Casal alimenta gatos abandonados em bairro afetado por mina da Braskem em Maceió

MACEIÓ, AL (FOLHAPRESS) – Para além dos 36 gatos que cuidam e amam em casa, a advogada Sandra de Cássia Catão, 50, e o músico Walfrido José Barbosa Chaves, 55, entregam o mesmo carinho e afago a outros 70 que moram nas ruas do bairro de Bebedouro, um dos cinco afetados pela mineração da Braskem em Maceió (AL).

Todos os animais têm nome característico, relativos a adjetivos ou personalidades, como Elvis Presley e Fábio Assunção. Também são chamados de “meu filho”, “meu amor”, “meu bebê”. São três anos e dois meses numa rotina diária de alimentação e cuidados.

“A gente passou a alimentar quando as pessoas começaram a sair, porque eu era moradora do bairro. Comecei a alimentar esses gatos no dia 21 de outubro de 2020. As pessoas foram indo embora, e mais animais eram abandonados”, lembra a advogada.

Sandra e Walfrido decidiram alugar uma casa em vez de se mudar para o imóvel que possuem só para continuar perto da rota em que alimentam os bichos. São 15 ruas, cada uma com uma colônia.

A reportagem da Folha visitou a residência do casal e conheceu os animais, em apresentação de Sandra. Depois, acompanhou Walfrido pelas ruas em que distribui ração e água. Os gatos seguem o carro e a voz do homem. Para proteger os bichos, diz, ele abriu buracos nas casas para que se escondam e tenham rotas de fuga.

Desses buracos, as cabecinhas tímidas se mostram a cada chamado. E voltam a se esconder a cada barulho estranho que não seja feito por Walfrido, como a abertura de uma porta ou o clique da câmera.

Com as mudanças no trânsito de Maceió devido ao risco de colapso da mina 18, localizada no bairro do Mutange, os gatos voltaram a conviver com veículos e o risco de atropelamento parece constante. Os animais são desconfiados, mas encontram alento na voz de Walfrido, que os beija e acaricia. Ele também os aconselha para que comam e diz que volta no dia seguinte.

São cerca de 10 kg de ração distribuídos diariamente, além da ração espalhada em diversos potes pela casa. Sandra conta que gastou mais de R$ 3.000 para colocar tela em toda a residência, necessária para impedir que os gatos saiam. Os que são acolhidos em casa, diz ela, são os que precisam de maior cuidado, como filhotes ou que tenham alguma doença que exija cuidado veterinário.

“É o tipo de coisa que às vezes eu não posso esperar que entre dinheiro de doação. Às vezes tem. Às vezes alguém ajuda. Às vezes não. Então, eu vou e custeio. É complicado para mim, porque às vezes nem eu tenho. Mas a prioridade são eles. Então a gente dá um jeito, parcela no cartão e vai vendo como faz para ir pagando.”

Walfrido conta que perdeu 22 kg nesse período, porque a rotina mudou. Diz se preocupar muito com os gatos, com a saúde deles, com os que não encontra nas ruas mais. Conta que dorme pouco, mas pelo menos dorme com eles. São parte da família, ele diz, junto ao cachorro Apolo.

“Desde que tudo isso começou, vivo esses animais diariamente, sem falhar. É sempre nesse horário, já no meio da tarde, e eles ficam me esperando. Só confiam em mim, em mais ninguém. Sei em quais ruas cada um fica, as casas em que gostam de se esconder, se estão doentes. A gente sabe de tudo. É a mesma coisa de ter um filho, para ser sincero”, diz.

O trabalho deve continuar, afirma Sandra. Agora, eles querem se regularizar como ONG, para continuar acolhendo os animais.

Nesta sexta-feira (8), o afundamento de solo da mina 18 atingiu 2,09 metros. O deslocamento vertical está em 0,21 cm/h, de acordo com a Defesa Civil de Maceió. Na quinta-feira (7), foi anunciado que a lagoa Mundaú estava avançando sobre a área da mina.

Maceió está em alerta desde o dia 29 de novembro, quando o órgão municipal divulgou o risco de colapso na região do Mutange. Desde então, novas residências entraram na área de risco, e a recomendação é que ninguém transite nos trechos interditados.

O trabalho de Sandra e Walfrido pode ser acompanhado pelo Instagram, no perfil @sospetbebedouro. Há também a página @sospetpinheiro, dedicada aos animais abandonados no Pinheiro, outro bairro afetado pelo desastre ambiental.

JOSUÉ SEIXAS / Folhapress

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