SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Em meio às críticas e tensões políticas, a ministra Nísia Trindade afirmou, nesta quinta-feira (21), que segue em sua posição no comando da pasta da Saúde. Trindade citou que enfrenta um cenário de opressão, além da exposição e dos comentários machistas.
A pressão contra a ministra se acirrou na terça-feira (19), após uma reunião com representantes da Frente Nacional dos Prefeitos (FNP), que reúne gestores de capitais e cidades grandes e médias.
Como antecipou a Folha de S.Paulo, a pressão fez com que a pasta decidisse redistribuir as doses da vacina contra a dengue para municípios que não foram contemplados inicialmente nos critérios de maior gravidade.
Em apoio à permanência da ministra, diversas entidades e grupos científicos e médicos divulgaram notas nesta quinta-feira (21).
A ABC (Academia Brasileira de Ciências) disse que são inapropriadas as questões críticas à ministra.
“Consideramos inapropriado que questões críticas como as sequelas da Covid-19, surtos de dengue, violência e negligência em relação à saúde das populações indígenas sejam obscurecidas por disputas políticas no Ministério da Saúde. O esforço admirável realizado pela atual gestão ministerial demanda tempo para se consolidar, e a ABC sente-se compelida a expressar seu respaldo”.
A SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) também expressou seu apoio e solidariedade à Nísia Trindade, frisando seu trabalho notável na reconstrução do Ministério da Saúde após os danos causados “pela política negacionista do governo anterior”.
“A SBPC conclama todos os defensores da saúde e da vida humana a juntarem seus esforços e somarem suas vozes na defesa de uma recomposição das condições básicas de cuidado com os seres humanos de todas as idades em nosso país”, diz a nota divulgada.
Rosana Onocko Campos, presidente da Abrasco (Associação Brasileira de Saúde Coletiva), destacou a destruição de políticas públicas no Brasil desde 2016, especialmente na área da saúde, incompetência e irresponsabilidade do governo federal e a representatividade dos políticos, que priorizam pautas irrelevantes em detrimento dos problemas reais do país.
“Torço para que ela -como muitas de nós mulheres em lugares difíceis- mantenha-se calma e serena, segure a própria voz, se ampare na sororidade de milhares de cientistas e sanitaristas do Brasil e se mantenha firme, dando continuidade ao processo de reconstrução e inovação que tão legitimamente lidera. É preciso ter a estatura de uma Nísia Trindade para combater a miséria política”, citou Campos.
TENSÕES POLÍTICAS
Nísia se encontra em um cenário político dominado por tensões, além da epidemia de dengue no país, há cobranças por todos os lados da Saúde, seja do presidente da Câmara, Arthur Lira, do centrão, que têm pressionado por mais verbas da pasta e o próprio presidente Lula.
Nísia Trindade reiterou que não precisa mudar sua postura para ser respeitada, destacando a importância de uma autoridade civilizada e democrática, sem necessidade de “falar grosso” para ser ouvida.
Em resposta às críticas, a ministra demitiu Helvécio Magalhães do cargo de secretário de Atenção Especializada e Alexandre Oliveira Telles do cargo de diretor do Departamento de Gestão Hospitalar no Estado do Rio de Janeiro. O ministério também mudou as regras para liberação de emendas em 2024 para evitar novas crises com o Legislativo.
PRIMEIRA MULHER A OCUPAR A PASTA DA SAÚDE
A socióloga Nísia Trindade, 66, é a primeira mulher a ocupar o cargo de ministra da Saúde em 70 anos desde a criação da pasta.
Graduada em ciências sociais, mestre em ciência política, doutora em sociologia, Nísia assumiu a presidência da Fiocruz em 2017. Ela é servidora da fundação desde 1987.
Eleita com 60% dos votos de trabalhadores, pesquisadores e professores da Fiocruz, foi a primeira mulher a presidir a centenária instituição, referência em ciência, saúde pública e tecnologia em saúde da América Latina.
Nísia liderou o acordo da Fiocruz com a AstraZeneca para a produção no Brasil de vacinas contra a Covid-19. Na gestão dela, a fundação ainda foi escolhida pela OMS (Organização Mundial da Saúde) como centro de desenvolvimento e produção de vacinas com a tecnologia de RNA mensageiro na América Latina.
RAÍSSA BASÍLIO / Folhapress