Inflação fecha 2023 em 4,62% e fica abaixo do teto da meta após dois anos de estouro

RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – A inflação oficial do Brasil, medida pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), fechou o acumulado de 2023 em 4,62%, apontou nesta quinta-feira (11) o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). É a menor alta em três anos, desde 2020 (4,52%).

Com o resultado, o IPCA encerrou 2023 abaixo do teto de 4,75% fixado para a meta de inflação perseguida pelo BC (Banco Central). O índice havia estourado o limite superior da meta nos dois anos anteriores, em 2022 (5,79%) e 2021 (10,06%).

Apesar de perder força, a inflação de 2023 ficou acima da mediana das projeções do mercado financeiro. Analistas consultados pela agência Bloomberg esperavam variação de 4,55% para o acumulado do ano passado, que marcou o início do governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

No recorte mensal, o IPCA acelerou de 0,28% em novembro para 0,56% em dezembro, segundo o IBGE. A nova taxa veio acima das projeções do mercado.

Analistas esperavam variação de 0,50% no último mês de 2023, conforme a Bloomberg. Ainda assim, a marca de 0,56% é a menor para o período de dezembro desde 2018 (0,15%).

ALIMENTOS ALIVIAM RESULTADO DO ANO

O IPCA perdeu força no ano passado com a trégua dos alimentos. O alívio veio após a disparada da inflação desses produtos em meio aos reflexos da pandemia, da Guerra da Ucrânia e de choques climáticos.

Em 2023, o aumento da oferta de mercadorias a partir da ampliação da safra agrícola ajudou a frear os preços da comida. Também houve maior disponibilidade de alimentos como carne e leite no país.

“A safra do ano passado foi muito boa. Melhorou a inflação e melhorou o PIB também”, afirma o economista André Braz, do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas).

O grupo alimentação e bebidas, que tem o maior peso no cálculo do IPCA, subiu 1,03% no ano passado. Isso representa uma desaceleração ante 2022, quando a alta havia sido de 11,64%.

O resultado menor está associado à queda dos preços da alimentação no domicílio (-0,52%). Foi a primeira redução desse subgrupo desde 2017 (-4,85%).

O IBGE destacou as baixas do óleo de soja (-28%), do frango em pedaços (-10,12%) e das carnes (-9,37%) no ano passado. O óleo de soja teve a maior deflação (queda) entre os 377 subitens (produtos e serviços) que compõem o IPCA.

“O grupo de produtos alimentícios ficou abaixo do resultado geral e ajudou a segurar o índice de 2023. Houve quatro quedas seguidas no meio de ano, o que contribuiu para esse resultado”, disse André Almeida, gerente da pesquisa do IPCA.

“A queda na alimentação no domicílio reflete as safras boas e a redução nos preços das principais commodities no mercado internacional, como a soja e o milho”, completou.

GASOLINA PRESSIONA EM 2023

Por outro lado, o grupo dos transportes exerceu a maior pressão no IPCA de 2023. O segmento acumulou alta de 7,14% no ano passado, após deflação de 1,29% em 2022. Com o novo resultado, gerou impacto de 1,46 ponto percentual no índice, o principal entre os grupos.

Nos transportes, destaca-se a alta da gasolina (12,09%), que é o subitem com o maior peso no IPCA. O combustível foi o responsável pelo principal impacto individual no índice em 2023 (0,56 ponto percentual).

A pressão da gasolina veio na esteira da retomada da cobrança de tributos que haviam sido congelados pelo governo Jair Bolsonaro (PL) às vésperas das eleições de 2022.

“Vale lembrar que a gasolina teve o impacto da reoneração dos tributos federais e das alterações nas cobranças do ICMS”, afirmou Almeida.

Outras altas relevantes nos transportes vieram do emplacamento e da licença (21,22%) e das passagens aéreas (47,24%).

O centro da meta de inflação, referência para a política monetária do BC, estava em 3,25% em 2023. O intervalo de tolerância era de 1,5 ponto percentual para mais (4,75%) ou para menos (1,75%).

Segundo André Braz, do FGV Ibre, outro fator que ajuda a explicar a inflação menor em 2023 é o impacto dos juros elevados. O crédito caro desestimulou a demanda por bens duráveis e, assim, freou os aumentos dos preços, diz o economista.

