SÃO JOSÉ DO RIO PRETO, SP (FOLHAPRESS) – O fotojornalista Joel Silva estava em uma floresta colombiana em 2000, cercado de guerrilheiros, quando seu filho nasceu no Brasil. Soube dias depois, quando acessou o seu email. O jornalismo cobrava, ali, um preço.
Ele explica que quis deixar um testemunho para a família, de quem o trabalho às vezes o afastou. “A profissão rouba um pouco da nossa convivência”, diz. “As pessoas não entendem de quanto abrimos mão.”
Silva começou sua carreira nos anos 1990 em Ribeirão Preto, no interior de São Paulo. Trabalhou depois para o extinto Notícias Populares e, em seguida, entrou na Folha, onde ficou até 2018. Segue colaborando com o jornal.
Três grandes coberturas o marcaram. A primeira foi a reportagem na Colômbia, que o impediu de ver o parto do filho. Em 2011, foi à Líbia acompanhar a guerra civil. Em 2013, registrou um massacre no Egito.
Entre tiros e bombardeios, esses trabalhos tinham seus riscos, inerentes à profissão. O mais grave deles foi no Cairo, quando Silva foi atingido de raspão por uma bala. Ficou com uma ferida na testa.
Não são histórias fáceis de contar para a família que, à distância, esperava notícias, com apreensão. “É como o policial e o soldado”, afirma. “O jornalista sofre, e a família sofre também.”
Além de deixar o registro para os filhos–de 19 e 24 anos–, Silva diz que queria explicar para seu público como as notícias são feitas. “As pessoas têm dificuldade de entender que há alguém de corpo e alma ali.”
Ele dá o exemplo da guerra em Gaza, em que dezenas de jornalistas morreram na ofensiva israelense que se seguiu aos ataques terroristas do Hamas de 7 de outubro. “Existe uma pessoa sentindo o grito, a dor, as balas cortando o ar, a bomba no chão.”
Foi a foto de uma bomba, aliás, que mais marcou a carreira de Silva. Ele fez na Líbia o registro de um ataque aéreo das forças do ditador Muammar al-Gaddafi (1942-2011) contra rebeldes. A imagem foi publicada em diversos veículos internacionais.
Há ainda um terceiro objetivo por trás do filme: servir de referência para a nova geração de jornalistas, que tem menos contato com o dia a dia de uma redação, onde Silva afirma que aprendeu seu ofício.
O fotojornalista fez o documentário “na unha”, nas suas palavras. Montou a luz em um canto de casa e gravou seu próprio depoimento. Aprendeu a editar assistindo tutoriais na internet. Pilotou um drone para as imagens aéreas.
Além do testemunho de Silva, “Todas As Guerras Que Eu Vi” inclui vídeos e fotografias produzidos nas coberturas internacionais e entrevistas com profissionais que trabalharam com ele no jornal.
Silva espera vender os direitos do filme para uma plataforma de streaming. Por ora, a visualização é gratuita. Nesse ínterim, o plano é seguir dirigindo seu fusquinha pelo interior do país, à procura de novas histórias para contar.
DIOGO BERCITO / Folhapress