SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Larry David, 76, não fez discurso após gravar a cena final de “Segura a Onda” (ou “Curb Your Enthusiasm”, no original), que está em sua 12ª temporada e no ar –entre idas e vindas– há 24 anos na HBO. “Não, eu não disse nada. Outras pessoas falaram, mas eu não”, conta.
“Foi [emocionante] para muitas pessoas, mas não para mim”, descreve o comediante e roteirista, lembrando a versão exagerada (e ranzinza) de si próprio que vive na série, em entrevista conduzida ainda no set pela equipe do estúdio e cedida ao F5. “Obviamente, há algo errado comigo.”
Apesar de dizer que não sentiu “nada fora do comum” quando a gravação acabou, David confessa que não imaginou que passaria tanto tempo de sua vida dedicado à produção. “Quando o programa foi escolhido para ter a primeira temporada, meu agente disse: ‘Ei, você pode fazer dez temporadas disso’. Eu respondi: ‘Você está louco? Dez temporadas?! Você está maluco?’. E, agora, aqui estamos, 12 temporadas depois.”
Na atual leva de episódios, que começou a ser exibida em 4 de fevereiro e está programada para terminar no dia 7 de abril, o Larry David da ficção –um autor e produtor de TV que ficou rico após emplacar uma série de sucesso (assim como o da vida real, conhecido como cocriador de “Seinfeld”)– está lutando por justiça, após ser preso por uma banalidade. Os novos episódios vão ao ar todos os domingos, à meia-noite.
Nos próximos episódios, o personagem volta ao clube de golfe que já rendeu cenas hilárias em anos anteriores. E, para quem ficou curioso se o ator de fato é bom no esporte, ele confessa: “Não, sou muito medíocre, assim como sou na maioria das coisas”. “E não estou sendo modesto”, completa. “É muito difícil. E é ruim para o casamento.”
Também estarão de volta personagens que orbitam o protagonista, como a conselheira municipal Irma Kostroski, vivida por Tracey Ullman (“ela é brilhante, trabalhar com ela tem sido um dos destaques da série para mim”, elogia David), e o amigo Richard Lewis, vivido pelo ator homônimo (“somos tão próximos e nos conhecemos há tanto tempo, é o tipo de amizade em que você pode dizer qualquer coisa e não se preocupar em magoar os sentimentos da pessoa”, detalha).
Nem sempre (para não dizer quase nunca) politicamente correta, a série parece ter conseguido se safar da patrulha moral e do tribunal das redes sociais, mesmo sem deixar de abordar assuntos sensíveis de forma potencialmente polêmica –como racismo, gordofobia ou capacitismo. É que, para David, a discussão sobre os limites do humor parece inócua. “Quando você vê algo engraçado, esquece como deve pensar”, avalia.
Ele também conta como a forma de escrever os roteiros mudou ao longo dos anos. “Segura a Onda” é famosa justamente por ser baseada em improviso, mas ele explica que faz um esboço, que foi ficando cada vez maior com o tempo. “Tem diálogos no rascunho que criamos e que achamos que devemos dizer em algum momento”, revela. “Em cada cena, também temos que fazer a história avançar. Então, há muitos pontos que precisam ser abordados. E o elenco é muito bom nisso.”
Porém, nem sempre tudo está sob controle. “Para dizer a verdade, muitas vezes estou na maquiagem e nem sei o que vamos filmar. Aí eu peço a alguém: ‘Posso ler um esboço? O que estamos fazendo?’.” Para ele, essa é a maior graça do projeto. “Isso torna mais espontâneo e mais divertido tentar inventar na hora”, conta.
David diz não se lembrar em que momento decidiu que esta seria a última temporada da série, mas afirma que, diferente do que ocorreu em ocasiões anteriores, não vai mudar de ideia. “Estamos nisso há muito tempo. Estou ficando velho, assim como o elenco, e a natureza tem uma maneira de nos dizer para parar”, afirma.
Apesar de não costumar assistir a episódios antigos (“eu já os vi inúmeras vezes durante a edição, então seria estranho, precisaria ter um ego fora de controle”), ele elege alguns de seus episódios favoritos (confira abaixo). Ele só prefere não elencar os convidados de que mais gostou dentre tantos que passaram pelo programa –de Alanis Morissette a Salman Rushdie, passando por Martin Scorsese, Mel Brooks, Ben Stiller, Dustin Hoffman, Melissa McCarthy, Sean Penn, Seth Rogen e um longo etc. “É para não fazer outras pessoas se sentirem mal; veja, eu sou um cara sensível!”, brinca.
Após tanto tempo no projeto, Larry David ainda não tem planos para o futuro. “Eu realmente não sei o que vou fazer, honestamente”, diz. “Eu tenho um escritório e não posso desperdiçá-lo. Como eu disse a alguém, quando estava na faculdade e as pessoas me perguntavam o que eu ia fazer quando saísse: ‘Algo vai aparecer’. É assim que me sinto agora.”
OS EPISÓDIOS FAVORITOS DE LARRY DAVID
“Palestinian Chicken”
Larry vira o “assassino social” supremo em um jantar, no campo de golfe e em um restaurante palestino que serve um frango fenomenal.
“The Doll”
A presença de Larry em uma exibição resulta em caos; uma porta de banheiro inacessível causa problemas.
“The Ski Lift”
Na busca de Larry para conseguir um rim para Richard Lewis, ele se aproxima do chefe de um consórcio de rins, que é ortodoxo judeu. Além disso, Larry suspeita que a enfermeira de Lewis tem uma maneira perturbadora de esconder itens roubados.
“The Ugly Section”
Larry tenta se aproveitar da morte inesperada de um amigo, questiona um padrão de discriminação em um restaurante da moda e oferece um emprego ao filho de seu dermatologista; Richard tem um dia suspeitosamente bom no campo de golfe.
“Mister Softee”
Um caminhão de sorvete desencadeia uma dolorosa lembrança de infância em Larry, o que afeta uma partida de título de softbol, as taxas de um terapeuta, o legado de Bill Buckner e as preferências de viagem de sua nova namorada.
VITOR MORENO / Folhapress