BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) avalia a possibilidade de expulsar o embaixador israelense Daniel Zonshine, o que representaria uma medida diplomática drástica, dependendo do próximo passo de Israel na escalada da crise.
A medida vem sendo tratada pela equipe da área internacional do governo como uma “carta na manga”, que pode ser usada dependendo do próximo passo de Tel Aviv. Interlocutores, contudo, afirmam que a situação atual da crise ainda não exige tal medida.
A expulsão do embaixador israelense chegou a ser discutida em reunião na segunda-feira (19) no Palácio da Alvorada, entre Lula, o ministro Paulo Pimenta (Secom) e o assessor internacional da Presidência para assuntos internacionais, Celso Amorim.
No entanto, interlocutores do governo afirmam que o Brasil não pretende escalar a crise. E acrescentam que a intenção de não elevar o nível de tensão já foi inclusive transmitida ao governo israelense.
Por outro lado, um interlocutor no Ministério das Relações Exteriores ponderou que a situação “não depende de um lado só” e afirmou que “em uma crise nada se descarta”, embora não seja a intenção do governo brasileiro tomar uma medida no sentido de uma ruptura de relações.
Em uma aparente tentativa de diminuir a temperatura das relações, Zonshine disse que tanto as autoridades do Brasil quanto as de Israel precisam ” “escolher as palavras com mais cautela”. Em entrevista a Thais Bilenky, colunista do UOL, o embaixador também afirmou que a fala de Lula foi problemática, mas não pode inviabilizar a relação entre os dois países.
Não quis comentar, porém, a quebra de protocolo da diplomacia israelense ao repreender publicamente o embaixador brasileiro e esquivou-se ao ser questionado sobre a publicação feita por uma página da chancelaria chamando Lula de “negacionista do Holocausto”. “Não fui eu que coloquei isso lá”, afirmou Zonshine.
Brasil e Israel vêm intercalando medidas diplomáticas, em um nível crescente de tensão, desde a fala polêmica de Lula no domingo (18), no qual comparou as ações israelenses na Faixa de Gaza ao Holocausto.
“Sabe, o que está acontecendo na Faixa de Gaza com o povo palestino, não existe em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu quando Hitler resolveu matar os judeus”, afirmou Lula na Etiópia.
Um dia após a fala de Lula, Israel convocou o embaixador brasileiro em Tel Aviv, Frederico Meyer, para esclarecimentos. Ao contrário do que seria a praxe diplomática, uma reunião a portas fechadas, o diplomata brasileiro foi chamado ao Memorial do Holocausto para uma espécie de tour guiado com a presença da imprensa.
Além disso, em seguimento às reprimendas ao presidente brasileiro, o Ministério das Relações Exteriores do governo de Binyamin Netanyahu declarou o líder brasileiro “persona non grata” na segunda-feira (19).
“Não esqueceremos nem perdoaremos”, disse o chanceler Israel Katz. Em mensagem ao embaixador do Brasil no país, seguiu: “Em meu nome e em nome dos cidadãos de Israel, diga ao presidente Lula que ele é persona non grata em Israel até que retire o que disse.”
Lula e seus auxiliares, no entanto, afirmaram desde o início que não haveria retratação. O chanceler brasileiro, Mauro Vieira, afirmou na terça-feira (20) que as reações do governo israelense são inaceitáveis, mentirosas e cortina de fumaça para os ataques de Tel Aviv no território palestino.
“As manifestações do titular da chancelaria do governo [de Binyamin] Netanyahu são inaceitáveis na forma e mentirosas no conteúdo”, afirmou Vieira na saída da Marina da Glória, no Rio de Janeiro, local de reuniões do G20.
Vieira também convocou o embaixador Zonshine para uma conversa, no Rio de Janeiro. Além disso, o governo brasileiro chamou para consultas o seu embaixador em Israel. A medida é tomada quando um país quer explicitar contrariedade com os atos de outra nação. É um sinal de agravamento da crise, mas não é, ainda, um rompimento de relações diplomáticas.
RENATO MACHADO E MARIANNA HOLANDA / Folhapress