo e poças de água.
“Ninguém pode sair de casa. Temos medo de deixar as nossas coisas, nossas crianças, e acontecer alguma coisa. Falta água sempre. A que chega, tem gosto de lama. Estamos vivendo com ratos, os bichos mesmo. Mercadinho? Não tem. Farmácia? Não tem. Escola? Não tem. Posto de saúde? Não funciona mais”, diz Maria Betânia Galdino da Silva, 54, moradora do bairro.
Ela está sem trabalhar desde 2018. “Hoje, vivo as custas dos meus filhos. Sou viúva. Então, como na casa de um filho, de outro, e assim vou levando a vida. Entre as pessoas da minha família, com netos e bisnetos, são quase 30 aqui nessa região”, complementa ela.
Os primeiros relatos sobre os danos no solo em Mutange (onde fica a mina da Braskem) surgiram em meio de tremores de terra no dia 3 de março de 2018. Na ocasião, o abalo fez ceder trechos de asfalto e causou rachaduras no piso e paredes de imóveis, atingindo cerca de 14,5 mil casas, apartamentos e estabelecimentos comerciais.
Todos os moradores de Mutange já foram retirados. Bom Parto é o segundo bairro mais afetado, mas ainda restam pessoas vivendo na área. Outras regiões também foram atingidas, incluindo Pinheiro, Bebedouro e Farol.
Em 2019, o Serviço Geológico do Brasil, órgão ligado ao Ministério das Minas e Energia, concluiu que as atividades de mineração da Braskem em uma área de falha geológica causaram o problema.
Na época, a mineradora tinha em área urbana 35 poços de extração de sal-gema, material usado para produzir PVC e soda cáustica. Os poços estavam pressurizados e vedados, porém a instabilidade das crateras causou danos ao solo, que foram visíveis na superfície.
A exploração do minério começou em 1979 e se manteve até maio de 2019, quando foi suspensa pela Braskem um dia após a divulgação do laudo pelo Serviço Geológico.
Na última quarta (29), a Defesa Civil de Maceió emitiu um alerta que a situação tinha piorado, com risco iminente de colapso da mina. Com isso, a população que mora próximo à área atingida foi orientada a deixar o local e procurar abrigo, e a prefeitura decretou estado de emergência por 180 dias.
O prefeito de Maceió, João Henrique Caldas (PL), afirmou nesta segunda haver diminuição na velocidade do afundamento na região da mina.
“Nós chegamos a 5 centímetros de afundamento [por hora], agora estamos em 0,25. Ou seja, é o menor patamar desde o dia 28 [quando foi iniciado monitoramento após novos abalos sísmicos]”, disse Caldas durante pronunciamento em Brasília, onde se reúne com ministros e políticos. No sábado, o ritmo já havia caído para 0,7 cm/h.
Para a Defesa Civil de Maceió, apesar da diminuição, a área segue em risco iminente de colapso. A Defesa Civil de Alagoas já avalia haver estabilidade. Ao todo, o solo da mina afundou 1,69 m desde o início do monitoramento até este domingo (3).
A situação deixou os moradores da região em uma situação de incerteza, sem saber o que fazer.
“Queriam [a Defesa Civil de Maceió] que a gente saísse e deixasse tudo, indo para colégios. Vinham com ônibus e carroças para levar os animais. Disseram que um lado do corredor, o mais perto da lagoa, estava em perigo e o outro não. Era a noite e ninguém estava esperando”, Weverton Jovino Cabral, 22.
Numa vila de pescadores construída à beira da lagoa Mundaú, onde fica a mina, já não é possível continuar. Os antigos moradores se juntam para tirar os itens que sobraram, uma forma de ainda ter um lucro, já que agora precisam pagar aluguel. Eles fazem o trabalho de bermuda e sandália, sem qualquer equipamento de segurança.
“Eu trabalho vendendo milho. Quando morava aqui, não pagava aluguel, guardava o carrinho em casa mesmo. Hoje, preciso pagar aluguel para viver com a minha família, pago o aluguel para deixar o carrinho e ainda pago o transporte para me deslocar até lá. Esse material que a gente recolhe é só para tentar abater um pouco dos gastos que estamos tendo”, conta Willian Alves de Carvalho, 25, que vende milho na praia de Pajuçara, um dos principais pontos turísticos de Maceió.
Também nesta segunda, o ministro do Turismo, Celso Sabino, afirmou que o afundamento da mina não afetou nenhum ponto turístico da cidade, e que os turistas devem manter suas programações.
“Não há nenhum aparelho turístico na cidade que está sendo influenciado pelos afundamentos. A avenida Litorânea, as praias da cidade, o aeroporto da cidade, os hotéis que ficam ali nos principais atrativos turísticos da cidade de Maceió, nenhum deles tem sofrido qualquer consequência dos afundamentos”, disse.
“Sem dúvida nenhuma é um dos lugares mais bonitos do Brasil a ser conhecido, então mantenha a sua viagem. Se você está pensando ainda em ir para Maceió, mantenha os seus planos, vá conhecer e fazer turismo no Brasil, especialmente em Maceió.”
O diretor-presidente da Braskem, Roberto Bischoff, disse nesta segunda que “situações políticas” distorcem informações sobre o desastre.
“Nós estamos absolutamente comprometidos com um trabalho de mais de quatro anos e de fazer esse processo sem colocar em risco as pessoas”, disse Bischoff durante Encontro Anual da Indústria Química, promovido pela Abiquim (Associação Brasileira da Indústria Química).
“Infelizmente, [esse tema] entra em alguma situação política que a gente acaba tendo informações distorcidas, redes sociais”, completou o executivo da Braskem, que decidiu comentar o assunto durante o evento sem ter sido questionado.
Bischoff não especificou, no entanto, quais seriam as situações políticas envolvidas no caso.
JOSUÉ SEIXAS / Folhapress