DAVOS, SUIÇA (FOLHAPRESS) – O otimismo em relação às economias locais e global cresceu entre os altos executivos de multinacionais desde o ano passado, mas, pela primeira vez em dez anos, o Brasil não aparece entre os dez principais mercados considerados estratégicos para o empresariado mundial, mostra levantamento da PwC.
Na 27ª edição da CEO Survey, feita anualmente pela consultoria internacional e lançada nesta segunda-feira (15) em Davos, na abertura da reunião anual do Fórum Econômico Mundial, o país aparece na 14ª posição do ranking de mercados cruciais para a expansão dos negócios no próximo ano.
O sócio-presidente da PwC Brasil, Marco Castro, atribui o movimento a uma recalibragem do foco das empresas para os mercados internos, além da atratividade dos retornos nos Estados Unidos dados os juros mais altos do que de costume.
Pesam ainda as crises na região, com destaque para a argentina, e o ônus de fazer negócios no país, apesar do efeito positivo das reformas econômicas em curso e da promessa do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de manter as contas nos trilhos.
“A gente já esteve muito mais próximo das luzes da ribalta do que a estamos nesse momento”, diz. O Em 2023, o país era o 10º, e em 2014, o 4º. Foram entrevistados para o relatório cerca de 4.700 líderes empresariais pelo mundo, incluindo no Brasil.
Quando os presidentes-executivos são indagados sobre quais mercados externos são mais importantes para a perspectiva de crescimento de seu negócio, os Estados Unidos continuam no topo da lista, mas ante um cenário econômico relativamente acanhado e alguns solavancos geopolíticos, perderam pontos em relação à China, segunda colocada.
A diferença de menções entre os dois, que no ano passado foi de 17 pontos percentuais, agora é de oito pontos. Alemanha, Reino Unido e Índia surgem na sequência.
Esse reposicionamento ocorre em meio a uma contínua reorganização da cadeia de produção e consumo global, em razão das guerras, rápidas mudanças tecnológicas, eventos climáticos e atritos políticos e comerciais.
Os executivos avaliam que tecnologia, mudanças climáticas e outras megatendências que afetam os negócios no mundo devem exercer mais pressão nos próximos três anos do que nos cinco anteriores.
As expectativas melhoraram um pouco em relação à economia global. Não que sejam otimistas: 36% no Brasil e 38% no mundo esperam aceleração nos próximos 12 meses (ante 17% e 18%, respectivamente), e, embora os que prevejam desaceleração tenham caído de 73%, nos dois casos, para 39% no Brasil e 45% no mundo, eles ainda são mais numerosos.
“A gente viveu o ano passado assombrado por inflação e juros altos. Parece que chegou no topo e agora é uma descida. O problema é a velocidade, até porque as economias precisam se reposicionar em relação a isso”, diz Castro à Folha de S.Paulo. “As empresas estão sufocadas, precisam renovar empréstimos, operações, captações.”
Assim, continua a ser lúgubre a perspectiva dos CEOs. Para 39% no mundo (33% no Brasil), as empresas que dirigem serão economicamente inviáveis em dez anos. Se a pergunta inclui a manutenção do atual modelo de negócios, esses índices sobem para 41% no Brasil e 45% no mundo aumentos de, respectivamente, oito e seis pontos percentuais.
Em relação a seu próprio mercado, a visão dos brasileiros é mais positiva do que a média global (55% anteveem aceleração, 11 pontos a mais do que o índice mundial). O Brasil só perde em otimismo para Índia (86%) e China (55%), países com imensos mercados internos em rápida transição.
O relatório deixa evidente a necessidade de redesenhar fluxos de trabalho ante a crise dos atuais modelos de gestão, acelerada pelas mudanças ao longo de três anos de pandemia e pelo avanço de novos tecnologias, como a IA generativa. A mudança tecnológica é considerada a de maior impacto, com menções por 56% dos respondentes (72% no Brasil).
“Há incômodo crescente de tarefas e processos de baixo valor agregado”, afirma Castro. “Por mais que tenhamos agregado tecnologia, investido, equipado todos e aprendido, inclusive durante a pandemia, que deu uma certa agilidade em uma série de processos, a gente ainda está se afogando no meio de respostas de e-mails e reuniões improdutivas.
O tempo consumido em atividades prosaicas como reuniões e emails é considerado ineficiente por 40%, e 60% esperam maior produtividade com os novos modelos de inteligência artificial, embora estes tenham sido adotados por apenas 1 em cada 3 empresas participantes.
“Apesar de investimentos que foram feitos, as empresas precisam caminhar para uma reinvenção, para uma mudança de modelo, para uma nova abordagem”, diz Castro.
A pressão das mudanças climáticas, sob percepção cada vez maior de urgência, também traz efeitos. A PwC estima que uma fatia de 55% do PIB global cerca de US$ 58 trilhões depende altamente ou moderadamente da natureza. Diante disso, 41% dos CEOS afirmam aceitar retorno menor por investimentos pró ambiente, número que cai para 29% no Brasil.
Castro vê isso com certo otimismo, apontando um traço importante, mas ainda modesto, de ampliação de consciência social. “Isso é uma marca também interessante que a gente começa a perceber aí, que vem por de trás dessa intensa agenda ESG”, afirma.
No Brasil, esses dois cenários exercem forças contrárias. Enquanto a disposição global para priorizar os chamados negócios verdes põe as empresas brasileiras em posição vantajosa, o abismo digital e a histórica defasagem educacional podem tornar o cenário desfavorável ao país..
O resultado é a uma necessidade iminente de mudanças mais profundas, ressalta Castro. “O nosso destino pode ser muito trágico se o olhar para educação e para requalificação da mão de obra não for o que a gente precisa no momento.”
LUCIANA COELHO / Folhapress