SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A pergunta assustou a atriz Aline Carcellé: “A gente já pode falar sobre evento para o Natal deste ano?”
Era fevereiro de 2023. Aquilo jamais havia acontecido para os proprietários da empresa Cia do Noel, especializada em alugar personagens natalinos para residências, eventos corporativos e shopping centers.
Aline e seu sócio, o ator Claudio Cabrera estavam acostumados a começar em julho as preparações para o Natal. É preciso planejar com antecedência porque dezembro é o mês que garante a sobrevivência da empresa pelos 12 meses seguintes.
“É dinheiro que nos mantém abertos por quase um ano”, diz Aline.
Na noite de 24 de dezembro, ela e Claudio coordenam uma equipe de 200 Papais Noeis espalhados pela cidade de São Paulo, divididos por regiões. Eles vão fazer visitas de 30 minutos em residências de famílias que pagaram entre R$ 1.300 e R$ 2.500 pelo serviço.
O valor é determinado de acordo com uma série de fatores, como se a barba do Papai Noel é natural ou artificial, horário da noite e o tipo de acompanhante que estará com o “bom velhinho”.
Eles estimam que na véspera de Natal serão cerca de 600 clientes atendidos. Isso sem falar em festas de empresas, comércios e shoppings que os contratam entre novembro e dezembro. Isso pode ser um mercado lucrativo também para quem se veste de Papai Noel.
“Dependendo da barba e se for natural, um Papai Noel de shopping pode ganhar até R$ 20 mil por 50 dias de trabalho”, afirma Aline.
No universo dos homens que encontram emprego temporário vestido como o personagem que vem da Lapônia para dar presentes às crianças, ter uma longa barba branca que não seja artificial é difícil.
“É o segundo ano que faço isso. Eu vivo de bicos, então esse dinheiro vai ser fundamental para eu me manter pelo menos até março”, diz Eduardo da Costa que não tem nenhuma das características para ser Papai Noel.
Tem apenas 35 anos, idade que não possibilitaria ser chamado de “bom velhinho”, é magro e não possui sequer bigode. Cabelo, barba e barriga são postiços.
Mesmo assim, desde 2022 ele consegue uma vaga temporária em loja de departamentos em Santana, zona norte de São Paulo. Por 40 dias de trabalho, vai receber R$ 2.500.
“Eu já trabalhei em empresa fazendo visitas nas casas de pessoas no 24 de dezembro. É uma loucura. Você sai de uma residência e vai para outra. As famílias te convidam para beber e comer”, conta Rodolfo Pinheiro, que em 2023 disse ter sido contratado por duas lojas.
“Ganhei um bom dinheiro porque já era dia 25 de dezembro e eu ainda estava indo em residências vestido de Papai Noel. Vou te falar que em 48 horas ganhei um dinheiro que me manteve por dois meses”, completa.
De segunda a sexta fica em frente a uma na região do centro, próximo à rua Santa Ifigênia, tradicional local de compra de eletrônicos. Nos fins de semana, dá plantão em centro comercial na Mooca, na zona leste.
“É comum as famílias oferecerem bebida ou comida para o Papai Noel. A gente não permite porque isso quebra a magia do Natal. Eles têm alimentação aqui na nossa base e podem comer antes de saírem ou na volta”, ressalta Aline Carcellé.
Em nome da noite mais importante para a empresa, ela e o sócio já há alguns anos não sabem o que é uma ceia com familiares em 24 de dezembro.
“É uma loucura. Não sabemos o que é Natal faz tempo. A gente só para um pouco em 26 de dezembro. Tem de pegar figurino, prestar serviço a eventos de Natal que vão continuar ativos Não dá para parar”, completa.
O raciocínio dela é o mesmo de quem se veste de Papai Noel. É cansativo, exige muito tempo, mas a questão financeira compensa e vai durar por meses depois que o feriado passar.
“No teatro, é muito difícil ganhar um dinheiro bom. A gente ficou muito tempo em um grupo bem premiado [Teatro Vento Forte] e era muito conhecido. Era um dinheiro que dava mais ou menos para pagar as contas. Aqui na empresa a gente quer fazer uma coisa lúdica e mágica. Caprichamos mais”, finaliza.
Isso significa oferecer também personagens como o Grinch (que nos quadrinhos e no cinema odeia o Natal), um mágico ou aquele que é mais procurado ao lado do Papai Noel de barba natural: o duende que toca violino.
Serve para reaquecer mercado que teve um baque entre 2020 e 2021, com a pandemia da Covid-19, o que fez parte das empresas do setor fechar.
ALEX SABINO / Folhapress