SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um dia depois de a Arezzo e o Grupo Soma confirmarem a fusão das empresas, a Natura &Co, que fez um forte movimento de expansão e globalização há anos, anunciou que avalia separar as marcas Natura e Avon e criar duas companhias independentes.
A notícia veio na mesma esteira das vendas pela empresa das companhias britânica The Body Shop e da australiana Aesop.
Apesar de o mercado ter respondido com alta nas ações à primeira notícia de fusão de Arezzo e Soma, depois os papéis de ambas companhias devolveram boa parte dos ganhos. Embora tenham visto sentido no anúncio e um possível ganho de sinergias entre as empresas, analistas ainda têm dúvida quanto à execução da transação.
O analista José Eduardo Daronco, da Suno Research, diz que é natural que se questione o sucesso da operação, uma vez que a maioria das fusões e aquisições no mundo fracassa em algum momento.
Segundo o especialista, o processo de integração de companhias com culturas diferentes é sempre complicado e desafiador. “Empresas são feitas de pessoas, então, a cultura organizacional impacta muito o processo”, diz Daronco.
Os desafios na integração dos negócios também foram levantados como ponto de atenção por analistas do BTG Pactual em relatório recente sobre a fusão. “[É] uma grande transação, com riscos de execução”, dizem os analistas Luiz Guanais, Gabriel Disselli e Pedro Lima, do BTG.
“Apesar de ser um negócio complexo que cria um player gigante com múltiplas marcas (e diferentes culturas) nos segmentos de vestuário/calçados, sem contar os riscos de execução no processo de integração, poderia permitir a captura de sinergias em distribuição, produto, desenvolvimento, operações de franquia e produção”, concluem.
Daronco chama atenção para o fato de que, no início, os cálculos de sinergia são meras previsões, e quase nunca elas se concretizam, já que há outros fatores além dos números. Ele cita como exemplo a fusão das operadoras de saúde Hapvida e Intermédica em 2021.
Na época, havia muitas chances de ganhos, com a ampliação da área de atuação de ambas por meio da complementaridade geográfica e a consequente criação de uma gigante da saúde suplementar, forte aumento da base de clientes, economia de custos e otimização de despesas. Além disso, as naturezas dos negócios já eram bem similares.
Mas a combinação dos negócios previu que ela teria dois presidentes, Jorge Pinheiro, CEO da Hapvida, e Irlau Machado Filho, que era CEO da Intermédica.
Esse modelo, segundo Daronco, mostrou-se malsucedido mais tarde o que impactou os resultados financeiros da companhia, com números desastrosos, diz o especialista.
No caso da Arezzo e da Soma, Daronco vê como positivo o fato de as empresas terem optado por um modelo de fusão em que ambas as empresas integralizam apenas uma parte da gestão mas seguem sendo empresas independentes, o que garante a criação de estratégias para cada marca.
O especialista lembra que, especificamente no varejo de moda, cada marca tem um público diferente, com comportamentos e interesses distintos, e preservar isso é importante.
Esse é, inclusive, o caminho estudado pela Natura &Co, com a possível separação das marcas Natura e Avon.
HERING PREOCUPA
Outro ponto de atenção para alguns analistas é a Hering, do Grupo Soma. No geral, há uma percepção de complementaridade das marcas da Arezzo&Co, dona da Arezzo, Schultz e Alexandre Birman, e do Grupo Soma, que é detentora da Farm e da Animale.
Ambas as empresas são voltadas prioritariamente para o público de alta renda, que é resiliente a momentos macroeconômicos mais desafiadores, de inflação, juros e inadimplência altos, como o que o Brasil e o mundo passam neste momento. Além disso, o tíquete médio dos produtos dessas marcas é maior.
“Arezzo e Soma têm uma complementaridade de produtos. Eu vejo como positiva a fusão, porque tem sinergia entre as empresas para destravar e há um cross-seling entre as marcas”, diz Gabriel Costa, da Toro Investimentos, referindo-se à similaridade do público de ambas as empresas.
Mas a Hering é um ponto fora da curva para o analista Phill Soares, da Órama Investimentos. A marca, que é responsável por quase 40% da receita do Grupo Soma, compete com Renner, Riachuelo e C&A.
Na visão do analista, a Hering enfrentará uma competitividade maior quando essas empresas desafogarem com a queda dos juros no país.
O especialista cita ainda o fato de o endividamento do Grupo Soma ter piorado depois da aquisição da Hering, em 2021.
“A Arezzo e o Grupo Soma estão em momentos diferentes, o que coloca em dúvida a fusão. Enquanto a gente vê a Arezzo sólida, a lucratividade da Hering não foi 100% bem-sucedida após o turnaround da empresa”, diz Soares.
A gestora recomenda a compra da ação da Arezzo, mas agora está revendo a posição. “A Arezzo era nossa maior aposta no varejo ao lado da Vivara, e agora estamos revisando isso”, afirmou.
STÉFANIE RIGAMONTI / Folhapress