SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O distrito da Barra Funda, na divisa da zona oeste com o centro de São Paulo, foi a região da cidade que mais recebeu moradores nos doze anos entre 2010 e 2022. A população mais que duplicou no período, com um crescimento de 132%, mostram os dados do Censo 2022 divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) nesta quinta-feira (21).
Eram 14.383 moradores na época do censo anterior, e em 2022 a população do distrito já era de 33.436 pessoas. Hoje, o bairro continua em franco crescimento, com o cenário dominado por empreendimentos habitacionais prestes a serem inaugurados.
A Barra Funda é o exemplo drástico de um fenômeno que ocorreu na maior parte da capital. A população cresceu em mais da metade dos distritos paulistanos. Isso ocorreu tanto na periferia quanto em parte do centro expandido. Em 46 de 96 regiões, a população diminuiu.
Nenhum outro distrito, porém, chegou perto do aumento demográfico que ocorreu na Barra Funda. Marsilac, distrito da zona sul com o segundo maior crescimento na cidade, teve alta de 38% e sobre uma população bem menor: foi de 8.258 para 11.443 moradores.
A Vila Andrade, no sudoeste, teve crescimento em proporção similar. O distrito -que abriga a maior favela de São Paulo, Paraisópolis- cresceu quase 33% e hoje tem 168 mil moradores.
Em números absolutos, o maior distrito da cidade é o Grajaú, na zona sul, com 384 mil moradores.
Essa transformação é visível na paisagem. Prédios residenciais tomaram o lugar de galpões industriais, principalmente nos bairros da Várzea da Barra Funda e do Parque Industrial Tomas Edson -área entre a marginal do Tietê e as linhas de trem.
“Quando comecei a trabalhar aqui, eu percebia a característica do bairro como principalmente industrial, depois teve uma fase de crescimento comercial e, agora, residencial”, diz a cabeleireira Rose Maria Souza, 47, que desde 2010 é dona de um salão na esquina da avenida Marquês de São Vicente com a rua Quirino dos Santos. “Me motivei a comprar o salão porque quem me vendeu falou isso: que o bairro estava em franco desenvolvimento, que seria a próxima [avenida Engenheiro Luís Carlos] Berrini.”
A poucos quarteirões de distância está o apartamento da empreendedora aposentada Dalsiza Tostes, 72. Em 2012, ela e a família saíram de São Miguel Paulista, na zona leste, e se mudaram para um dos primeiros condomínios residenciais da área.
O distrito de São Miguel, de onde a família Tostes saiu, teve a terceira maior perda de moradores na cidade no período -em números absolutos, são 11 mil pessoas a menos, que corresponde a uma queda de 12%. O motivo foi a economia no tempo de deslocamento até o trabalho e a escola.
“Meu esposo trabalhava no Hospital das Clínicas e teria um acesso muito bom para ele. Meu filho estudava na Santa Casa, que também fica muito próximo”, conta Dalsiza. “Uma das coisas que me fez mudar foi passar no viaduto e ver a construção, me deu vontade de vir para cá. E aí começou a melhorar muito, a cada dia um prédio novo. Nenhum desses estava aqui quando eu vim para cá”, ela diz, olhando para os edifícios ao redor da rua Doutor Rubens Meireles.
BELA VISTA PERDEU MAIS DE 9.000 MORADORES
A menos de três quilômetros da Barra Funda, a Bela Vista foi a região da cidade que proporcionalmente mais encolheu no período. O distrito, que fica no centro, tinha 9.436 moradores a menos em 2022, em comparação com o Censo 2010. Se no início da década passada o distrito tinha quase 70 mil habitantes, após 12 anos pouco passava dos 60 mil. A queda foi de 13,6%.
Em seguida, entre os distritos com as maiores perdas populacionais, estão Alto de Pinheiros (queda de 13,4%) na zona oeste, São Miguel (queda de 12%) na zona leste, e Vila Medeiros (queda de 11,5%) na zona norte. Ou seja, o fenômeno é comum às periferias e ao centro expandido, aos bairros ricos e pobres.
Na Bela Vista, há antigos moradores que reclamam da alta de preços do aluguel, da proliferação de obras no bairro -em grande parte motivada pela futura linha de metrô 6-laranja, que tem inauguração prevista para 2026- e do barulho.
“Todos os lugares que eu procurava estavam precários, e com um barulho imenso de obras. O Bexiga virou um canteiro de obras, com preços absurdos”, conta a iluminadora cênica Ligia Chaim, 38, que nasceu e viveu por mais de três décadas no bairro e hoje mora no Ipiranga. “Estava cada vez mais difícil achar um lugar interessante para morar na Bela Vista.”
A jornalista e pesquisadora de audiovisual Cláudia Belfort, 56, é um exemplo vivo dos principais movimentos populacionais da capital: saiu do distrito que mais perdeu moradores para povoar aquele que mais cresceu. O studio na Barra Funda com quarto integrado à sala, que ela comprou em 2015 como investimento, hoje serve como moradia. Ao mesmo tempo, passou para o aluguel o apartamento na Bela Vista onde morava.
“Essas ruas que dão acesso ao metrô [Barra Funda] e eram desertas ganharam muitos bares, lanchonetes, estabelecimento comercial, prédios de escritório. Mas não ficou aquela coisa elitizada, e eu também não esperava isso”, ela conta. “Tem uma coisa que me preocupa, que é o crescimento excessivo e se não vai desvalorizar o imóvel para vender ou alugar. Ao mesmo tempo que cresceu, virou um bairro de Airbnb [locação de curta duração]”.
TULIO KRUSE E NATÁLIA SANTOS / Folhapress