RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – A prisão do deputado federal Chiquinho Brazão (União Brasil), sob suspeita de envolvimento de ser um dos mandantes do assassinato da vereadora Marielle Franco, é a segunda investigação sobre a atuação de milícias a atingir a base do prefeito Eduardo Paes (PSD), pré-candidato à reeleição.
Chiquinho foi secretário municipal de Ação Comunitária até fevereiro, quando deixou o cargo mas manteve aliados na pasta. Em dezembro, a deputada Lucinha (PSD) foi alvo de operação sob suspeita de envolvimento com milícias. A aliada do prefeito tem o filho como integrante do primeiro escalão da prefeitura.
Os reveses sobre Paes devem integrar a campanha do deputado federal Alexandre Ramagem (PL), escolhido pelo ex-presidente Jair Bolsonaro como pré-candidato no Rio de Janeiro.
O ex-ministro Fábio Wajngarten, braço direto do ex-presidente, indicou neste domingo (24) que a prisão de Brazão deve ser usada contra Paes.
“Se minimamente trabalhada a eleição da cidade do Rio acabou hoje [domingo]. Mãos à obra”, disse ele em sua conta no X (antigo Twitter).
Em nota, a prefeitura afirmou que Brazão foi indicado pelo Republicanos para assumir a secretaria e substituído após a divulgação da delação do ex-PM Ronnie Lessa, acusado de ser o executor do crime.
“Quando surgiram especulações sobre o caso, foi solicitada ao partido a indicação de um nome para substituí-lo e ele foi exonerado no início de 2024. A Prefeitura do Rio reforça seu apoio às investigações sobre o assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes e espera que o caso seja elucidado pela Justiça”, disse o município, em nota.
O prefeito não se manifestou sobre o caso de Lucinha.
Chiquinho Brazão foi preso com o irmão, Domingos Brazão, conselheiro do TCE (Tribunal de Contas do Estado), sob supeita de serem os mandantes da morte de Marielle. Eles negam as acusações.
Neste domingo, políticos de oposição ao prefeito passaram a compartilhar um vídeo no qual Paes participa de um evento ao lado da família Brazão em Jacarepaguá (zona oeste). O encontro é tratado como lançamento informal da pré-candidatura de Kaio Brazão, filho de Chiquinho, a vereador na cidade.
Paes também demonstrou proximidade com o deputado durante a cerimônia de posse dele como secretário, em outubro. Ele o descreveu como um político “doce, querido, mas muito sério, direto e objetivo”.
“Uma pessoa com uma história de vida de muito trabalho, muita seriedade. […] Sempre foi muito fácil atender as demandas do Chiquinho, porque ele sempre foi focado, organizado. Chegava ali, pedia. Se tivesse que ouvir um ‘não’, preferia um ‘não’ a uma enrolação. Todo mundo deveria ser assim na vida pública”, disse o prefeito ao dar posse a Chiquinho.
A nomeação ocorreu antes da divulgação da delação de Ronnie Lessa. Contudo, desde 2018 há suspeitas sobre o envolvimento de Domingos Brazão, líder do grupo político, no caso. Pessoas ligadas ao conselheiro foram acusadas de tentar atrapalhar as investigações com uma falsa testemunha.
O deputado deixou a secretária em fevereiro, uma semana após a divulgação do acordo de Lessa. Porém, como a Folha de S.Paulo mostrou, levantamento do gabinete do vereador Pedro Duarte (Novo) apontou que a secretaria mantinha 15 pessoas nomeadas durante a gestão de Chiquinho.
Dez dias antes de ser preso, Domingos, líder do grupo político, afirmou à Folha de S.Paulo que a manutenção da influência de seu grupo político mostrava confiança dos aliados no Rio de Janeiro. “Quem convive na política fluminense não dá crédito a essas suspeitas. Isso até nos conforta. Nada tem mais força do que a verdade.”
De acordo com a PF, a atuação de Chiquinho na Câmara Municipal tinha como objetivo facilitar a regularização de terrenos e construções irregulares em sua base eleitoral. Uma divergência com Marielle sobre um dos projetos de lei com esse objetivo teria sido um dos motivos do crime, embora a vereadora tenha atuado de forma discreta nos debates sobre a proposta.
As suspeitas sobre Lucinha também atingiram indiretamente Paes. Ela é forte aliada do prefeito e indicou o filho, o Junior da Lucinha, como secretário municipal de Envelhecimento Saudável.
As investigações da Polícia Federal apontaram uma atuação da deputada em favor de milicianos no estabelecimento de regras para circulação de vans na zona oeste.
A PF cita, inclusive, uma reunião de motoristas de vans com Paes organizada com Lucinha em sua base eleitoral. Segundo as investigações, a estrutura para o encontro foi fornecida por milicianos.
De acordo com a polícia, a deputada atuava em favor do grupo criminoso comandado por Luis Antônio da Silva Braga, o Zinho, responsável pelos ataques a ônibus e trem na zona oeste carioca em outubro. A milícia domina grade parte da região.
Ela chegou a ser afastada do mandato pela Justiça, mas os deputados suspenderam os efeitos da decisão e decidiram submetê-la a um processo disciplinar no Conselho de Ética.
Em discurso para os deputados, Lucinha negou envolvimento com milicianos. “Nunca tive qualquer envolvimento com nenhuma organização criminosa. Nunca fui braço de milícia, como dito por aí.”
Ela também fez referência no discurso ao encontro que realizou entre o prefeito e motoristas de vans. Para a polícia, a deputada atuou para manter uma regra que beneficiava a milícia da região.
“O transporte alternativo regularizado também gera emprego e garante o sustento de milhares de famílias. Não vou admitir que pautas defendidas pelo meu mandato, de forma honesta e transparente, sejam criminalizadas.”
ITALO NOGUEIRA / Folhapress