Bilionário judeu ganha projeção após renúncia de reitora de Harvard

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A renúncia da primeira mulher negra a ocupar o posto de reitora da Universidade Harvard provocou debates sobre antissemitismo, racismo e misoginia nos campi dos Estados Unidos. Quase um mês depois, alunos e professores discutem a influência de grandes doadores e o uso da filantropia como instrumento de pressão sobre as instituições de ensino –em especial o papel do bilionário Bill Ackman, 57, na queda de Claudine Gay.

A fritura da ex-reitora foi impulsionada por Ackman, 57, ex-aluno de Harvard e um dos benfeitores mais generosos da instituição. Descendente de judeus e casado com a israelense naturalizada americana Neri Oxman, o empresário ganhou projeção nacional após denunciar uma suposta tolerância da universidade em relação a discursos antissemitas durante a guerra entre Israel e Hamas.

Para Ackman, a intransigência no ambiente acadêmico é resultado de uma ideologia que ganhou força nos últimos anos com as chamadas iniciativas DEI (diversidade, equidade e inclusão). Na visão dele, esse movimento busca intimidar pontos de vista diferentes, o que ajudou a espalhar discursos de ódio anti-Israel e antijudaico.

O empresário faz um paralelo com as políticas corporativas de ESG, sigla em inglês para boas práticas ambientais, sociais e de governança. Nos dois casos, diz Ackman, os movimentos bem-intencionados podem ter “consequências catastróficas”, como, segundo ele, a perda da independência energética da Europa, “um fator que contribuiu para que [Vladimir] Putin tivesse confiança para invadir a Ucrânia”, segundo afirmou ao The Wall Street Journal.

Bacharel em artes e com pós-graduação em administração de empresas, Ackman ganhou prestígio no mercado financeiro ao fazer movimentações ousadas que incluíram apostas na desvalorização de grandes companhias. Ele acumulou uma fortuna estimada de US$ 2,5 bilhões (R$ 12,2 bilhões) a US$ 4 bilhões (R$ 19,6 bilhões), segundo veículos de imprensa americanos. Em 2004, criou a Pershing Square, empresa que administra US$ 18 bilhões (R$ 88,4 bilhões) em ativos.

Parte de seus lucros foi direcionada a Harvard, instituição com a qual sempre manteve proximidade. Ao longo dos anos, Ackman teria doado cerca de US$ 50 milhões (R$ 245 milhões) à universidade, segundo a revista The Economist.

Sempre ativo nas redes sociais, o investidor não costumava opinar em público sobre as políticas universitárias. Mas a posição mudou após manifestações relacionadas ao conflito no Oriente Médio dentro dos campi. Na plataforma X, Ackman escreveu que o apoio de estudantes à facção terrorista Hamas o fez deixar de ser ingênuo em relação às políticas DEI. Foi o início de sua batalha pessoal contra a direção de Harvard, acusada por ele de não proteger os alunos judeus de ataques antissemitas.

A campanha ostensiva pela renúncia de Gay começou após a reitora se recusar a responder “sim” ou “não”, em dezembro, a uma congressista republicana que lhe perguntou se pedir o genocídio de judeus violaria ou não códigos de conduta das universidades. Na ocasião, ela era entrevistada por um comitê que investigava a atuação das instituições após manifestações pró-Palestina gerarem controvérsia –enquanto alguns apontavam antissemitismo, outros as defendiam como liberdade de expressão.

Ackman não ameaçou interromper suas doações a Harvard, mas pressionou por mudanças ao dizer que tinha conhecimento de contribuições que somavam US$ 1 bilhão (R$ 4,9 bilhões) e estariam retidas em função dos atos de antissemitismo desde o começo da guerra.

Gay acabou sucumbindo no início deste mês, após as reações negativas a suas declarações se somarem a acusações de plágio em sua carreira –denúncias também ecoadas por Ackman a seu público de mais de 1,2 milhão de seguidores no X. Sobre a reitora, ele publicou ter ouvido dizer que Harvard, na busca por uma liderança, descartou candidatos que não atendiam aos seus requisitos de diversidade, sugerindo que Gay não era a pessoa mais capacitada para ocupar o posto.

Após a renúncia, Ackman foi elogiado por representantes da comunidade judaica e até pelo magnata Elon Musk. Ao mesmo tempo, o empresário, homem branco, tornou-se alvo de protestos de setores progressistas. O ativismo ainda fez do investidor e sua família alvo de investigações.

Newsletter China, terra do meio Receba no seu email os grandes temas da China explicados e contextualizados *** Dias após a queda de Gay, o site Business Insider divulgou ter encontrado um “padrão semelhante de plágio” ao da ex-reitora em trabalhos de Neri Oxman, a esposa de Ackman e ex-professora do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts, em português).

Oxman disse que havia “omitido aspas” em alguns trabalhos e se prontificou a corrigir as informações. Já Ackman teria ficado furioso com a reportagem e partiu para o contra-ataque. Ele prometeu investir em ferramentas da inteligência artificial para vasculhar cada artigo do Business Insider em busca de plágio. Ainda ameaçou fazer o mesmo com tudo o que fosse publicado pela diretoria e pelo corpo docente do MIT, de onde ele suspeita que teriam partido as acusações contra a esposa.

Ackman ganhou evidência na disputa com o establishment acadêmico dos EUA sobre plágio e o futuro do ensino superior. As disputas contra Harvard e o Business Insider ainda tornaram o investidor referência entre manifestantes conservadores que dizem combater a cultura “woke”, termo jocoso para bandeiras de diversidade.

A influência de doadores sobre as políticas universitárias voltou ao centro das atenções na sexta (26), quando Mark Zuckerberg, CEO da Meta, organizou um evento virtual em apoio a Sam Lessin, investidor do Vale do Silício que está concorrendo a uma vaga no conselho de supervisores de Harvard, órgão administrativo formado por ex-alunos que aconselha a liderança da instituição.

Assim como Zuckerberg, Ackman propôs sua lista de candidatos para o conselho de supervisores –o investidor defende, por exemplo, que os diretores das faculdades sejam recrutados do mundo dos negócios. Representantes acadêmicos, entretanto, alertam que o engajamento dos empresários no ambiente de ensino ameaça a independência das instituições.

Quase quatro meses após a eclosão da guerra entre Israel e Hamas, o investidor se mantém firme na defesa de Tel Aviv, seja nas universidades ou no mundo dos negócios. Na semana passada, anunciou a compra de uma participação de quase 5% na Bolsa de Valores israelense. Foi o primeiro investimento de Ackman em Israel desde o início da guerra, e a transação teria atraído o interesse de investidores de vários países. À Bloomberg o executivo disse que trabalha apenas para “consertar o que está errado”.

RENAN MARRA / Folhapress

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