Conheça o Chega, partido de ultradireita que virou 3ª maior força de Portugal

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Por muitos anos, Portugal pareceu estar imune ao fenômeno da ascensão da ultradireita observado em seus vizinhos na Europa e no resto do globo –nas eleições de 2022, por exemplo, contrariando as pesquisas de intenção de voto da reta final da campanha, os socialistas conquistaram maioria absoluta no Legislativo.

As eleições deste ano puseram fim a essa impressão, com legendas da direita somando 60% dos assentos parlamentares.

O maior responsável por esse movimento é o partido ultradireitista Chega. Criado em 2019, ele vinha ganhando cada vez mais projeção. Até que, este ano, tornou-se a terceira maior força do Congresso luso, rompendo a alternância de poder entre a esquerda e a direita moderadas que vigorava no país desde que este virou uma democracia, em 1974.

Saiba o que a sigla defende e conheça a sua história abaixo.

Quando e por quem o Chega foi criado, e como ele tem se saído nas eleições?

A grande figura por trás do partido é André Ventura, um comentarista esportivo que em determinado momento da carreira ganhou popularidade discutindo segurança pública na televisão.

Sua entrada oficial na política ocorreu em 2017, quando ele foi eleito vereador na Câmara Municipal de Loures, na região metropolitana de Lisboa, pelo centro-direitista PSD (Partido Social Democrata).

Na época, suas declarações associando a comunidade cigana ao recebimento indevido de benefícios e afirmando que havia “excessiva tolerância com alguns grupos e minorias étnicas” ganharam projeção nacional. Quando o PSD começou a parecer pequeno para os seus planos, ele fundou o Chega, em 2019.

Em maio daquele ano, Ventura concorreu ao Parlamento Europeu, mas não foi eleito. Então, em outubro, tornou-se o primeiro (e único) representante da sigla que fundou no Legislativo.

Em 2022, esse número cresceu consideravelmente: 12 deputados do Chega foram eleitos, o que representava 5% dos assentos do Parlamento. Essa porcentagem subiu para 21,7% na votação deste ano, quando o Chega conquistou 50 do total de 230 vagas legislativas.

Isso a princípio faria a legenda se tornar uma peça-chave para a definição do próximo governo, já que a coligação que liderou a votação, AD (Aliança Democrática), de partidos da direita tradicional, não conseguiu maioria: obteve 80 cadeiras, ou 34,7% do Parlamento.

Mas o líder da AD e presidente do PSD, Luís Montenegro, já disse que pretende cumprir a promessa que havia feito durante a campanha eleitoral de não incluir a ultradireita no governo.

Para pressioná-lo, Ventura disse que recusar-se a negociar equivaleria a “humilhar o Chega” e levaria o partido a impedir a aprovação do Orçamento –mesmo impasse que levou à convocação das eleições antecipadas de 2022.

De todo modo, um novo pleito só pode ser organizado a partir de novembro, uma vez que a lei portuguesa exige um intervalo de pelo menos seis meses em relação às eleições anteriores.

O que o Chega defende?

Liberalismo econômico

Defende o Estado mínimo e uma reforma radical do sistema tributário luso

Política linha-dura de segurança pública

Defende a reintrodução da pena de prisão perpétua para crimes graves, apesar de a Constituição portuguesa proibi-la

Propõe redefinir as penas para os crimes de homicídio, terrorismo, corrupção e violação e abuso sexual de menores; para os culpados por este último, defende a castração química temporária

Nacionalismo e resgate de valores tradicionais

Exalta a memória portuguesa e opõe-se à visão de movimentos decoloniais que pedem, por exemplo, a repatriação de bens tomados pelos portugueses no passado

Combate o que chama ensino da “ideologia de gênero”, termo pejorativo usado pelos que se opõem ao debate sobre diversidade sexual e identidade de gênero

Qual é a posição do Chega em relação à imigração?

O manifesto do partido se posiciona “contra a imigração ilegal” e a favor “do fortalecimento do controle das fronteiras” ao mesmo tempo em que rejeita o racismo e a xenofobia e se compromete a promover laços entre comunidades lusófonas.

Alguns aspectos do programa da sigla para as eleições legislativas de 2024 contradizem, entretanto, esses princípios. O texto defende, por exemplo, revogar o acordo de mobilidade entre os países da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa). A medida extinguiria a autorização de residência automática a membros dessa comunidade, o que em 2023 legalizou a situação de 100 mil residentes.

O programa ainda sugere, entre outros pontos, criminalizar a residência ilegal em solo português, impedindo aqueles encontrados nessa situação de regressarem ao país por um período de cinco anos; e reconduzir imigrantes que não demonstrarem capacidade de se sustentar após de seis a 12 meses na nação europeia ao seus respectivos países de origem.

O que o Chega defende em relação à imigração de brasileiros?

A despeito dessa agenda anti-imigração, muitos brasileiros que residem em Portugal se identificam com o Chega. Um deles, o professor de artes marciais carioca Marcus Santos, 45, elegeu-se deputado pelo partido, representando a região do Porto.

A legenda não deixa de fomentar a relação, acenando sobretudo para a parcela antipetista da comunidade. Não à toa, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciou que visitaria Portugal em abril, Ventura disse que, se eleito primeiro-ministro, proibiria a sua a entrada no país europeu.

Também não é coincidência que Jair Bolsonaro (PL) tenha gravado um vídeo em apoio ao fundador do Chega em janeiro.

Em uma entrevista à Folha de S.Paulo em 2019, Ventura afirmou que a relação dos portugueses era mais difícil com as minorias étnicas, como os ciganos, do que com comunidades imigrantes, caso dos brasileiros.

Quais as semelhanças e diferenças do Chega com outros movimentos da ultradireita?

O Chega replica em muitos sentidos a agenda de outros partidos de ultradireita pelo mundo, defendendo por exemplo o nacionalismo e uma política de segurança pública linha-dura e indo contra a imigração e movimentos identitários.

Ao mesmo tempo, não é contra a União Europeia como, por exemplo, os partido francês Reunião Nacional, de Marine Le Pen, ou o Irmãos da Itália, da atual primeira-ministra do país, Giorgia Meloni.

Além disso, embora tenha havido alguns casos isolados de demonstrações neonazistas e neofascistas em eventos no Chega, o partido não se identifica com eles.

CLARA BALBI / Folhapress

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