BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse nesta quinta-feira (21) que a regularização do pagamento de precatórios autorizada pelo STF (Supremo Tribunal Federal) “foi a melhor medida possível”.
Em entrevista coletiva, o chefe da autoridade monetária demonstrou discordar do formato inicial defendido pelo Ministério da Fazenda, de classificar parte das sentenças judiciais como despesas financeiras, e elogiou a decisão da corte que rejeitou esse trecho do pedido.
“A gente entende que a medida foi boa. Tinha uma dúvida em relação a como contabilizar isso. A nossa opinião é que devia contabilizar como [gasto] primário, mas devia ser retirado da meta, porque é um item extraordinário, não era justo estar perseguindo uma meta e colocar o precatório no meio do processo. Foi exatamente assim que foi feito”, disse Campos Neto.
No fim de novembro, o STF decidiu autorizar o governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a regularizar o estoque de sentenças judiciais sem esbarrar em regras fiscais até o ano de 2026.
Por outro lado, a corte não acatou o pleito mais controverso do governo: classificar parte dessas sentenças como despesas financeiras, o que as deixaria fora dos limites do novo arcabouço fiscal e da meta de resultado primário também no futuro.
Como mostrou a Folha de S.Paulo, a tese defendida pela Fazenda enfrentou resistências do Ministério do Planejamento e Orçamento e na Casa Civil.
Agora, a fala de Campos Neto mostra que a ideia de mudar a classificação contábil de parte dos precatórios também não foi bem recebida pelo Banco Central, órgão responsável pelas estatísticas oficiais de finanças públicas.
Antes da decisão do Supremo, o presidente do BC evitou entrar em rota de colisão com o ministro Fernando Haddad (Fazenda). No fim de setembro, Campos Neto disse que a saída para os precatórios seria “uma decisão do STF” e que não cabia ao BC fazer “nenhum tipo de comentário” sobre qual visão vai preponderar.
“Entendo que é uma decisão do STF e do governo, e o BC segue o que for decidido”, disse na ocasião.
Com o sinal verde do Supremo, o governo editou nesta quarta-feira (20) a MP (medida provisória) que abriu um crédito extraordinário de R$ 93,1 bilhões para regularizar as sentenças judiciais.
Campos Neto falou sobre a decisão dos precatórios durante entrevista sobre o Relatório Trimestral de Inflação. No documento, o BC indica uma projeção de crescimento levemente maior em 2023 e riscos reduzidos de estouro da meta de inflação neste ano.
Por outro lado, o chefe da autoridade monetária reafirmou que as expectativas dos agentes econômicos para o cenário fiscal é um componente monitorado de perto pelo BC, uma vez que uma desancoragem nessa frente tende, no Brasil, a impactar também as projeções futuras para a inflação.
Nesse contexto, Campos Neto reafirmou que existe uma diferença entre o que as expectativas oficiais e o projetado pelo mercado tanto em dados fiscais como em inflação -quadro chamado por ele de desancoragem gêmea.
No cenário fiscal, por exemplo, enquanto o governo mantém a meta de zerar o déficit primário em 2024, o mercado estima rombo equivalente a 0,8% do PIB. O dado consta no boletim Focus, pesquisa semanal do BC com analistas do mercado, divulgado na última segunda-feira (18).
O presidente do BC, no entanto, minimizou as preocupações com o fiscal ao dizer em diferentes momentos que não existe uma reação mecânica entre esse quadro e a política monetária e que tais efeitos seriam vistos apenas no longo prazo.
Ele afirmou ainda que não seria tão relevante haver um resultado um “pouquinho” pior se houver continuidade de governo e Congresso no ritmo de reformas -que ele chamou de surpreedente.
Campos Neto disse que o BC reconhece o esforço empreendido pelo governo para ajustar as contas públicas, mas, por outro lado, disse que o trabalho precisa ser mantido –evitando fazer comentários mais detalhados sobre as contas públicas.
“A gente reconhece que o esforço fiscal foi bastante grande. A gente entende que o esforço precisa continuar”, afirmou.
IDIANA TOMAZELLI E FÁBIO PUPO / Folhapress