SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Apenas 2 das 7 empresas que já operam com ônibus elétricos na cidade de São Paulo confirmam usar alternativas de energia 100% limpa ou renovável para recarregar as baterias de seus veículos.
A Transwolff, que roda na zona sul do município e tem 78 veículos elétricos em sua frota, diz comprar energia de fonte eólica por meio de mercado livre, onde consumidores de média e alta tensão negociam diretamente com comercializadoras o preço e o tipo da eletricidade.
A empresa é responsável por 66% da frota elétrica já em operação na cidade, que até a última quarta-feira (27) tinha 118 veículos com baterias recarregáveis no lugar de motores a diesel, segundo a SPTrans, estatal responsável pela gestão do transporte público municipal.
A MobiBrasil, que tem a zona sul paulistana como base, conta com seis desse tipo de ônibus nas ruas e também afirma recorrer ao mercado livre para compra de energia renovável. “A empresa que comercializa esta energia compra de diversas fontes eólica e solar, mas a maior parte é solar”, diz.
A reportagem questionou as sete empresas que já iniciaram a eletrificação da frota. Dessas, três disseram usar energia de origem convencional e que não têm planos de mudança para outras fontes por enquanto. Viação Gato e a UPBus não responderam.
No caso do transporte sobre trilhos, ViaMobilidade (linhas 8 e 9 do trem metropolitano e linha 5 do metrô) e a ViaQuatro (linha 4 do metrô) dizem que 95% da energia utilizada para alimentação dos seus trens e estações são de fontes renováveis. Metrô e CPTM também vão ao mercado atrás de ofertas energéticas e têm planos sustentáveis.
Não há um regramento para que as viações paulistanas adotem energia com garantia de ser 100% limpa na recarga de seus ônibus.
Ao ser questionada sobre o tema, a SPTrans afirma, sem apontar modelos a serem escolhidos, que “a matriz energética do país é composta essencialmente por fontes renováveis, como as hidrelétricas, usinas eólicas e fotovoltaicas”, e que que devido às características geográficas do Brasil “a matriz elétrica é uma das mais limpas do mundo”.
De acordo com Agostinho Celso Pascalicchio, professor na área de economia de energia da Universidade Presbiteriana Mackenzie, o sistema elétrico brasileiro, totalmente interligado, possibilita que a energia produzida em qualquer lugar do país seja distribuída até o ponto de carga.
Uma mudança na regra permite, desde o início do ano, que consumidores como supermercados, hotéis, hospitais, grandes restaurantes ou pequenas indústrias escolham se querem continuar ligados na distribuidora tradicional ou migrem ao mercado livre de energia (não é o caso das residências).
Essa alteração beneficia diretamente as garagens de ônibus com eletrificação de suas frotas, lembra o professor.
O SPUrbanuss (Sindicato das Empresas de Transporte Coletivo Urbano de Passageiros de São Paulo) diz que as empresas estão estudando as melhores estratégias. São elas, entre outras justificativas como redução de custos, que fazem as duas empresas de São Paulo “irem às compras” por fontes mais sustentáveis.
“Para a empresa não fazia sentido recorrer a outro tipo de energia, sendo que o foco é a mudança da matriz energética indo para uma mais sustentável”, afirma a Transwolff.
O discurso da MobiBrasil é semelhante. A empresa diz que a escolha reflete compromissos de sustentabilidade e preservação ambiental.
A eletrificação do transporte público na cidade, entretanto, precisa mais do que projetos verdes. José Roberto Moreira, professor sênior do Instituto de Energia e Ambiente da USP (Universidade de São Paulo), alerta que a cidade vai ter de investir em seu sistema de distribuição.
“A rede precisará ser aumentada”, afirma. “Vai ser preciso investimentos em subestações e nas garagens, nem tanto na rede elétrica”, completa.
A gestão Ricardo Nunes (MDB) colocou como meta substituir 20% da frota de 11.950 ônibus da cidade (ou seja, 2.400 veículos) por modelos movidos a energia limpa até o fim de 2024, mas ela está longe de ser alcançada.
Atualmente, 309 veículos elétricos circulam na cidade, dos quais 108 são a bateria e 201 trólebus — movidos por tração elétrica, conectados na rede aérea alimentada pela concessionária Enel.
A lenta velocidade da eletrificação dos coletivos está no meio de uma disputa entre a prefeitura, as empresas de transporte e a Enel, o que tem dificultado a implementação.
A briga tem como foco a construção da infraestrutura necessária para que os veículos possam ser carregados e consigam rodar na cidade.
Em nota, a Enel afirma que os investimentos na instalação de infraestrutura essencial para o aumento das frotas elétricas nas cidades, especialmente de ônibus, dependerá da solução adotada pelos operadores e da subsequente assinatura de contratos bilaterais, seja com a subsidiária Enel X ou outras empresas atuantes no mercado de mobilidade elétrica.
“Cada tipo de solução implica prazos e investimentos diferentes, alguns imediatos e outros de média duração”, afirma a concessionária, que diz investir permanentemente na ampliação e na modernização do sistema.
PROJETOS PARA TRENS
O grupo CCR, responsável pela ViaMobilidade e pela ViaQuatro, diz que 95% da energia usada para alimentação dos trens e estações vem de fontes renováveis.
As empresas contam com contratos de energia eólica e hidrelétrica no mercado livre para mobilidade urbana, com certificados para atestar a origem da fonte. Os 5% remanescentes serão compensados até o final do ano por meio da compra de I-Recs (certificação de energia renovável).
Empresas do governo estadual, Metrô e CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) também recorrem ao mercado livre de energia, seguindo regulações da CCEE (Câmara de Comercialização de Energia Elétrica) para garantir preços melhores.
O Metrô afirma ter projetos de curto prazo envolvendo fontes energéticas incentivadas e renováveis e diz que criou um grupo para acompanhamento e proposição de ações que colaborem com a redução do consumo de energia elétrica empregada na operação dos trens e estações.
A CPTM diz que até o fim de 2024 terá 100% de suas subestações de tração contratadas no mercado livre. A companhia, porém, afirma que suas estações usam o tradicional ambiente de compra de energia, utilizando as concessionárias dos respectivos municípios de atuação.
FÁBIO PESCARINI / Folhapress