Tarcísio segue patamar tucano de verba a aliados, e Sabesp dita ritmo

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Em seu primeiro ano de mandato, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) manteve o patamar das gestões tucanas de emendas voluntárias para deputados estaduais, privilegiando os que são aliados e seguindo um ritmo de pagamento ditado pelo projeto de privatização da Sabesp.

No total, até 28 de dezembro de 2023, 89 dos 94 deputados estaduais fizeram indicações que somam R$ 858 milhões para serem gastos com prefeituras e entidades das suas regiões de atuação.

De acordo com os dados publicados pela Secretaria de Governo, Tarcísio pagou efetivamente 41% (R$ 355 milhões) até a mesma data, um dos fatores que explicam a insatisfação que reinou na base tarcisista na Assembleia Legislativa de São Paulo. Sobre as ainda não quitadas, cita complexidades de tramitação.

As gestões de João Doria e Rodrigo Garcia (PSDB) prometeram para os deputados estaduais, em valores corrigidos pela inflação, cerca de R$ 862 milhões em 2021 e R$ 605 milhões em 2022.

O principal projeto de Tarcísio, a aprovação da privatização da Sabesp, acabou guiando os pagamentos, o que integrantes do governo dizem ser uma coincidência. Em 20 de outubro, três dias depois do envio do texto à Alesp, o Palácio dos Bandeirantes realizou o maior repasse até então, de R$ 78 milhões.

Quase 53% do total das indicações foram pagas em novembro, durante a tramitação do projeto na Casa. No dia 6 de dezembro, 62 deputados votaram a favor da venda da estatal, mais do que a expectativa do próprio governo, que falava em cerca de 50 votos.

Integrantes do governo, no entanto, afirmam que não houve favorecimento de deputados nem liberações vinculadas à aprovação de projetos. Eles dizem que os pagamentos ficaram para o fim do ano por problemas na logística das emendas, que às vezes não cumprem os critérios para serem pagas.

Deputados aliados somaram R$ 11 milhões em indicações voluntárias, contra R$ 5,5 milhões de deputados do PT, que são oposição. Apenas os cinco deputados do PSOL não indicaram emendas extras.

Entre os valores pagos, 91% foram para partidos da base e apenas 9% para a oposição. Dentre as indicações do Republicanos, 55% foram pagas, proporção que cai para 26% no caso do PT.

Ao longo do ano, Tarcísio passou por uma série de reveses na Alesp em meio à pressão do centrão por emendas e cargos e diante da cobrança de um alinhamento ao bolsonarismo por parte da bancada conservadora.

Apesar de uma resistência inicial, Tarcísio estabeleceu, em junho, o modelo de pagamento das emendas voluntárias e vai repetir a prática neste ano. Na visão de aliados do governador, as indicações são uma forma mais saudável de contemplar a base do que a entrega de cargos para apadrinhados políticos.

Os dados mostram que alguns deputados bolsonaristas, como Lucas Bove (PL) e Major Mecca (PL), estão entre os que tiveram menos indicações pagas, o que contribuiu para o descontentamento dessa ala.

Gil Diniz (PL), deputado mais próximo da família Bolsonaro na Alesp, por exemplo, teve R$ 5,5 milhões em indicações pagas, ficando em 27º lugar no ranking. Gil é um dos membros do bloco de bolsonaristas que passou a se declarar independente em relação ao governo.

As reclamações em relação à articulação política do governador, porém, não se restringem a esse grupo. Apenas 5 dos 89 deputados tiveram a totalidade das suas indicações executadas.

Coordenadas pelo secretário de Governo, Gilberto Kassab (PSD), as emendas extras ou voluntárias, que sob Tarcísio são feitas por meio das indicações parlamentares, são liberadas conforme a conveniência do governo –ao contrário das emendas impositivas, que têm o mesmo valor para todos os deputados e são de pagamento obrigatório.

Em 2023, cada deputado teve direito a R$ 10,5 milhões em emendas impositivas para seus redutos eleitorais. Os deputados de primeiro mandato, que são 39, não usufruem dessa verba no primeiro ano da nova legislatura, o que ampliou a pressão pelas emendas extras.

No caso das emendas impositivas, o governo pagou R$ 617 milhões (66% do que foi indicado) em 2023.

Em relação às indicações, membros do governo dizem que o valor combinado foi de R$ 10 milhões para a base e R$ 5 milhões para a oposição –a diferença nos dados se daria porque algumas indicações para entidades que não cumprem os requisitos precisaram ser refeitas.

Ao contrário de Tarcísio, as gestões tucanas também atenderam deputados federais e senadores, o que, se somar às verbas para deputados estaduais, atinge uma liberação recorde de mais de R$ 1 bilhão em 2021 e novamente em 2022, no contexto de preparação de Doria e Rodrigo para disputar as eleições.

Sem transparência, as liberações para cerca de 60 deputados estaduais tinham níveis de valores que começavam com R$ 2,5 milhões para os de oposição e variavam mesmo entre os da base, chegando a R$ 30 milhões para alguns poucos.

Tarcísio manteve os patamares tucanos para os deputados estaduais, mas deu mais institucionalidade à prática –abrangendo quase a totalidade dos parlamentares, com valores mais igualitários e publicando os dados na internet.

Cientista político e professor da FGV, Claudio Couto vê um “critério tecnocrático que politicamente não faz muito sentido”. “Fico com a pulga atrás da orelha sobre o papel dos articuladores, como Kassab, no governo”, diz.

O secretário da Casa Civil, Arthur Lima (PP), afirma que o Executivo compreendeu a importância das indicações. Ele lembra que o governo aprovou todos os projetos de seu interesse na Alesp.

“O Parlamento é quem faz o Orçamento, então nada mais justo do que os deputados executarem uma parte dele. Por meio das emendas, os deputados podem, junto a suas bases, fazer o papel do parlamentar”, disse à Folha de S.Paulo.

O governo Tarcísio afirmou que as indicações são realizadas com transparência e podem ser consultadas em detalhes. Também declarou que o ritmo de pagamento não é vinculado aos projetos na Alesp e justificou a parcela que ainda não foi paga.

“A liberação e execução das indicações varia de acordo com a complexidade de tramitação de cada uma e não tem relação com a votação de projetos no Legislativo”, afirma em nota.

A administração exemplifica mencionando que as indicações de saúde são mais ágeis por ocorrerem por meio de transferências fundo a fundo. Outros tipos de convênios possuem maior complexidade.

“O governo tem mantido contato frequente com parlamentares e prefeituras e a tramitação vem ocorrendo normalmente nas diversas secretarias envolvidas. As indicações devem seguir a legislação e o portfólio de projetos do governo”, completa.

ARTUR RODRIGUES E CAROLINA LINHARES / Folhapress

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