Bens duráveis são mercadorias de maior valor agregado, cuja venda está associada a financiamentos, como veículos e eletrodomésticos. Ainda de acordo com Braz, a desaceleração dos serviços completa a lista de componentes que atenuaram o IPCA em 2023.

O índice de inflação dos serviços foi de 6,22% no ano passado, abaixo da alta de 7,58% em 2022. Já o indicador de preços monitorados, que inclui combustíveis e energia elétrica, subiu 9,12% em 2023, acima da deflação de 3,82% do ano anterior.

ALIMENTOS PUXAM ALTA EM DEZEMBRO

De novembro para dezembro, a aceleração do IPCA mensal (de 0,28% para 0,56%) veio acompanhada de alta nos nove grupos de bens e serviços pesquisados pelo IBGE.

A principal pressão veio de alimentação e bebidas. O segmento subiu 1,11% no último mês de 2023, mais do que em novembro (0,63%). O impacto no IPCA foi de 0,23 ponto percentual.

A situação de dezembro difere da verificada no acumulado do ano, quando os alimentos aliviaram o índice. André Almeida, do IBGE, associou o resultado mensal aos efeitos do clima.

Segundo ele, a produção de alimentos costuma ser dificultada na reta final do ano por temperaturas mais elevadas e chuvas intensas. No final de 2023, o Brasil viveu episódios extremos, como ondas de calor no Sudeste, seca no Norte e alagamentos no Sul.

“Os fatores climáticos acabaram influenciando os alimentos”, afirmou Almeida.

A alimentação no domicílio subiu 1,34% em dezembro, mais do que em novembro (0,75%). Houve altas da batata-inglesa (19,09%), do feijão-carioca (13,79%), do arroz (5,81%) e das frutas (3,37%). Já o leite longa vida recuou pelo sétimo mês consecutivo (-1,26%).

A passagem aérea, que integra o grupo dos transportes, registrou inflação de 8,87%. A alta foi menor do que a de novembro (19,12%). Mesmo assim, a passagem teve a maior contribuição individual para o avanço do IPCA em dezembro (0,08 ponto percentual).

ALERTA NO FIM DE 2023

Parte dos analistas avalia que o resultado do mês passado, que ficou acima do esperado, acende alerta para o comportamento da inflação em 2024.

Luciano Costa, economista-chefe da corretora Monte Bravo, diz que o IPCA de dezembro “serve de advertência”, apesar de a alta estar associada a choques pontuais.

“A reversão do choque favorável de alimentos, a diminuição do efeito da deflação dos bens industriais e a manutenção do mercado de trabalho aquecido são fatores que demandam cautela na condução da política monetária, em especial num ambiente de continuidade de crescimento real de gastos”, afirma.

Em 2024, a expectativa de analistas é de que o IPCA desacelere a 3,90% no acumulado do ano, conforme a mediana da edição mais recente do boletim Focus, divulgada na segunda (8) pelo BC.

O centro da meta é de 3% em 2024, 2025 e 2026, com tolerância de 1,5 ponto percentual para mais (4,5%) ou para menos (1,5%).

Conforme analistas, o cenário deste ano deve trazer alterações em relação a 2023. Uma das prováveis mudanças abrange os alimentos, cujos preços tendem a subir em 2024 após a trégua no ano passado.

O principal fator por trás dessa estimativa é o El Niño, que eleva os riscos de estragos no campo. O fenômeno climático ameaça reduzir a oferta de alimentos, com eventual repasse para os preços finais. Assim, a comida pode impedir uma desaceleração mais intensa do IPCA no acumulado de 2024.

Para André Cordeiro, economista sênior do banco Inter, o resultado da inflação em dezembro “não foi muito animador”. Ele ainda vê sinais de continuidade do processo de desinflação, mas diz que alguns riscos começam a aparecer no horizonte, principalmente no que diz respeito a núcleos de inflação e preços de serviços.

INPC FECHA 2023 EM 3,71%

O IBGE também informou nesta quinta que o INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) fechou 2023 com variação acumulada de 3,71%, abaixo do resultado de 2022 (5,93%).

O INPC é usado como referência para correção de benefícios como aposentadorias e seguro-desemprego. O indicador reflete os preços de bens e serviços com maior peso no consumo das famílias de renda menor (de um a cinco salários mínimos).

LEONARDO VIECELI / Folhapress

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