SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – No mês do Dia da Mulher, o Grupo MOL completa um ano de uma iniciativa pioneira que marcou a adoção com sucesso da licença menstrual entre suas funcionárias.
Em um ano, a empresa, localizada na zona oeste de São Paulo e que é formada 89% por mulheres, contabilizou 33 licenças solicitadas -cerca de três por mês-, sendo 22 licenças de meio período, oito de um dia inteiro e três licenças de dois dias inteiros. Foram 17 (34,6%) das 49 funcionárias que fizeram a solicitação.
“Nós nos inspiramos na legislação da Espanha [adotada em 16 de fevereiro de 2023] e a adequamos para a realidade da MOL. Pesquisamos como eram as legislações em outros países e vimos histórias de trabalhadoras do Oriente que não se sentiam à vontade para usar a licença menstrual por medo de julgamentos quando o chefe e a equipe eram formadas por homens”, afirma a jornalista e CEO da MOL, Roberta Faria.
A estratégia usada no grupo, que abriga a MOL Impacto e o Instituto MOL, responsáveis por doarem R$ 72 milhões a ações sociais ou causas (Graac, por exemplo) desde 2008, foi tentar ser o mais simples possível.
“A licença não era usada por causa de processos burocráticos, como apresentação de laudo médico ou atestado, e pelo fato de que empregadores e funcionários não sabiam de garantias assim no país”, afirma a empreendedora social.
Segundo Roberta, a equipe já praticava de forma informal esse tipo de expediente e, quando uma profissional dizia à gestora que estava indisposta, já era permitido a ela ir para casa.
“Quando a legislação foi aprovada na Espanha, ficamos impressionadas porque a gente nunca tinha imaginado que isso poderia ser uma política formalizada aqui. Então isso fez a gente pensar como seria o processo de implementação (quantidade de dias, controle interno de adesão etc.) e nos levou a ter aprovação unânime entre todos os sócios para implementar a licença menstrual no Dia da Mulher, em 2023.”
Dados de uma pesquisa realizada pela marca de absorventes Sempre Livre, em parceria com os institutos Kyra e Mosaiclab, mostraram em 2021 que 51% das brasileiras de 14 a 45 anos afirmaram que o mal-estar na menstruação é forte.
De acordo com Victoria De Castro, 28, bióloga e professora na Universidade Estadual do Rio Grande do Sul, esse mal-estar exige cuidados e qualquer avanço no amparo à mulher na questão menstrual é válido.
“São muito boas iniciativas assim. E, sempre que há um avanço, a gente tem que se preocupar em assegurar que ele seja mantido e trabalhar para que seja universalizado”, afirma ela, que também é cofundadora da Herself Educacional e educadora menstrual desde 2015.
Para Victoria, tanto quanto ter uma legislação voltada a questões menstruais, o Brasil precisa garantir que todos tenham acesso a uma educação sobre menstruação e combater a pobreza menstrual. Ela diz que cólicas muito fortes pedem acolhimento e atenção, já que podem esconder ou estarem associadas a outros problemas, como dores abdominais, enxaqueca e endometriose.
A adoção do benefício, explica Roberta, permitiu maior sinergia entre as equipes e, no fim, as atividades passaram a ser distribuídas sem sobrecarregar ninguém –a MOL é responsável por publicações como a revista Sorria e livros e jogos vendidos na Petz, por exemplo.
Além disso, a licença contribuiu para quebrar a crença de que mulheres que convivem e trabalham juntas sincronizam a menstruação nos mesmos dias ou semanas, algo que a medicina, como já disse o médico Drauzio Varella, mostrou não passar de um mito.
Assim como a MOL inovou com a licença menstrual, uma empresa de Mato Grosso também o fez em 2023, com a diferença de que implantou o benefício de forma gradual (por setores). E os relatos da boa experiência em São Paulo levaram outras empresas a consultarem a MOL, como a Phomenta, que também implementou este ano uma política de ausências que abrange as dores menstruais.
No âmbito público, quem tentou largar na frente foi o Distrito Federal, que desde o dia 6 de março conta com a Lei Complementar 1.032/2024, aprovada pela Câmara Legislativa, que concede direito a licença de trabalho de até três dias para funcionárias públicas em período menstrual –cerca de 18% dos servidores lá são mulheres.
O benefício, porém, só é concedido após ser atestado por médico do trabalho ou ocupacional. A lei, de autoria do deputado distrital Max Maciel (PSOL), entretanto, não foi bem recebida pelo governo Ibaneis Rocha (MDB), que afirma que irá recorrer ao STF (Supremo Tribunal Federal) para não aplicar.
Na Câmara dos Deputados, projeto semelhante, de Jandira Feghali (PCdoB-RJ), espera por uma atenção maior dos parlamentares.
Tanto no DF como na Câmara, os argumentos para a implementação do benefício consideram que 15% das mulheres sofrem desconfortos fortes com a menstruação que prejudicam sua rotina.
Assim era com a designer Clara Rezende, 25. “Eu sinto dores muito fortes, especialmente no primeiro dia. Mesmo tomando remédio, não passa. Fica complicado até para pensar. É uma situação no meu corpo que não consigo controlar. Antes de entrar na MOL e contar com essa licença, eu sofri em estágio e em empregos anteriores porque não tinha liberdade e permissão para me ausentar, havia julgamentos e constrangimento”, conta a profissional.
Ela diz que já pegou a licença de meio período por duas vez em um ano e que o benefício a ajudou a produzir mais no dia seguinte à licença. “Antes, eu ficava mal por dois dias. Agora, com o repouso de meio período no primeiro dia, os sintomas são muitos aliviados e no dia seguinte me sinto muito melhor.”
Segundo ela, a licença deixou a equipe mais feliz e surpreende amigas com quem conversa. “Eu falo, especialmente para minha mãe e minha irmã, que um dia a hora de elas desfrutarem disso vai chegar.”
E se engana quem pensa que a licença é boa apenas para funcionárias. “A licença menstrual é um benefício de baixo custo de implementação. De todas as ações que já fizemos, essa é de longe a que mais trouxe reconhecimento e benefícios para o Grupo MOL”, afirma Roberta, que, ao lado de Rodrigo Pipponzi, venceu o Prêmio Empreendedor Social e a Escolha do Leitor em 2018.
Falta o poder público aprender isso.
CRISTIANO CIPRIANO POMBO / Folhapress