FOLHAPRESS – Enquanto para os milhões de assinantes da Netflix o cenário de “Avatar: O Último Mestre do Ar” pode ser uma novidade, uma legião de fãs há anos imersa em cada detalhe desse universo aguarda a adaptação da cultuada série da Nickelodeon em live-action.
É a segunda vez que Hollywood tenta levar às telas com atores de carne e osso a história de Aang, o único ser capaz de manipular os quatro elementos naturais água, terra, ar e fogo e se conectar com o mundo espiritual para manter o equilíbrio do mundo.
A série consegue capturar a essência que transformou o desenho em um fenômeno cultural. E isso pouco tem a ver com cenas de ação, bons efeitos visuais ou figurinos críveis, mas com a preocupação e o respeito com a trajetória dos personagens, o que sempre foi a força motriz da história.
Na série, o showrunner Albert Kim empreende o tempo necessário para estabelecer a jornada de cada personagem, mesmo quando isso parece impossível, tendo em vista o tempo limitado que oito episódios oferecem.
Logo no primeiro capítulo, o mais longo, conhecemos todo o contexto que levou Aang a encontrar seus companheiros, os irmãos Sokka e Katara, cem anos após seu aprisionamento em um iceberg. Enquanto no desenho isso só é mostrado mais tarde, por meio de flashbacks curtos, a série dedica tempo à construção de uma base sólida para os protagonistas.
Do lado dos antagonistas, temos Zuko, o príncipe exilado da Nação do Fogo, cuja trajetória é uma das mais complexas da televisão americana. Ele também é beneficiado por essa adaptação, que não apenas aprofunda sua história, mas a enriquece com a apresentação de sua família, com quem ele tem um forte contraste.
Adaptar mais de 20 episódios originalmente estruturados no formato semanal para uma narrativa coesa e intrincada não é uma tarefa fácil, mas os roteirista conseguiram combinar histórias completamente diferentes em uma só trama sem soar apressados ou desconexos. Surpreende a forma como enredos de temporadas futuras são conectados a esta primeira leva de episódios de forma orgânica.
Também é notável o esforço dos atores em dar vida aos personagens. Gordon Cormier como Aang e Ian Ousley no papel de Sokka se destacam com uma mistura de carisma e profundidade, e Daniel Dae Kim, veterano de séries como “Lost” e “Hawaii Five-O”, causa calafrios, apesar da paisagem sempre em chamas do palácio do Senhor do Fogo.
Mas a dedicação do elenco não é suficiente para acreditarmos na veracidade deste universo, por culpa dos idealizadores do projeto, que apostam em uma representação visual mais literal dos personagens e de suas caracterizações. Embora bem-intencionada, a caracterização mais se parece com fantasias do que com vestimentas e cabelos que seriam usados em um mundo real.
Os visuais de Jato, por exemplo, são terríveis, bem como a das amigas de Azula, Mai e Tai Lee. O figurino de Aang tem o aspecto contraditório de que acabou de sair de um guarda-roupa bem arrumado.
Ao mesmo tempo, a direção da série, embora competente, por vezes deixa a desejar. Há uma tendência pela simplicidade que não entrega o ar épico que algumas cenas deveriam ter, como a luta de Katara e Pakku ou a fuga de Aang e do Espírito Azul.
Além disso, o posicionamento dos atores em determinadas sequências e sua interação com o ambiente às vezes parecem artificiais. É mais um reflexo da direção, que, se fosse mais inventiva e audaciosa, poderia ter elevado diversos momentos e os tornado tão memoráveis quanto os da série animada.
Esses deslizes, no entanto, não são suficientes para ofuscar “Avatar: O Último Mestre do Ar”, que representa um grande passo na evolução das adaptações em live-action de animação aclamadas.
Com um pé na reverência ao material original e outro na tentativa de dar um novo ponto de vista para uma história tão querida, a produção chega para reafirmar a relevância duradoura da história de Aang e sua busca por esperança em um mundo fragmentado.
AVATAR: O ÚLTIMO MESTRE DO AR
– Avaliação Muito bom
– Onde Disponível na Netflix
– Elenco Gordon Cormier, Kiawentiio e Ian Ousley
– Produção Estados Unidos, 2024
– Criação Albert Kim
EVANDRO LIRA / Folhapress