RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – Numa praça, às 9h desta uma quinta-feira (8) quente, um grupo de 20 agentes de vigilância em saúde do município do Rio definiam a rota do dia em busca de focos do mosquito Aedes aegypti em Madureira, no subúrbio da cidade.
A região é uma das mais afetadas pela epidemia de dengue que atinge a capital fluminense, com mais de 520 casos desde janeiro.
Em poucos passos, a equipe se depara com mais de 20 pneus empilhados numa calçada com lixo. A água parada ali abrigava larvas há pelo menos quatro dias, segundo os técnicos.
No portão de casa, Sid Ferreira, 55, encarava os pneus jogados na calçada à frente de sua residência onde mora com a mulher, o filho, a nora e três crianças. No mesmo quintal, há uma idosa de 94 anos e outro de 65.
“Eu fico aqui preocupado não só com a minha família, mas também com meus vizinhos que são na maioria crianças e idosos. A prevenção é primordial. A gente tinha que tratar o problema antes, mas aí olha o que fazem”, disse, apontando para a pilha de pneus.
Nas vistorias, os agentes de saúde verificam possíveis focos de mosquito em imóveis e terrenos, tratam e orientam os moradores para eliminar itens que possam acumular água, como vasilhas e garrafas expostas à chuva, e observam se há entupimento de ralos e calhas. A população pode fazer pedidos de vistoria ou denunciar possíveis focos pela central de atendimento 1746.
Na mesma manhã, um novo polo dedicado a pessoas com dengue era inaugurado na Clínica da Família do bairro. A sexta de dez unidades abertas pelo município em regiões mapeadas com maior incidência de casos, como as zonas oeste e norte, além do centro.
Foi observado ainda um aumento no número de diagnósticos em bairros atingidos pelas enchentes causadas pelas chuvas de janeiro, como Acari, Jardim América e Fazenda Botafogo.
Com dores no corpo e na cabeça, além de manchas vermelhas pelo corpo, são sintomas que a Monique Nunes, 28, já conhece. É a terceira vez que ela é diagnosticada com dengue. Moradora do bairro vizinho, em Vila Valqueire, ela foi atendida no polo de Madureira.
“Nas outras vezes eu me senti ainda pior em relação como estou agora. Mas estou no terceiro dia de sintomas e, pela minha experiência, pode piorar. Então, eu vim logo buscar atendimento porque é muito ruim. Eu tenho que cuidar da minha filha pequena e mãe não pode ficar doente, sabe como é”, disse, com a criança no colo.
Em estado de emergência por causa da propagação do vírus, a cidade registrou a primeira morte causada por dengue nesta semana. Trata-se de um homem de 45 anos do Complexo da Maré, também na zona norte. A secretaria municipal de Saúde investiga outros três casos. Já a Secretaria estadual de Saúde investiga se 21 mortes aconteceram em consequência da dengue.
Desde janeiro deste ano, já são 14.906 caso no Rio, mais da metade de todo o período de 2023 que teve 22.866 casos e seis mortes.
O número de internações por causa da doença também disparou e bateu recorde com 362 pessoas hospitalizaras, é o maior registro da série histórica iniciada em 1974.
O secretário municipal de Saúde, Daniel Soranz alerta para uma piora no cenário da dengue na capital. “A tendência é que a situação piore. Os meses em que a gente costuma ter mais casos são abril e maio. Está crescendo e isso não só no Rio, mas em todo o Brasil”, afirmou.
“Minhas plaquetas foram a 49.000, quase me internaram. Mas eu tinha uma taxa de leucocitoss em um nível que me permitiu fazer o repouso em casa com o compromisso de voltar no dia seguinte para fazer o acompanhamento das plaquetas”, relatou a jornalista Marcelle Felix, 28.
Ela conta que insistiu com o médico para fazer o tratamento dessa forma por causa de sua bebê de seis meses, que depende de seus cuidados e principalmente da amamentação ainda exclusiva.
“Por isso tive que ir todos os dias na emergência fazer exame de sangue e tomar soro para reidratar. E em casa, repouso absoluto e alimentação forte em legumes e frutas”, disse Marcelle.
Há 10 dias do início dos sintomas, a jornalista afirma ainda sentir fraqueza e dor de cabeça e nos olhos. Ela também teve febre e dor no corpo.
“Minha irmã teve dengue hemorrágica há 15 anos, e foi muito difícil. Na minha casa a gente sempre cuida para não precisar passar por isso de novo, mas acabei pegando, porque é uma doença que só se cuida coletivamente, né?” observou Marcelle, que agora diz estar ainda mais preocupada com a filha.
Para prevenir, além dos cuidados para evitar água parada em casa, ela disse que faz uso de inseticida aerossol contra mosquitos, e repelente.
O vice-presidente da Ascoferj (Associação do Comércio Farmacêutico do Estado do Rio), Ricardo Valdetaro disse que as farmácias da cidade já tiveram aumento na procura por repelentes .
Em uma farmácia que ele administra, na zona sul do Rio, por exemplo, a venda do produto cresceu em 85% no mês de janeiro em comparação com o ano passado. “Em 2023, foram vendidos a média de um repelente por mês. E somente em janeiro deste ano, foram 18 unidades”, disse Valdetaro.
Ainda segundo o farmacêutico, a procura maior está nos repelentes adultos e infantis que contenham icaridina, um princípio ativo para repelentes mais indicado pela OMS (Organização Mundial da Saúde), permitidas para gestantes e crianças a partir de 2 anos.
O vice-presidente da Ascoferj diz ainda que a procura de testes rápidos para dengue também se iniciou.
“A gente nunca tinha feito teste de dengue nessa farmácia e apenas uma semana foram feitos 10. Acabou meu estoque e eu solicitei mais 50 unidades, mas acredito que vai acabar rápido porque está tendo muita procura”, disse
Ele também afirmou que já recebeu interessados em comprar a vacina contra dengue. A Qdenga, fabricada pela farmacêutica Takeda, foi incorporada ao SUS (Sistema Único de Saúde) e deve começar a ser aplicada ainda neste mês de fevereiro. Ela já está disponível em laboratórios particulares a um preço médio de R$ 450 por dose.
A aprovação do imunizante foi recebida pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) em março de 2023 para pessoas de 4 a 60 anos. Ele é aplicado via subcutânea, em duas doses, com intervalo de três meses.
ALÉXIA SOUSA / Folhapress