Cidades com prefeitos do agro não desmataram mais que outras e geraram mais negócios, diz estudo

Prefeitos do Agro não desmataram mais do que os outros
Foto: Divulgação

Municípios da Amazônia Legal com prefeitos que vieram do agronegócio não desmataram mais do que cidades administradas por líderes que não tinham ligação com o setor, segundo estudo feito por pesquisadores da FGV (Fundação Getulio Vargas) e da Wharton School, nos Estados Unidos.

Os pesquisadores concluíram que gestores do agro seguiram a tendência nacional de redução do desmatamento no período analisado. Além disso, os municípios administrados por eles viram um surgimento mais expressivo de novos negócios.

“A hipótese inicial era que um político com raízes no campo poderia estar gerando uma ação ambiental maléfica, mas os resultados apontam o contrário. Houve desmatamento, mas ele não foi maior do que no município em que o candidato do agro perdeu”, diz Gustavo Cordeiro, um dos autores.

O trabalho é assinado por Cordeiro, Paulo Arvate e Joana Story, da FGV, e Leandro Pongeluppe, da Wharton School. O material considera os mandatos iniciados após três eleições municipais: 2004, 2008 e 2012.

Segundo o estudo, o desmatamento médio nos municípios em que prefeitos do agro foram eleitos foi de 42,11 km² nos quatro anos posteriores à eleição. Já a média para os municípios com prefeitos vindos de outros setores foi de 48,95 km².

Por causa do desvio-padrão calculado para a amostra, não se pode inferir que esses valores sejam estatisticamente distintos —na prática, líderes do agro e de fora dele apresentaram desmatamentos similares após as eleições, segundo os pesquisadores.

Para chegar a esses resultados, foram compilados dados do programa Prodes, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), da Rais (Relação Anual de Informações Sociais) e do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

O levantamento inclui os mais de 700 municípios da Amazônia Legal. No estudo, eles compararam cidades semelhantes.

Usando um método econométrico chamado de “regressão descontínua”, inicialmente, eles consideraram 2.280 exemplos de eleições municipais apertadas. A amostra foi, então, reduzida para cerca de 400 casos em que o candidato do agro venceu a disputa ou foi o segundo colocado.

Segundo Arvate, o objetivo era demonstrar o peso que a origem do prefeito poderia ter em seu desempenho —na comparação, outras questões, como gênero do eleito, emprego e desemprego ou taxa de vacinação eram estatisticamente idênticas entre os municípios.

Eles também testaram essa mesma comparação com outras oito profissões, como médico ou advogado, e não notaram uma diferença nos resultados.

Para classificar um político como originário do setor, eles usaram as respostas dadas pelos candidatos ao TSE, considerando os que se disseram pecuaristas ou proprietários do agronegócio.

Para checar o vínculo dos políticos que são do agro com o setor, os pesquisadores verificaram se eles eram proprietários de um número significativo de cabeças de gado ou de propriedades rurais, por exemplo.

Os dados eleitorais não permitem, no entanto, separar os eleitos que não têm origem declarada no agro, mas são apoiado pelo setor.

O trabalho teve início em 2019 e não considera os dados dos municípios após o início do governo de Jair Bolsonaro (PL), que ficou marcado pelo esvaziamento das políticas de preservação ambiental e por falas do próprio ex-presidente questionando o desmatamento.

“O período que estamos avaliando foi de redução do desmatamento no país. Com o governo Bolsonaro, pode ser que tenha começado a subir. Pelo que observamos, a chave foi o monitoramento. Nessas condições, o prefeito do agro não vai desmatar mais ou menos do que outra liderança local”, diz Arvate.

Ao conquistar seu terceiro mandato, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) colocou a questão da preservação ambiental novamente no radar, inclusive reconduzindo para a pasta do Meio Ambiente a ministra Marina Silva (Rede).

No atual governo, depois de quatro anos consecutivos de taxas elevadas, o desmatamento anual na Amazônia ficou abaixo de 10 mil km². De agosto de 2022 a julho de 2023, foram perdidos 9.001 km² de floresta, uma redução de 22,3% na comparação com o período anterior.

Os autores do estudo ressaltam que os registros do Prodes, que serviram de base para o estudo, vêm de imagens de satélites e mostram a variação de um ano para o outro, sem diferenciar o que é desmatamento ilegal.

“Em momento algum falamos que não existe desmatamento. Em 2004, houve um pico, que passou a cair nacionalmente. Nós apontamos que as medidas institucionais nortearam o comportamento local, e a postura dessa liderança local não foi diferente”, afirma Cordeiro.

Os pesquisadores reforçam que os líderes que atuam em regiões ecologicamente sensíveis podem e devem utilizar ferramentas de gestão, como políticas locais de investimentos, para conciliar o crescimento econômico com a preservação ambiental.

Nesse ponto, o estudo ressalta que os prefeitos com origem no agronegócio se destacaram na performance econômica, com a criação de novas empresas nos municípios.

Os resultados sugerem a utilização de aportes diretos em incentivos agrícolas e investimentos em habitação e urbanismo, para promover maior desenvolvimento econômico.

Em exemplos que eles analisaram no período, isso se deu por diferentes medidas —da construção de mercados públicos para a venda de produtos locais à compra de sementes para distribuição entre os produtores; da obtenção de tratores para uso coletivo à aquisição de caminhões e barcos que ajudaram no escoamento da produção.

Entre as empresas que foram abertas nos municípios, o destaque é para a criação de CNPJs ligados ao setor de serviços. Cidades com prefeitos do agro tiveram criação de dez empresas a mais por ano do que municípios governados por líderes de outras profissões.

O efeito é intensificado em localidades que vivem da soja, onde a diferença entre a média de empresas criadas por líderes que vieram do agro e aqueles de outras áreas é de 40 empresas a mais por ano, sendo 90% do setor de serviços.

Os pesquisadores consideram a abertura de empresas de diferentes tamanhos. Como os municípios analisados têm, em média, 20 mil habitantes, a maior parte delas é de pequeno porte.

“Aconteceu uma dinamização naqueles municípios, medidas aparentemente simples, como criar vias de acesso a um determinado local, geraram uma demanda. Essas empresas acabaram crescendo e se formalizando, contrataram funcionários e ajudaram a dinamizar a economia local”, conclui Cordeiro.

DOUGLAS GAVRAS / Folhapress

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