SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A bacharel em direito Poly Camus, 43, não consegue esquecer o que ouviu da médica ao ter alta de um hospital em Ferraz de Vasconcelos (Grande São Paulo) após dar à luz João Pedro Camus. O menino, hoje com 4 anos, tem síndrome de Down.
“Ela falou que eu ia ter que durar para sempre, porque ia ter um eterno bebê, lerdinho, e essa era a minha realidade. Foi bem triste e eu não esqueço”, conta Camus.
“Há dois anos eu tive um AVC. Pensa na loucura de saber que eu não ia durar para sempre! Fiquei internada na UTI e quase morri. E a minha preocupação foi tão forte que eu pensava ‘meu Deus, eu preciso durar para sempre’. Todos os dias eu tenho medo de morrer”, diz a mãe de João.
João Pedro contrariou a previsão da médica. É independente. Pula, corre, brinca com facilidade. A mãe diz que ele toma banho, escova os dentes e faz as refeições sozinho.
“Bebês com síndrome de Down são mais molinhos e demoram mais para sentar, andar. Tem criança que nasce com comorbidades, principalmente problemas cardíacos e respiratórios. Graças a Deus, o João não nasceu com nada disso. O João andou com um ano e quatro meses. De vítima, de coitadinho, ele não tem nada”, afirma Camus.
Para o secretário de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência, Marcos da Costa, o preconceito ainda existe, mas a sociedade evoluiu.
“Eu vejo uma evolução na sociedade, que já começa a olhar com outros olhos, a perceber que a pessoa com síndrome de Down é um cidadão como outro qualquer, com condições de estudar, de ter um trabalho, de se desenvolver profissionalmente, de se casar, de ter filhos. Mas evidentemente há ainda um certo receio, uma certa preocupação, uma visão um pouco capacitista de deixá-lo sob proteção quando, na verdade, é um cidadão que precisa ter a sua atividade normalmente”, destaca Costa.
“A pessoa com síndrome de Down, que não é uma doença, mas uma condição genética, certamente poderá servir à sociedade”, enfatiza o secretário.
Estima-se que, no Brasil, a cada 700 nascimentos um bebê tenha síndrome de Down. Por dados indiretos, são cerca de 300 mil pessoas com a síndrome no país e mais de 66 mil no estado de São Paulo. As informações constam na cartilha “Orientações e Cuidados para Familiares de Pessoas com Síndrome de Down”, lançada nesta quinta-feira (21), Dia Internacional da Síndrome de Down, pela Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência de São Paulo em colaboração com o Instituto Mauricio de Sousa.
O manual detalha informações fundamentais para famílias com um recém-nascido com síndrome de Down, promovendo a importância de um ambiente acolhedor e inclusivo ao longo da vida. Os temas abordados na cartilha incluem esclarecimentos sobre a condição, maternidade, conselhos para a amamentação, exames, intervenção precoce, vacinação, cuidados com a saúde, educação, linguagem apropriada, direitos e luta contra o preconceito.
“Que a sociedade reflita neste dia da síndrome de Down. Somos -porque eu me incluo- como qualquer pessoa capaz de estudar, de casar, de ter filhos, de ter empresa, de ter hobbies, de ser independente. A questão é que a gente só precisa de uma oportunidade”, finaliza Camus.
Maciel Santos, 38, é o mais experiente jogador de bocha do Brasil. O atleta, que nasceu com paralisia cerebral, é medalhista paralímpico. Ele treina no Centro Municipal de Paradesporto Professor Cid Torquato, em Mogi das Cruzes.
O local atende mais de 800 pessoas por semana, entre autistas, deficientes visuais e pessoas com síndrome de Down.
“Eu tenho muitos amigos com síndrome de Down que estão lá trabalhando. Hoje eu vejo uma interação muito boa entre a sociedade, as pessoas com deficiência, com autismo e com Down. A comunidade deficiente se uniu justamente para que todos possam viver em um ambiente único, justo e inclusão na sociedade”, afirma Santos.
“Muitos acham que quem tem síndrome de Down é agressivo, que não tem capacidade. Eu vejo a pessoa com síndrome de Down inteligente e capaz. Falta informação”, finaliza o atleta.
O QUE É SÍNDROME DE DOWN?
É uma condição genética causada por uma cópia extra do cromossomo 21 nas células das pessoas.
O cromossomo 21 a mais e sua interação com os demais causam as características físicas presentes em quem tem síndrome de Down e o comprometimento cognitivo que afeta as habilidades de aprendizagem.
O exame que confirma o diagnóstico é o cariótipo. Ele pode ser feito durante a gestação ou após o bebê nascer. Poly Camus descobriu que João Pedro tinha síndrome de Down no parto.
PATRÍCIA PASQUINI / Folhapress