RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Água verde transparente chegando suave na areia na praia do Leblon, na zona sul do Rio de Janeiro, em um dia ensolarado. O cenário atrativo justifica o mergulho do qual voltava a estudante de medicina, Geovanna Souza, 26, numa tarde quente na cidade. Ela só não sabia que aquele mar é considerado impróprio para banho quase o ano inteiro.
“Eu não podia imaginar. Essa água tão clarinha, achei que estivesse limpa”, disse a jovem ao ser informada pela reportagem. Recém-moradora do bairro, ela afirmou estar decepcionada. “É fácil se deixar enganar pela aparência.”
A qualidade da praia do Leblon nos três pontos de medição foi considerada imprópria para banho entre 25% e 50% do tempo em 2023, o que faz dela ruim, de acordo com critérios da Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo), adotados pela Folha.
Mesmo ciente disso, a aposentada Selma Ramos, 70, disse não se importar. Ao contrário de Geovanna, ela afirmou saber que as águas do Leblon nem sempre estão limpas. “Frequento aqui há muitos anos, vou na água, mergulho e nunca tive problema.”
A poucos metros dali, o cozinheiro Gustavo Neves, 21, olhava para o mar sentado em sua cadeira de praia como costuma fazer toda semana. Ele sai da Tijuca, na zona norte, só para dar um mergulho especialmente nos dias de muito calor.
“Não dá para não entrar, ainda mais com um calor de 40°C que faz aqui. Vejo que está todo mundo na água e imagino que está boa”, disse.
Para ele, a outra opção é a praia vizinha, Ipanema. “Às vezes, lá parece mais limpa.”
De fato, Ipanema esteve regular nos três locais onde a qualidade da água é medida, o que significa que esteve imprópria para banho em até 25% deste ano. O mesmo vale para as praias do Arpoador, Copacabana e Leme, que ficam próximas.
Segundo o Inea (Instituto Estadual do Ambiente), a balneabilidade da praia do Leblon é considerada ruim desde 2016.
O biólogo Mário Moscatelli afirma que praias consideradas permanentemente impróprias há décadas vêm apresentando períodos de melhoria. Isso ocorre, segundo ele, devido a entrada de novas concessionárias de água e esgoto no estado. “Estão fazendo um trabalho que impede que o esgoto seja lançado diretamente no mar.”
É o caso da praia do Flamengo. Conhecida como “brejão”, por causa da poluição, ela foi classificada como própria para banho em alguns períodos deste ano. O local voltou a atrair banhistas que rebatizaram o local de Caribrejo, em alusão aos cristalinos mares caribenhos.
“Não tenho nenhum problema em entrar na água. Gosto mais daqui por ser calmo, que é bom para levar criança”, afirmou a empresária Nathalia de Almeida, 38.
Apesar de caminhar para uma melhora, o trecho monitorado ainda é considerado impróprio na maior parte das medições feitas no ano inteiro.
Por isso, há quem ainda resista a entrar nas águas. “Comecei a frequentar a praia do Flamengo há uns dois anos, quando comecei a jogar ‘beach tennis’. Confesso que ainda não consigo entrar na água sempre soube da má reputação, então mesmo quando dizem que tá boa, eu não entro não”, disse a acupunturista Larissa Paixão, 34.
Para o especialista Moscatelli, a situação pode ser revertida de vez. “Décadas de descaso cobraram um preço em termos da balneabilidade de várias praias e levarão algum tempo para ser revertido, mas com empenho, a situação poderá mudar”, afirmou.
A reportagem seguiu normas federais no levantamento. Um trecho é considerado próprio se não tiver registrado mais de 1.000 coliformes fecais para cada 100 ml de água na semana de análise e nas quatro anteriores.
Para a avaliação anual, foi adotado o método da Cetesb, que classifica as praias a partir dos testes semanais. Nos dois extremos estão as boas, próprias em todas as medições, e as péssimas, impróprias em mais da metade das medições.
ALÉXIA SOUSA / Folhapress