Boulos chega a 2024 com bônus, mas também carga maior que na eleição de 2020

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Prestes a encarar sua segunda campanha consecutiva à Prefeitura de São Paulo, Guilherme Boulos (PSOL) vive os paradoxos de começar a corrida para 2024 com vantagens como a dianteira nas pesquisas e lidar com os riscos de sofrer maior escrutínio e virar alvo preferencial dos rivais.

O pré-candidato e seu entorno listam uma série de bônus existentes hoje, considerando como trunfos o apoio do presidente Lula (PT), a inclinação da capital à esquerda na eleição de 2022 e uma unidade maior ao redor de seu nome, na comparação com a disputa contra o então prefeito Bruno Covas (PSDB).

Ricardo Nunes (MDB), o vice que assumiu com a morte do tucano em 2021 e agora mira a reeleição, iniciou cedo a estratégia de tentar neutralizar seu principal adversário. O prefeito busca há meses desqualificar o hoje deputado federal com adjetivos como radical e extremista.

A ida de Boulos ao segundo turno contra Covas foi lida na época como vitória política de um líder que despontava na esquerda, num momento em que Lula ainda estava agarrado às teias da Lava Jato e com seu futuro sob suspeição. Com 40,6% dos votos válidos, o psolista “perdeu ganhando”.

Há quatro anos, ele apareceu com 9% na primeira pesquisa Datafolha sobre o pleito municipal, em setembro –a eleição foi adiada de outubro para novembro pela pandemia de Covid-19.

Na sondagem inicial do instituto para 2024, em agosto do ano anterior, Boulos alcançou 32% das intenções de voto e o primeiro lugar, seguido por Nunes, com 24%. O emedebista poderá ter o apoio do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), o que dará um tom nacional e polarizado à disputa local.

Em 2022, a votação na capital paulista de Lula e do candidato do PT a governador, Fernando Haddad, superou a de Bolsonaro e de seu ex-ministro Tarcísio de Freitas (Republicanos) –ambos, contudo, venceram no interior do estado. Lula tem sua gestão aprovada por 45% dos moradores da cidade de São Paulo, conforme o Datafolha.

Na visão de aliados, a liderança do psolista atraiu holofotes e deixou mais evidentes os escorregões.

Boulos foi criticado, por exemplo, por deixar de repudiar veementemente os atos do Hamas contra Israel, fazendo com que sua postura histórica de apoio ao povo palestino fosse usada para caracterizá-lo como conivente com terrorismo. A onda negativa incluiu fake news distribuídas contra ele nas redes.

O posicionamento inicial sem menção ao grupo terrorista provocou uma baixa no time de especialistas que auxilia o pré-candidato na área de saúde. O médico Jean Gorinchteyn, ex-secretário estadual de João Doria (PSDB), deixou a coordenação da equipe inconformado com a fala.

Pressionado, Boulos fez um novo pronunciamento no plenário da Câmara dos Deputados em que condenou as ações do Hamas, sem adjetivar o grupo, e também buscou responsabilizar Israel.

Auxiliares minimizaram os desgastes, lembrando que a repercussão dos gestos cresce conforme o nível de conhecimento e a competitividade de um postulante.

Segundo o Datafolha, Boulos é conhecido por 80% da população da cidade de São Paulo. Ele foi eleito deputado com mais de 1 milhão de votos, 48% deles obtidos na capital do estado.

A inexperiência no Executivo, já apontada antes como uma desvantagem, passou a ser um ponto de atenção diante do maior grau de “expectativa de poder”. Como antídoto, ele criou uma frente para a discussão do programa de governo com auxiliares e técnicos que passaram por outras gestões.

Ao mesmo tempo, o PT, que deve indicar o vice, negocia a volta à legenda da ex-prefeita Marta Suplicy –que hoje é secretária da gestão Nunes– para ocupar a vaga, numa estratégia parecida com a de 2020, quando a também ex-prefeita Luiza Erundina (PSOL) foi a parceira de chapa de Boulos.

Entre os pontos favoráveis listados por auxiliares em relação a 2020 há aspectos relacionados à conjuntura partidária e ao perfil do candidato, que vem tentando transmitir moderação.

Concorrendo sem alianças em 2020, o representante do PSOL tinha 17 segundos de propaganda de TV e rádio no primeiro turno, ante os mais de 3 minutos de Covas. Agora coligado com PT e mais três legendas, sua expectativa é ultrapassar 3 minutos por bloco e multiplicar as inserções ao longo do dia.

A união com o PT foi vista como decisiva e marca uma diferença fundamental. Na eleição anterior, o partido lançou a candidatura de Jilmar Tatto –que teve o pior resultado petista na história da capital, em sexto lugar (8,6% dos votos válidos)– e só apoiou o psolista formalmente no segundo turno.

Boulos disse em recente entrevista à revista IstoÉ que “a esquerda tinha cinco candidatos naquela eleição”, mas o desempenho dele criou para 2024 “uma expectativa de unificação do campo progressista”.

Para Josué Rocha, assessor de Boulos que divide a coordenação da pré-campanha com o presidente municipal do PT, Laércio Ribeiro, a fragmentação ampliava as dificuldades. “Saíamos de um patamar de apoio eleitoral menor e precisávamos crescer, o que é bem distinto do cenário hoje”, diz Rocha à Folha.

A leitura de auxiliares é que neste ano o deputado chega como candidato único da esquerda, o que demonstraria consenso e unidade, a despeito da pré-candidatura de Tabata Amaral (PSB). Também oriunda do campo governista, ela tem apresentado propostas mais ao centro.

Ribeiro afasta o risco de eventuais tensões no PT e no rol de partidos aliados. “O Boulos tem sido uma grata surpresa para a militância. É muito hábil e articulado. Boa parte dessa unidade que construímos se deve a ele, pela forma como conduziu o processo. Nós vamos disputar para ganhar”, afirma.

Boulos também consolidou o controle da máquina partidária do PSOL, com a eleição de aliados seus para as cadeiras de direção nos níveis federal, estadual e municipal. A avaliação é que o entrosamento dará tranquilidade maior ao candidato dentro de casa e inibirá casos de fogo amigo.

Os maiores desafios, na ótica dos correligionários, são combater os persistentes rótulos de radical, baderneiro e invasor de propriedades, embasados pelos rivais na trajetória combativa de 20 anos do psolista como líder do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto).

“Naturalmente, uma campanha que está em primeiro lugar desde o primeiro momento é muito mais alvo dos adversários”, diz Rocha, que prevê uma disputa mais dura e virulenta. “Neste ano, precisamos ter uma preocupação defensiva grande, para responder a esses ataques.”

Em dezembro, dias antes de anunciar apoio a Nunes, o presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab, disse em um evento que Boulos é o “franco favorito”. Kassab também é secretário da gestão Tarcísio.

“Eu diria que estamos animados, mas sem salto alto”, afirma Rocha.

JOELMIR TAVARES / Folhapress

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