TAIPÉ, TAIWAN (FOLHAPRESS) – A duas semanas das eleições presidenciais de Taiwan, a empresa-símbolo de Taiwan, a TSMC, maior fabricante de chips avançados no mundo, se viu dentro da campanha, no debate entre os candidatos a vice, realizado na segunda (1º).
Os dois presidenciáveis da oposição, Hou Yu-ih e Ko Wen-je, vinham evitando a questão, mas seus companheiros de chapa questionaram o governo pelas fábricas que a TSMC está construindo no Arizona, nos Estados Unidos sem a prometida contrapartida americana e ameaçando esvaziar a produção taiwanesa.
O assunto foi levantado pela vice de Ko, Cynthia Wu, que afirmou que os maiores investidores em Taiwan são Dinamarca, Japão e Austrália. “Quanto os EUA investiram?”, cobrou, voltando-se para a vice governista, Hsiao Bi-khim:
“Senhora Hsiao, como enviada de Taiwan aos EUA, as relações bilaterais têm sido boas. A TSMC está investindo nos EUA, você também facilitou a importação de carne suína americana e assim por diante. Agora, quanto os EUA estão investindo em Taiwan?”
Vice de Lai Ching-te, que lidera as pesquisas, Hsiao defendeu o governo e sua própria atuação, ela que foi a representante diplomática em Washington até novembro. Sem números, agradeceu a empresas americanas como “Google, Amazon e Micron, que continuam a aprimorar e aumentar investimentos em Taiwan”.
A crítica maior foi de Jaw Shaw-kong, vice de Hou, segundo colocado nas pesquisas. Ele lembrou que o investidor americano Warren Buffett vendeu toda a sua participação na TSMC, com a justificativa do risco geopolítico de Taiwan, e que até a cantora Taylor Swift teria evitado se apresentar na ilha.
“Sem paz em Taiwan, ninguém quer investir”, disse. Sem investimento, as empresas, “como a TSMC, têm que mudar para o exterior, é assim que esvaziamos Taiwan”. O atual governo “provocou tensão no estreito, generais dos EUA têm dito que haverá guerra, então o investimento não vem”.
Hsiao respondeu que era “desinformação” e que “o investimento estrangeiro continua entrando, em nível recorde”. Diferentemente do que Jaw descreveu, segundo ela, as empresas “não estão tentando fugir” da ilha.
Especificamente sobre a TSMC nos EUA, Hsiao disse: “É uma empresa de que todos nos orgulhamos. Não é algo que você use para ganhos políticos. É uma montanha sagrada que protege a todos. Baseada em sua própria estratégia, nas necessidades de seus clientes, ela precisa ter maior presença global”.
Jaw, conhecido apresentador de TV, com programa semelhante ao de José Luiz Datena no Brasil, ironizou que “a América ama a senhora Hsiao”. Citando que ela chegou a ter cidadania americana, perguntou para qual lado iria sua lealdade em caso de “conflito de interesses entre Taiwan e EUA”.
O vice oposicionista indicou que o motivo para a TSMC entrar no debate, nesta reta final da campanha, foi a saída abrupta do presidente da empresa, Mark Liu, duas semanas atrás, logo após Washington adiar um estímulo bilionário programado para as fábricas.
“Talvez o motivo de ele ter se demitido sejam as dificuldades na construção das ‘fabs’ nos EUA”, disse Jaw, buscando responsabilizar Hsiao e o governo. Nos últimos dias, a imprensa taiwanesa tem buscado explicar a demissão de Liu pelos problemas no Arizona.
O executivo foi o principal defensor das novas “fabs”, como são chamadas as unidades de manufatura de chips, apesar da resistência do próprio fundador da TSMC, Morris Chang, 92, que não atua no dia a dia da companhia mas permanece sendo sua referência, com seguidas intervenções públicas.
Com uma previsão de investir US$ 40 bilhões (R$ 196 bilhões) nas duas unidades no Arizona, a TSMC enfrenta problemas desde que anunciou a decisão, em 2020. Encarando custos quatro ou cinco vezes maiores de construção e sem pessoal especializado para operação, a empresa adiou a abertura por um ano, para 2025.
Analistas de tecnologia como Stanley Chao avaliam agora que, devido ao adiamento dos subsídios pelo governo Joe Biden e ao demorado licenciamento ambiental, além da relutância da cadeia de suprimentos taiwanesa em seguir a TSMC até o Arizona, a produção comercial deve ser adiada para 2026 ou 2027.
Teme-se, pelo que relata a imprensa de Taipé, prioridade nos estímulos para a americana Intel ou que eles acabem ficando para o próximo governo. A TSMC, que foi proibida por Donald Trump de vender chips para a chinesa Huawei, então um de seus maiores clientes, pode se ver sob pressão dele novamente.
O ex-presidente e seus colaboradores têm indicado indiferença e até rancor diante da empresa e da ilha. Mas outro analista de tecnologia, o americano Daniel Nystedt, baseado em Taiwan, acredita que não haverá “nenhuma grande mudança se Trump vencer a eleição”.
O apoio bipartidário nos EUA “cria uma determinação poderosa”, diz ele. “Biden prosseguiu com a posição sobre China iniciada pelo governo Trump, e eu espero que qualquer novo governo americano continue o bom trabalho de Biden também.”
NELSON DE SÁ / Folhapress