SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O primeiro aniversário da morte de Pelé é mais um pretexto para homenagens ao Rei do Futebol. Não que elas tenham cessado em algum momento desde que parou o corpo do craque, aos 82 anos, em 29 de dezembro de 2022, por complicações decorrentes de um câncer no cólon.
Foi constante nestes 12 meses o louvor ao tricampeão mundial, nas mais variadas plataformas, em todas as partes do mundo. Houve tributos em Três Corações, local de nascimento, Bauru, terra dos primeiros chutes, e Santos, palco mais frequente.
Houve também em Paris, onde a Fifa (Federação Internacional de Futebol) realizou sua anual premiação dos melhores da temporada, em fevereiro. Como não poderia deixar de ocorrer, grande parte da cerimônia foi dedicada ao homem que encantou o planeta com seu talento. Coube ao ex-jogador Ronaldo tentar resumir o que representou Edson Arantes do Nascimento para o esporte.
“Era um jogador muito à frente do seu tempo, um atleta que serviu de inspiração para mim e todo o mundo no futebol. Nos anos 50, já era moderno, chutava com as duas pernas, saltava mais alto que os outros, fazia gol de bicicleta, cabeça. Eu também me lembro dele como um amigo querido. Quando eu tive a primeira lesão no meu joelho, em 2000, ele me visitou na minha casa, levando muito amor e carinho em um dos momentos mais difíceis da minha vida”, disse Ronaldo.
“O Pelé também será lembrado pelo impacto na sociedade. Quando ele jogava, o mundo era um lugar ainda mais racista do que era hoje. Ele, um atleta negro, virou o rei do esporte mais popular do planeta. Mostrou que o negro pode ser o melhor, mais bem-sucedido, e pode vencer o racismo. Essa luta ainda não acabou, mas peço que todos se inspirem na luta do Rei Pelé”, acrescentou.
Ainda que a falta de um engajamento maior nessa luta seja uma frequente crítica a Edson, é de fato inegável o impacto de Pelé. Em pessoas de todas as idades, das mais variadas origens. E até nas da ficção.
O escritor Nelson Rodrigues, o primeiro a chamar o jogador de rei, incluía em suas crônicas a “grã-fina das narinas de cadáver”, personagem caricata que não entendia nada de futebol e aparecia no estádio perguntando quem era a bola. Mas até ela se curvava diante da majestade ululante. “O que a magnetizava era Pelé como homem, mito e herói.”
Não surpreende, portanto, que as homenagens tenham sido constantes ao longo deste ano. O Campeonato Brasileiro teve um minuto de silêncio em cada uma de suas 380 partidas e ganhou o nome de Brasileirão Rei. Em cruel ironia, após anos de namoro com a segunda divisão, o Santos foi enfim rebaixado.
O roteiro torna difícil não abraçar a observação piegas de que o clube seis vezes campeão nacional com Pelé tenha esperado sua morte para cumprir um destino inevitável. De qualquer maneira, avisou o novo presidente alvinegro, na Série B ninguém usará a camisa 10 que já foi do maior.
Será mais uma homenagem, em lista interminável que não cabe em um texto. Houve homenagens ao craque Pelé, ao homem Edson e ao pequeno Dico, como a avó Ambrosina chamava o garoto de Três Corações.
No recém-lançado “Dico: o Menino que Morava no Coração do Pelé”, Celso de Campos Jr. conta com as ilustrações de Lhaiza Morena para mostrar que o menino moldou o homem e forjou o craque. Se Pelé gostava de se referir a Edson na terceira pessoa, havia uma segunda entre eles, Dico.
“Será que, quando uma criança cresce, ela desaparece? Nada disso”, pergunta e responde a obra infantil. “Quando alguém tem uma criança no coração, ganha poderes infinitos. Quer ver só?”, prossegue Campos Jr., antes de reconstruir ludicamente a trajetória do Rei do Futebol.
Três Corações, três pessoas em uma. Três palavras, ou uma: o célebre “love, love, love”, dito em sua aposentadoria nos Estados Unidos.
“Essas palavras saíram do coração do Pelé”, relata o livro “Dico”. “E a gente sabe quem morava lá, né?”
MARCOS GUEDES / Folhapress