Congresso resiste a atender Lula e turbinar PAC com dinheiro de emendas

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Parlamentares têm rejeitado a proposta do presidente Lula (PT) para que o Novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) seja turbinado com dinheiro de emendas. Mesmo dentro da base política do governo, há líderes que veem dificuldade para que o plano do Palácio do Planalto seja acatado pela maioria dos congressistas.

Os deputados e senadores têm direito a colocar verba pública em projetos e obras. Com isso, acabam irrigando seus redutos eleitorais e conseguem ampliar o próprio capital político. Esse mecanismo de uso de dinheiro do Orçamento pelos parlamentares é conhecido como emenda.

Lula lançou uma ofensiva, revelada pela Folha, para tentar convencer os congressistas a aplicar emendas no PAC, sua principal vitrine na área de infraestrutura.

No entanto, os incentivos foram considerados pouco atrativos, de acordo com integrantes de partidos como PP, Republicanos, União Brasil, PSD, PDT, Solidariedade e Podemos.

Há diferentes avaliações nos bastidores. Uma ala diz que, se aceitar a oferta do governo, o ganho do parlamentar por meio da emenda será diluído, pois ministros de Lula também vão colher os frutos políticos.

E citam que integrantes do primeiro escalão do governo continuam lançando obras pelo país —inclusive em Alagoas, estado do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP)— sem que deputados sejam convidados para os eventos.

Parlamentares também dizem que o direcionamento da emenda para o PAC faz com que as diretrizes fiquem a cargo do governo, não do deputado —reduzindo, portanto, sua influência no projeto. Nas palavras de um cardeal da Câmara, esse movimento retira a digital do parlamentar sobre a emenda, e coloca a marca do governo.

Líderes partidários citam que 2024 é ano de eleição municipal. Portanto, a estratégia será usar o dinheiro das emendas em projetos e ações de impacto mais imediato nas disputas locais e que atendam pleitos de candidatos aliados.

Alguns membros do Congresso afirmam ainda que os projetos que fazem parte do PAC geralmente não estão nas preferências dos parlamentares, principalmente se a obra de infraestrutura for de médio ou grande porte.

Essa é a leitura de membros do PP e Republicanos, por exemplo. Em setembro, cada uma dessas siglas ganhou um ministério de Lula em troca de votos no Congresso.

Mesmo aliados mais antigos do governo sugerem que a proposta do petista não deve ganhar tração.

“Não há tempo suficiente para os deputados analisarem as obras que estão na lista do PAC”, disse o presidente em exercício do PDT, André Figueiredo (CE). Ele assumiu o cargo quando Carlos Lupi foi para o Ministério da Previdência, em janeiro.

Há também uma certa desconfiança dos parlamentares com a proposta do governo. Líderes do Congresso afirmam reservadamente que o Palácio do Planalto tem feito uma série de promessas ao longo do ano que, na avaliação deles, não foram cumpridas. Dessa forma, não haveria garantia de que agora isso pudesse ser diferente. Eles também reclamam de uma demora do Executivo em liberar as emendas parlamentares.

Além disso, boa parte do Congresso, especialmente na Câmara, conta com o apoio de prefeitos para seus planos eleitorais. Esse grupo se autodeclara municipalista e, ao longo dos mandatos, busca atender aos pedidos de aliados nos estados.

Assim, é comum que parlamentares prefiram dividir o dinheiro das emendas e distribuir a verba para mais cidades.

Essa estratégia tem se ampliado desde que, no governo de Jair Bolsonaro (PL), foi criada a possibilidade de transferência especial, quando a verba vai direto para os cofres das prefeituras, sem a necessidade de que haja um projeto pré-aprovado.

Ou seja, o prefeito tem o poder de decidir como gastar o dinheiro. Esse mecanismo tem sido chamado também de “cheque em branco”, pois são recursos sem destinação específica, o que dificulta o acompanhamento do gasto público.

Pelo método tradicional, o deputado ou senador só consegue uma emenda depois que a prefeitura apresenta um plano para o uso do dinheiro e, na maioria dos casos, isso tem que ser analisado por órgãos federais, como a Caixa Econômica.

Especialmente em ano eleitoral, o Congresso busca por emendas que sejam liberadas de forma mais célere. Em junho de 2024 se inicia um período em que há limitações para esses repasses justamente por causa da eleição.

A leitura de líderes do centrão e de aliados de Lula é que as emendas para o PAC ainda precisarão de um tempo de maturação. Nesse contexto, alguns parlamentares citam o receio de que a ministra Marina Silva (Meio Ambiente) dificulte o avanço de projetos do PAC.

“As obras vão ficar empacadas. E no ano que vem tem eleição municipal. Os deputados estão olhando pequenas ações em seus municípios, e não obras estruturantes”, disse o deputado Evair de Melo (PP-ES), que integra a oposição ao Planalto na Câmara.

Nas últimas semanas, membros do governo têm feito reuniões com parlamentares para apresentar a proposta de Lula. No Congresso, a medida tem sido chamada de PAC Emendas.

As estratégias incluem a garantia de que o recurso das emendas não será contingenciado e mesmo contrapartidas federais, do tipo “pague 2, leve 3” —o Executivo, por exemplo, promete financiar com recursos do Ministério da Saúde uma policlínica adicional a cada duas unidades selecionadas que recebam emendas de bancada (que são destinadas em conjunto pelos parlamentares de determinado estado).

Líder do MDB na Câmara, Isnaldo Bulhões (AL) é um dos poucos deputados que saiu em defesa da oferta de Lula.

“Eu vejo como uma ideia simpática porque PAC não tem só obras gigantes. Tem clínicas de saúde, unidades básicas de saúde. O volume de emendas no PAC esse ano não será muito grande por dúvidas que parlamentares têm. Mas se tiver um bom desempenho de execução, no outro ano pode aumentar”, disse.

Segundo a Casa Civil, responsável pelo PAC, a ofensiva de buscar emendas para obras do programa não partiu unilateralmente do governo federal. Segundo a pasta, surgiu após muitos parlamentares terem manifestado que gostariam de contribuir com os recursos.

Em agosto deste ano, o governo federal lançou o Novo PAC, com previsão de R$ 1,4 trilhão em investimentos até dezembro de 2026. Do total desse valor, cerca de R$ 370 bilhões terão como fonte os recursos do Orçamento Geral da União. É justamente essa fatia que o governo pretende fortalecer ou dividir a conta com o Congresso Nacional.

THIAGO RESENDE E VICTORIA AZEVEDO / Folhapress

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