Quinze dias depois de ser apresentado, o projeto de lei que trata da conservação, proteção e exploração do Pantanal foi aprovado em Mato Grosso do Sul. Entre os objetivos, está o de combater as queimadas que atingem o bioma.
O texto prevê a criação de fundo a ser usado para promover o desenvolvimento sustentável, proíbe plantio de soja, eucalipto e cana-de-açúcar e também veta a instalação de usinas hidrelétricas e carvoarias. A lei entra em vigor em 60 dias, a partir da publicação em Diário Oficial.
Nesta quarta-feira (13) a Lei do Pantanal, como foi denominada a proposta, foi aprovada em segunda votação na Assembleia Legislativa. Na primeira votação, no último dia 7, havia sido recebido aval com cinco emendas que pouco alteraram o texto original e teve o apoio da maioria dos parlamentares.
A única voz dissonante nas duas votações foi do deputado estadual João Henrique Catan (PL), que questiona, por exemplo, a proibição de confinamento de gado no bioma e necessidade de autorização do uso do leito dos rios.
A Lei do Pantanal começou a ser costurada em agosto, quando o governador do Estado, Eduardo Riedel (PSDB) anunciou a criação de grupo para discutir o regramento de preservação e exploração econômica do bioma.
A equipe será composta por representantes do Ministério do Meio Ambiente, Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), e órgãos estaduais ambientais. A discussão ainda recebeu propostas de ambientalistas e produtores rurais.
O projeto de lei do Executivo foi protocolado no dia 28 de novembro na Assembleia Legislativa. Com acordo de lideranças, tramitou de forma célere e sem grandes obstáculos.
O texto aprovado dispõe sobre conservação, proteção, restauração e exploração ecologicamente sustentável da AUR-Pantanal (Área de Uso Restrito da Planície Pantaneira).
Na lista de prioridades, consta a recuperação de áreas degradadas, o incentivo à pesquisa, a educação ambiental formal e a participação de comunidades indígenas e setor privado pantaneiro nas decisões relacionadas às garantias territoriais e integridade social e cultural.
ENTENDA A LEI DO PANTANAL
São proibidos novos projetos de assentamentos, exceto para aqueles destinados ao reassentamento de comunidades tradicionais, para garantir melhoria de infraestrutura e moradia.
Estão vetados também novos empreendimentos de carvoarias, sendo mantidos os que já estão em atividade, até a data de vencimento do licenciamento ambiental concedido.
Ainda são proibidas a instalação de PCHs (Pequenas Centrais Hidreléticas) e o confinamento bovino, com ressalva para concentração emergencial temporária em tempos de cheia ou as já licenciadas. Neste caso, a ampliação do confinamento é permitida, limitada ao dobro da capacidade inicial.
Também foi vetada a implantação de novos cultivos agrícolas, como soja, cana-de-açúcar, eucalipto, exceto os já estabelecidos ou de subsistência. Não é autorizado, ainda, a introdução de espécies exóticas da fauna que não sejam previstas em regulamentos federal e estadual.
O desmatamento será permitido mediante EIA-Rima (estudo de impacto ambiental e relatório de impacto ambiental) para empreendimentos a partir de 500 hectares.
Havendo extrações acima de 50% da área, haverá estudo especial e a autorização vai se limitar a mil hectares. Quem cometer irregularidade, terá de comprovar a reversão do dano ambiental causado.
A queima controlada continua permitida, mediante licenciamento ambiental e deverá seguir Plano Estadual de Manejo Integrado do Fogo, ainda a ser regulamentado. A prática é reconhecida por ser usada por comunidades indígenas, tradicionais e na atividade agropastoril.
Foram vetadas as alterações no regime hidrológico do Pantanal e a construção de diques, drenos, barragens e outras formas de alteração da quantidade e da distribuição da água, exceto aquelas, previamente licenciadas pelo órgão ambiental em decorrência das hipóteses de utilidade pública e de interesse social.
A lei prevê a criação do Fundo Estadual de Desenvolvimento Sustentável do Bioma Pantanal, denominado Fundo Clima Pantanal.
Os recursos virão de dotações orçamentárias, captação de recursos em agências de financiamento e de fundos nacionais e internacionais, doações de pessoas física ou jurídicas e 50% dos valores arrecadados de multas ambientais.
O fundo será gerido por secretaria estadual de Meio Ambiente, sob aprovação de comitê gestor. As normas detalhadas ainda dependem de decreto a ser estabelecido pelo governo
Para o presidente da SOS Pantanal, Alexandre Bossi, a lei “é boa e de vanguarda”, por trazer temas novos, como o incentivo à criação de corredores ecológicos e do Fundo Clima Pantanal, atendendo todos os aspectos de conservação.
Sobre a legislação, acredita que alguns pontos poderiam ter sido incluídos, como prever a remuneração do produtor que perder gado por predação de onças ou inserir a árvore da espécie manduvi na lista de proibição de supressão, por ser a única que serve de ninho para as araras-azuis.
O diretor-presidente do IHP (Instituto Homem Pantaneiro), Ângelo Rabelo, acompanhou a elaboração das propostas e diz que a lei é avanço significativo e propicia segurança jurídica para quem pretende desenvolver atividade econômica no Pantanal. “É um respeito ao equilíbrio de interesses.”
Em nota, o presidente da Famasul (Federação da Agricultura e Pecuária de MS), Marcelo Bertoni, diz que a lei foi criada a partir de consenso entre setor produtivo, ONGs e governo estadual, tendo encontrado equilíbrio, formando tripé ambiental, social e econômico.
“Conseguimos manter as questões que nos afligiam, como a da conversão de pastagem, por exemplo, entendemos que o texto aprovado atendeu satisfatoriamente” todos os envolvidos.
Único contrário à proposta, o deputado João Henrique Catan, diz que o governo enviou o projeto “aos 45 minutos do segundo tempo”, justamente para dificultar a discussão e garantir aprovação.
Ele questionou as medidas para delimitação do bioma, que usa diretrizes do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) incluindo áreas como sendo do Pantanal pertencentes a outros biomas.
Entre as propostas dele, a de que o fundo seja usado prioritariamente para o produtor rural e a dispensa do EIA-Rima para empreendimentos até mil hectares.
Em nota, o governador Riedel diz que a aprovação da lei é momento histórico, sendo passo importante na defesa de produção sustentável e que garanta a preservação da biodiversidade, dando condição e recursos aos pantaneiros.
“São fundamentais por manterem, após cerca de três séculos de ocupação, aproximadamente 84% de todo pantanal preservado”.
SILVIA FRIAS / Folhapress